Folha de S. Paulo


Clubes não cumprem exigência do Profut e podem desfalcar Estaduais

Lucio Bernardo Jr.-7.mai.2015/Câmara dos Deputados/Divulgação
BRASILIA, DF, 07/05/2015 - Reunião Ordinária. Dep. Vicente Candido (PT-SP). Credito: Lucio Bernardo Jr. / Câmara dos Deputados ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
O deputado Vicente Candido (PT-SP), que articula mudanças no Profut

Em reunião no início de julho com Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, dirigentes de federações de futebol do Brasil pediram ajuda para mudar a Lei do Profut (programa de refinanciamento de dívidas dos clubes), sob o risco de comprometer a realização dos campeonatos estaduais na próxima temporada.

Em 2018, entra em vigor a determinação de que qualquer time deve apresentar a Certidão Negativa de Débitos (CND), documento emitido pela Receita Federal que atesta a inexistência de dívidas com órgãos públicos, para poder disputar competições profissionais. Há questionamentos na Justiça a essa obrigatoriedade.

A Folha apurou que, no encontro com Maia, o presidente da FPF (Federação Paulista de Futebol), Reinaldo Carneiro Bastos, disse que se a lei não for alterada, o Paulista do próximo ano terá apenas nove clubes na Série A1 -o normal seriam 16. A Série A2, equivalente à segunda divisão estadual, teria apenas sete times -o correto seria 16.

"Se não mudar, a maioria dos Estaduais não vai acontecer. O Campeonato Gaúcho da primeira divisão teria sete times", disse o presidente da Federação Gaúcha de Futebol, Francisco Noveletto.

Há um movimento na Câmara dos Deputados para tentar flexibilizar a regra e evitar que equipes deixem de disputar os Estaduais.

O deputado federal Vicente Cândido (PT-SP), que também ocupa o cargo de diretor de Assuntos Internacionais da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), articula com o governo a edição de uma Medida Provisória para solucionar temporariamente o problema. Os deputados Andres Sanchez (PT-SP), ex-presidente do Corinthians, e Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG) também participam das negociações.

O texto da Medida Provisória ainda não foi definido, mas a principal alteração estudada é o adiamento em um ano do prazo para os clubes obterem a CND. Outra possibilidade seria retirar completamente a obrigatoriedade, medida que enfrenta mais resistência no governo federal.

"Discutimos também que os clubes apresentem o documento ao final de cada campeonato. Eu concordo com isso", afirma Noveletto.

O deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ), relator da lei, é contra a alteração. Para ele, a flexibilização visa ajudar clubes que não se organizaram para cumprir as contrapartidas que o Profut exige.

"O Profut foi muito discutido para oferecer boas condições aos clubes. Mas era preciso que eles se organizassem e fizessem o dever de casa. Esse era o espírito, e parece que não foi seguido", diz.

Quando o assunto chegar na Câmara também haverá resistência. Nem todos os deputados acreditam que exista clima político na casa para um debate sobre futebol.

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Os clubes pequenos que aderem ao Profut, que prevê o parcelamento das dívidas com o governo federal em condições mais favoráveis, são os que mais encontram dificuldades para quitar as parcelas. Sem esse pagamento, eles perdem o direito de participar do programa e não conseguem obter a CND.

"Muitos times pequenos não terão a CND para disputar os campeonatos. Isso precisa ser revisto porque não haverá times para as competições", diz Gerson Engracia, presidente do Botafogo-SP.

O clube entrou no Profut, mas não conseguiu arcar com os pagamentos de cerca de R$ 33 mil por mês. A equipe disputa a Série C do Brasileiro e não possui receita de televisão como os times da Série B e da elite nacional.

Ouvidas pela Folha, as federações mineira, paulista e catarinense manifestaram preocupação com a restrição às equipes para disputar competições. A federação paranaense não quis se manifestar sobre o tema.

Em nota, a federação paulista disse trabalhar no "processo de conscientização e orientação aos clubes filiados", com seminários e monitoramento quinzenal da situação das agremiações. "A FPF entende que o Profut é um grande avanço ao futebol, mas resolve imediatamente os problemas de um pequeno grupo de grandes clubes."

JUSTIÇA

A obrigatoriedade da apresentação da CND para os clubes pode ser derrubada no STF (Supremo Tribunal de Justiça). Em 26 de junho, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, assinou parecer considerando a medida inconstitucional.

"É inconstitucional imposição de regularidade fiscal como critério técnico para habilitação de entidades desportivas profissionais em competições esportivo por caracterizar meio indireto de cobrança de tributos e restrição indevida ao livre exercício de atividade econômica ou profissional", diz o texto.

"Essa obrigatoriedade seria o fim dos clubes pequenos. Você não pega um padeiro e diz que se não tiver CND, não fabrica pão. A condição fiscal não pode ser requisito para exercer sua atividade", diz o advogado André Sica, que representa 15 clubes juridicamente.

"Acreditamos que 30% dos clubes da primeira divisão dos estaduais não possuem a CND, 70% na segunda divisão e quase nenhum na terceira. Estou falando em Estados que os clubes recebem uma cota significativa para a disputa do Estadual", acrescentou.

De acordo com o advogado, a Lei foi pensada apenas para os clubes que estão na Série A.

Rubens Lopes, presidente da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro, acredita que a questão será decidida na Justiça antes dos Estaduais, que devem começar no último final de semana de janeiro ou no início de fevereiro.

"Tenho ciência das dificuldades dos clubes [em pagar as contas e conseguir a certidão], mas não me preocupa. A matéria vai ser apreciada em tempo hábil."

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PRINCIPAIS PONTOS DO PROFUT

Vantagens
Clubes tem facilidades para refinanciar dívidas, nas prestações e no prazo

Principais contrapartidas
¶ Apresentar Certidão Negativa de Débitos (CND) para disputar campeonatos profissionais
¶ Ter demonstrações contábeis auditadas
¶ Pagamentos em dia
¶ Limite de 70% da receita bruta nos gastos com salários do departamento profissional
¶ Investimento mínimo nas categorias de base e no futebol feminino
¶ Não antecipar receitas futuras e zerar déficit até 2021

Polêmica
¶ Clubes pequenos não pagam prestações e ficam sem a certidão
¶ Cartolas afirmam que necessidade da certidão pode esvaziar os Estaduais
¶ Obrigatoriedade da CND é contestada na Justiça


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