Folha de S. Paulo


Lira mistura poesia e performance em segundo trabalho solo

Patricia Stavis/Folhapress
O músico pernambucano Lira
O músico pernambucano Lira

A trajetória poética e musical de Lira -o pernambucano de Arcoverde José Paes de Lira, o Lirinha do extinto e vivo Cordel do Fogo Encantado- sempre trouxe para o centro a força singular de sua presença entre nós, no palco. A "eletrônica viva" de sua performance nunca é complemento ou outra face possível de sua expressão musical, mas o cerne de profundo fazer poético, que se deve incluir no cume de altas realizações literárias. O crítico suíço Paul Zumthor teorizou belamente sobre a necessidade que tem a literatura de atrair para dentro de si, pelo encontro com a música e a cena, o modo como um corpo pode realizar e receber essa experiência estética.

Reprodução

Quando Lira lançou, em maio -num show arrepiante, no Sesc Vila Mariana-, este seu segundo trabalho solo, ficou claro como os dez anos do intenso mergulho no Cordel e, antes, na sua própria formação, embebida pelas nobres fontes da poesia popular, engendraram um motor poético que, potencializado pelas diversas parcerias, só tem ganhado poder de síntese. Já em "Lira" (2011), o trabalho solo anterior, canções poderosas ("Ela Vai Dançar") pareciam dar forma poética a notável processo de autorreflexão e crítica sobre o caminho percorrido. Este dobrar-se sobre si próprio também alimenta o trabalho de Siba, a quem Lira emprestou voz ("Um Verso Preso", joia incrustada no disco "Avante").

No disco de agora, produzido por Pupillo, a forte levada roqueira e eletrônica (destaque para os sintetizadores do Astronauta Pinguim) enceta rasgos de revisão interna, em "Desamar" e no romantismo desbragado de "Pra Fora da Terra", mas também abre espaço para a doce reconstrução lírica, nas montanhas do "Jabitacá". Mas é no gosto de saborear as palavras raras ("Odin") e revelar as perplexidades quanto aos dons da poesia, em "O Labirinto e o Desmantelo" e em "Filtre-me" (parcerias com Pupillo e com a voz e o talento mágicos da cantora Céu), que a serpente morde de vez seu próprio rabo e tudo se inflama: "Todo fogo é santo!"


O LABIRINTO E O DESMANTELO
ARTISTA: Lira
GRAVADORA: independente
QUANTO: R$25
AVALIAÇÃO: ótimo


Endereço da página: