Folha de S. Paulo


Dono de livraria contestará apreensão de livros eróticos pela Justiça

Depois de ter 18 exemplares de quatro livros eróticos apreendidos em sua livraria na última segunda-feira, por determinação do juiz da segunda Vara de Família, da Infância, da Juventude e do Idoso de Macaé (região norte do RJ), o dono da livraria Nobel da cidade decidiu não reaver os exemplares levados.

"Não fui e não vou buscar. A coisa ganhou uma proporção bem maior do que a gente podia imaginar, mas é até compreensível, pelo teor dos fatos", disse o empresário Carlos Eduardo Coelho, que tinha um prazo de até cinco dias, dado pelo juiz, para recolher as obras no fórum.

"Não vamos retirar os livros porque entendemos que a apreensão deles decorre de um ato arbitrário", disse o advogado Carlos Nicodemos, 46, representante de Coelho.

"Vamos aguardar o resultado do processo judicial para pedir a devolução", disse o advogado. Seu cliente tem dez dias, a contar da última terça-feira, para contestar o auto de infração que lhe foi aplicado e que pode resultar em multa de três a 20 salários-mínimos.

A apreensão aconteceu depois que o juiz Raphael Baddini de Queiroz Campos expediu uma Ordem de Serviço determinando a fiscalização da forma como estabelecimentos comercializam os livros da trilogia "50 Tons de Cinza" e "outros da mesma natureza e espécie".

O magistrado se baseou no artigo 78 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que determina que publicações com "material impróprio ou inadequado" sejam vendidas em embalagem lacrada que impeça o manuseio.

Na segunda-feira passada, representantes da Justiça e policiais militares foram às livrarias Nobel e Casa do Livro, em Macaé, e recolheram 64 exemplares de 18 livros.

Além do best-seller "50 Tons de Cinza", de E.L. James, foram levados exemplares de "Algemas de Seda", de Frank Baldwin, e os brasileiros "50 Versões de Amor e Prazer", coletânea organizada por Rinaldo de Fernandes, e "A Dama da Internet", de Neville d'Almeida.

"No meu ponto de vista, existem inobservâncias não só por parte do juiz, mas dos comissários. A ordem de serviço era genérica, ela usa um conceito de 'inapropriado' a partir da cabeça do juiz."

Procurado pela Folha, o juiz Campos não quis conceder entrevista.

Em comunicado oficial do Tribunal de Justiça do Rio, o magistrado disse ter tomado a iniciativa depois de verificar pessoalmente, em uma livraria da cidade, que muitas crianças estavam bem próximas das vitrines onde livros com conteúdo erótico estavam expostos.

"A ordem de serviço é uma forma de garantir que a lei seja cumprida. Uma criança ou adolescente pode pegar um dos livros em uma prateleira e ter acesso a um conteúdo inapropriado para sua idade. Eles precisam ser protegidosº, afirmou o juiz no texto.

Nicodemos disse que a livraria de seu cliente "tem um protocolo de cuidado e zelo em relação à separação de obras destinadas exclusivamente ao público adulto e obras destinadas a crianças e adolescentes."

Depois da autuação pelos comissários da Justiça, a Nobel de Macaé passou a envolver os títulos de literatura erótica em filme plástico. Ele foram retirados da vitrine e colocados em prateleiras altas.

A reportagem procurou as editoras que publicam os livros apreendidos --Intrínseca, Leya, Casa da Palavra e Geração Editorial--, mas elas não quiseram se pronunciar.


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