Folha de S. Paulo


ALAN RUSCHEL, 27

Sobrevivente do acidente da Chape prepara retorno aos gramados

Resumo Alan Ruschel, 27, lateral da Chapecoense, foi um dos seis sobreviventes do acidente aéreo que matou 71 pessoas, no dia 29 de novembro de 2016, na Colômbia. Após viver o risco de não poder mais andar, foi submetido a uma cirurgia na região da coluna e passou oito meses se recuperando. Agora está apto a jogar pela Chapecoense. Sua volta será contra o Barcelona, dia 7 de agosto, no Camp Nou, na Espanha.

*

Após o acidente, o meu principal objetivo sempre foi voltar a andar. Não pensava muito que poderia jogar futebol naquele momento.

Com o passar do tempo fui visualizando que a possibilidade de voltar ao futebol era grande, embora os médicos sempre fossem muito sinceros comigo e não me dessem garantias que voltaria a jogar.

A partir do momento que saí do hospital aqui em Chapecó eu coloquei na cabeça que jogaria. Fiz a minha fisioterapia em casa e na piscina. Depois fui para o Juventude, em Caxias do Sul, que foi onde eu comecei a jogar. Lá, fiz a parte de academia e mais fisioterapia. Depois mantive isso em Chapecó.

Girar o corpo foi a parte mais dolorosa pra mim, porque eu tinha algumas fraturas no corpo. Eram pequenas fraturas, mas eram sete ou oito nas costas, então isso dificultava o meu giro.

Fiz apenas uma cirurgia na região das costas. Tive alguns cortes, uma cicatriz no braço direito, no joelho e na panturrilha. Eu sei que foi feito um procedimento bem complicado, pois lembro que quando o médico [doutor Edson Stakonski, médico da Chape] viu a tomografia e os exames, ele achou que eu não voltaria a andar. Mas, a cirurgia feita na Colômbia foi bem realizada. O pessoal de lá me ajudou muito, e hoje graças a Deus estou pronto.

Todos os envolvidos com o tratamento tiveram que ser cuidadosos. Acredito que todo mundo teve o cuidado necessário para que hoje eu possa estar fazendo o que eu mais gosto.

As coisas têm de ser feitas com calma, e eles trabalharam isso comigo. Hoje eu sou muito grato ao Marcos Bilibio, ao Vinicius fisioterapeuta, Guilherme e Diego [equipe de fisioterapia] e a equipe da parte física, que eu precisava recuperar. A equipe toda foi muito correta e bacana para que hoje eu possa praticar um bom futebol.

Tive que reaprender a cair em campo. Fica com um pouco de receio com a queda.

Quando voltei a treinar com bola, vi que estava muito abaixo do pessoal que estava treinando regularmente.

Durante a recuperação, fiquei um pouco triste porque eu não sabia como voltaria a jogar, mas, conforme o tempo foi passando, fui evoluindo e hoje já me sinto igual aos jogadores que estão treinando. Claro que comparar com os colegas que estão jogando é um pouco mais difícil, porque eles estão com ritmo de jogo de verdade.

FÉ NA RECUPERAÇÃO

Tarla Wolski/Futura Press/Folhapress
Jackson Follmann, Alan Ruschel e Neto no lançamento do novo uniforme da Chapecoense, em Chapecó (SC), nesta quinta
Alan Ruschel entre Jackson Follmann e Neto, também sobreviventes da tragédia

Em casa, sempre antes de dormir, agradeço por mais um dia e quando levanto também. Na recuperação, eu não tinha outro pensamento a não ser trabalho e foco no meu objetivo, no que realmente eu estava querendo.

Recebi força das pessoas em casa, minha família e, em especial, a minha esposa [Marina Storchi, 24], que sempre me ajudou e deu apoio.

Ser um jogador profissional é um sonho meu e da minha família. Consegui esse objetivo quando tinha 17 anos e agora preciso voltar a ser um atleta novamente. É um sonho que vou realizar pela segunda vez, então a força vem da minha família, das pessoas que gostam de mim e que estão perto.

Querer voltar é uma maneira de honrar as pessoas [vítimas da tragédia] que não estão mais aqui. Isso me dá muita força também.

Você fica mais traumatizado pela perda de amigos, colegas e companheiros. Passa muita coisa na sua cabeça em cada jogo que eu venho na Arena Condá. Em cada treino é difícil. O meu primeiro trabalho com o grupo todo foi muito difícil para mim, porque comecei a lembrar de muita gente.

A minha vida precisa continuar. Tem uma família que depende de mim, pessoas que dependem do meu trabalho. Preciso seguir.

O aspecto psicológico é que é o mais difícil, na verdade, mas eu estou conseguindo levar bem.

Será um sonho que estou realizando pela segunda vez. A primeira foi eu me tornar um atleta profissional e agora voltar depois de tudo o que aconteceu é uma realização. Não é só uma conquista minha, é também da minha família, um sonho de um mundo inteiro que torceu e orou por mim. Através de mim, sei que muita gente estará realizada.

Com colaboração de LUIZ COSENZO


Endereço da página:

Links no texto: