Folha de S. Paulo


Zé do Caixão nasceu em uma sexta-feira 13 e já teve gibi infantil; leia entrevista de 1999

Sexta-feira 13 é o dia em que tudo pode acontecer. Para os mais supersticiosos é melhor nem sair de casa, outros acham que é tudo mentira. No entanto, ninguém sabe ao certo porque essa data é tão temida.

Umas das teorias surgiu da mitologia nórdica. A história conta que 12 deuses foram convidados para um banquete, menos o deus do fogo. Furioso, ele apareceu sem ser chamado e causou a morte do favorito dos deuses. Desde então, reunir 13 pessoas para um jantar era sinônimo de problema.

Já a associação com a sexta-feira ocorreu porque a deusa do amor e da beleza foi considera bruxa quando as tribos nórdicas e alemãs se converteram ao cristianismo. Para se vingar, ela se juntava às sextas-feiras com outras 11 bruxas e um demônio para amaldiçoar os humanos.

José Mojica Marins, o Zé do Caixão, nasceu em uma sexta-feira 13. Conhecido como o "mestre do terror", ele já protagonizou diversos filmes do gênero e também já apresentou programas para crianças.

Em 1999, Mojica lançou o gibi "A Estranha Turma do Zé do Caixão". No primeiro volume da série, o menino Zé do Caixão vive uma aventura celebrando o Halloween ao lado dos amigos Vanelsinho, Fran e da mascote Tarantela.

Confira na íntegra a entrevista com o Zé do Caixão, publicada na "Folhinha" em 1999.

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Reprodução
Nome: sexta feira 13 legenda: Zé do caixão versão gibi, a primeira edição foi publicada em 1999
Zé do caixão em versão gibi, a primeira edição foi publicada em 1999

Você gosta de filmes "Trash"?
Não. Apresentei o programa porque era para crianças. Aqueles filmes, que as pessoas explodem em mil pedacinhos, e os pedacinhos saem se mexendo, não têm nada a ver com meus filmes. A criançada via aquilo e brincava.

Como você virou o Zé do Caixão?
Foi em 1963, quando ninguém quis fazer esse papel no filme que eu estava fazendo ("À Meia-Noite Levarei sua Alma").
Ninguém quis fazer o Zé do Caixão para não cair no ridículo. As pessoas achavam que fazer terror no Brasil era ridículo. Hoje, quem foi convidado e está vivo ainda está arrependido, porque poderia ter se tornado uma lenda. Eu sou uma lenda, faço parte do folclore. Estive em Brasília esses dias, e tinha umas meninas apavoradas, moças de 25,26 anos, achando que, com os olhos, eu as secaria, que elas iam ficar esqueléticas. É a lenda que se tem aí afora.

Qual é a coisa mais legal de ser uma lenda?
Eu gosto de ser uma lenda porque o Zé do Caixão põe fé nas crianças, que vão dominar o mundo. Ele vira o mundo para defender uma criança. Até hoje ele procura um filho. Quando eu apresentava o "Cine Trash" falava para as crianças: "Olhem, eu estou do seu lado, mas obedeçam ao seu professor, à sua mãe, às pessoas mais velhas". Recebi muitas cartas de agradecimento dos pais. As crianças também escreviam dizendo: "Zé, eu tirei nota dez". Isso era bonito. Minha lenda não é simplesmente a de um vilão.
O Zé do Caixão é um vilão contra as injustiças, a maldade, a falsidade. Ele tem um toque de herói, para a paz, para a felicidade que ele procura, o bem das crianças.

Você tem medo de alguma coisa?
Não. O caixão, por exemplo, é nossa última morada. Vou ter medo do caixão que vai aguentar meu cheiro lá dentro? O único cara bacana é o caixão. Não tem de ter medo de nada.
Eu não queria morrer agora, porque ainda tenho filhas que dependem de mim, eu fico mais apavorado com isso. Mas, depois que estiver todo mundo casado, acho que a morte é normal.

Seus filhos, quando eram pequenos, tinham medo de você?
Não, mas eles tiveram problemas na escola. Eles enfrentaram uma barra pesada, porque as crianças riam deles, chamavam de "Zé da Caixinha". Eu tinha de ir à escola, explicar para as pessoas o que é um ser humano, um personagem e um criador, para as pessoas terem respeito. Mas agora meus netos sentem orgulho e dizem para todo mundo: "Eu sou neto do Zé do Caixão".

Das coisas que você já fez, de qual gosta mais?
Já fiz tudo o que você puder imaginar em comunicação: cinema, TV, rádio, disco, fita, revista, CD-ROM...
Eu gosto de criar, não importa o meio. Eu quero criar sempre um produto que tenha uma mensagem. Nos filmes que eu apresentava no "Cine Trash", por exemplo o bem sempre vencia o mal.

Você acha que o bem sempre vence?
Não. Na vida, o bem nem sempre vence. Mas não dá pra mostrar isso, porque é uma mensagem negativa.

Você acredita nas forças do mal?
Não. Acredito que o mal exista em todos nós, como existe o bem. A inveja, o ciúme, isso tudo é o mal, que afeta as pessoas, não como um raio, mas atrasando a vida delas. Isso é a força negativa das pessoas que desejam o mal. Nesse mal eu acredito.

E em espíritos?
Também não. Só acredito nos extraterrestres. E eles já estão aqui. Pode ser que eu esteja falando com um deles e não esteja sabendo, porque os extraterrestres estão disfarçados, no meio de quem lida com o público, como os cantores e os políticos. Ninguém sabe quem são eles, mas eles estão numa missão de paz, não querem tumultuar. Eles vão aparecendo devagarinho. Os ETs vieram para trazer a luz, acabar com essa falsidade, mas está difícil.

Se um ET o convidasse para conhecer seu planeta, você iria?
Correndo. Se aparecer aqui, nem aviso em casa.

Você voltaria do mundo dos mortos para assustar alguém?
Incomodaria todas as pessoas que não prestam, até que elas se tornassem boas. Eu infernizaria a vida deles todos. Esse é o poder que pediria a Deus quando eu morresse: voltar às pessoas que realmente não prestam, mexer no dedinho do pé, na nuca, só fazer uma cosquinha, fazer essas pessoas sentirem uma coisa gelada que eles não vão saber o que é. Era isso que eu queria.


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