Folha de S. Paulo


Ex-editora da 'Folhinha' viajou por todo o Brasil para coletar brincadeiras

Durante os 12 anos que trabalhou como repórter e editora-assistente da "Folhinha", Gabriela Romeu viajou do Oiapoque ao Chuí para mostrar as diferentes infâncias do Brasil.

Participou de caçadas de caranguejos no Maranhão, jogou bolinha de gude perto do Acre, carregou estilingues no Piauí e, claro, empinou pipas em São Paulo.

Muitas dessas aventuras estão registradas no Mapa do Brincar, projeto da "Folhinha" que reúne 750 brincadeiras de todo o país.

Leia o depoimento de Gabriela Romeu, que deixou o caderno em 2011, abaixo. Para mandar também sua história sobre a "Folhinha", envie um e-mail para folhinha@uol.com.br.

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Em 12 anos de trabalho na "Folhinha", foram sempre fascinantes os encontros e as conversas com as crianças pelo país. Da "avenida Amazonas" à favela da Maré, da periferia de São Paulo ao sertão do Cariri, de uma ilha maranhense à aldeia dos índios suruís, as crianças sempre se mostraram abertas em contar e apresentar suas pequenas aventuras cotidianas.

E foram muitas as aventuras que vivi ao lado de meninos e meninas do Brasil de dentro durante meus anos de "Folhinha". Com a missão de retratar as muitas infâncias em reportagens para o caderno, "a desculpa perfeita", segui as crianças em caçadas de caranguejos nos mangues da ilha do Cajual, no Maranhão; joguei bolitas (bolinhas de gude) numa pracinha peruana de Iñapari, na divisa com o Acre; desbravei a caatinga do Piauí com baladeiras (estilingues) nas mãos; estudei uma tarde com as crianças calungas de Goiás; entre outras peripécias.

Leticia Moreira - 19.nov.2011/Folhapress
Crianças brincam na beira do rio Oiapoque, na aldeia Manga, no Amapá
Crianças brincam na beira do rio Oiapoque, na aldeia Manga, no Amapá

Nessas andanças, conheci meninos inspiradores como Ravel Marinho, à época com 12 anos. Ainda me lembro da voz do Ravel anunciando numa rádio-corneta minha chegada (triunfal!) em sua vila, no paraná do Tapará, interior de Santarém (PA): "Vem chegando diretamente da avenida Amazonas a jornalista da Folhinha!". A avenida Amazonas nada mais era do que o caudaloso rio Amazonas, que, durante a temporada de cheia, deixa a meninada do lugar até com "saudades de terra firme".

Quando não era possível viajar, telefone, celular ou orelhão davam um jeito. "Oi, é de Abadia? Você pode cantar as cantigas de roda daí pra mim?", foi assim o início da conversa com crianças de uma vila pequenina do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Foi pelo orelhão da comunidade que as meninas cantaram bem afinadinho os versos que embalam suas brincadeiras de roda no finzinho da tarde.

Em entrevistas em tom de conversas, muito as crianças me ensinaram sobre seus jeitos de viver e entender o mundo. E, ao entrevistá-las, sempre me senti em estado de alerta. Era (e é) preciso estar bastante atenta para descobrir a senha de acesso ao universo infantil, em que restos de fita se traduzem em poesia, bichos do quintal compõem uma Arca de Noé e tudo tem sabor de primeira vez.

Leticia Moreira - 1º.nov.2011/Folhapress
Criancas brincam as margens do Rio Quarai na cidade de Barra do Quarai, no Rio Grande do Sul
Crianças brincam as margens do Rio Quarai na cidade de Barra do Quarai, no Rio Grande do Sul

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