Folha de S. Paulo


'Vestibular' para a NBA tem sabatinas, treinamentos e dor de aspirantes

Técnicos e dirigentes do Dallas Mavericks aguardam a entrada do ala Wesley Mogi, 20, em quadra.

Inscrito no "draft" da NBA, o jogador do Paulistano deveria se apresentar para uma avaliação detalhada de suas habilidades. Acontece que ele está com o joelho inchado, consequência de uma pancada que sofreu durante o processo de recrutamento de calouros da liga.

Os funcionários dos Mavericks ficam preocupados. Cogitam a possibilidade de tirá-lo de quadra. Mas não adiantaria insistir. Doía, mas Mogi não deixaria passar a chance de impressionar o clube.

O brasileiro completou todos os exercícios, foi bem nos arremessos e ainda deu provas de que estava pronto para encarar o que viesse em busca de uma vaga na NBA.

Divulgação/Lakers
O ala Wesley Mogi faz um teste pelos Lakers em preparação para o
O ala Wesley Mogi faz um teste pelos Lakers em preparação para o "draft" da NBA

Mogi está há cerca de um mês nos Estados Unidos, treinando sem parar. Santa Monica, na área metropolitana de Los Angeles, virou sua base. Lá, já dividiu ginásio com Russell Westbrook, o astro do Oklahoma City Thunder, em treinos noturnos, horário que deveria ser de descanso.

Além de Dallas, ele já treinou por Brooklyn Nets, San Antonio Spurs, Utah Jazz e Los Angeles Lakers. No time californiano, foi elogiado por ninguém menos que Magic Johnson, um dos maiores astros da história da modalidade e presidente da franquia.

Nem tudo, então, é sofrimento. Para Mogi e outros jovens atletas, os preparativos para o "draft" os introduzem aos caprichos da NBA.

Agora, para assegurar um lugar nessa realidade paralela, os atletas são testados de todas as maneiras.
Boston, por exemplo, é uma das escalas com fama das mais temidas.

Lá, ao final de um treino que pode durar até 90 minutos, os jogadores são gentilmente convidados para mais uma bateria de sprints de um lado da quadra para o outro, durante mais três minutos.

A ideia é testar os atletas mais do ponto de vista psicológico do que aeróbico.

Esse famigerado exercício já é conhecido como a "Maratona de Boston". "Acabou se tornando maior do que é. São três minutos a mais só. Mas até que gostamos disso", disse o diretor Austin Ainge.

Para os estrangeiros como Mogi, não obstante a rotina de viagens e a pressão, há o desafio da comunicação.

Um episódio lembrado por um olheiro da liga ouvido pela Folha envolveu o Milwaukee Bucks e o ucraniano Kyrylo Fesenko, que jogou pelo Utah Jazz de 2007 a 2011 e hoje está no basquete italiano.

Em um dos exercícios, o assistente Brian James o instruiu a receber a bola na cabeça do garrafão, "a colocasse no chão" -uma expressão para sugerir que batesse a bola- e fosse para a cesta.

Fesenko atendeu ao pedido. Literalmente. Quando recebeu o passe, pôs a bola suavemente sobre a madeira e, de mãos vazias, correu em direção ao aro. Depois, olhou confuso para o técnico.

O olheiro se divertia dizendo que o inglês do pivô era bom, mas seu inglês para o basquete nem tanto.

O processo de avaliação dos jogadores não se resume a atividades em quadra.

Tão ou mais importante, para alguns clubes, é chance de sabatinar os jovens aspirantes, sobre os mais diversos assuntos, para tentar desvendar suas personalidades.

Em um complexo quebra-cabeça, os clubes querem saber como eles se comportam fora do ginásio. A ideia é se precaver ao máximo na hora de decidir investir milhões de dólares em um atleta.

O gerente geral do Houston Rockets, Daryl Morey, claramente se diverte com essa etapa. Sem mencionar nomes, ele tem o hábito de revelar os trechos mais inusitados das entrevistas.

"Estávamos com esse jogador, e tudo corria bem. Até que perguntamos se ele eventualmente estaria disposto a passar por um exame toxicológico. Ele respondeu assustado: 'Agora?!'", lembra.

"Em outro caso, perguntamos o que o atleta sabia sobre os Rockets. Ouvimos que era um grande time, com bela história. Aí pedimos para ele ser mais específico e falar sobre nossos jogadores", conta. "Aí ele soltou um palavrão e disse: 'Agora vocês me pegaram'", disse, sobre a franquia que contou com membros do Hall da Fama como o pivôs Hakeem Olajuwon e o ala Clyde Drexler.

Futuros candidatos brasileiros, então, já estão avisados. Esse vestibular peculiar também pede estudo.

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ENTENDA O "DRAFT" DA NBA
Processo seletivo de calouros da liga americana

QUEM PODE PARTICIPAR
> Formandos do basquete universitário americano e jogadores internacionais que completem 22 anos na temporada do "draft"

> Também podem se candidatar estrangeiros nascidos entre 1996 e 1998, atletas que estejam em atividade no universitário ou aqueles que saíram do colegial norte-americano, ao menos um ano depois de sua graduação

HISTÓRIA
Realizado desde 1947, o "draft" foi uma opção encontrada pela NBA para tentar manter o campeonato equilibrado. Anualmente, os piores times têm a chance de selecionar os melhores novatos

Editoria de Arte/Folhapress
ENTENDA O

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