Folha de S. Paulo


Andres informou Haddad de suposto pedido de propina de promotor

Em texto para a revista "Piauí" no qual diz ter sido informado de que o promotor de Justiça Marcelo Milani teria pedido propina de R$ 1 milhão para não entrar com ação judicial contra a lei que permitia à Prefeitura de São Paulo emitir R$ 420 milhões em CIDs para a construção da Arena Corinthians, o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) não diz quem lhe confidenciou a suposta infração. Segundo a Folha apurou, o informante foi o deputado federal Andres Sanchez (PT).

Em seu texto, Haddad diz ter vivido "episódio lastimável" no último ano de seu mandato, 2016. Nessa época, no segundo semestre, o então prefeito recebeu Sanchez e Luiz Bueno, ex-executivo da Odebrecht que se tornou delator da Operação Lava Jato, que queriam que a Prefeitura comprasse os CIDs, que encalharam após ação de Milani.

"Os títulos viraram um mico nas mãos do clube e da empreiteira. Alegando que haviam sido prejudicados pela ação, Corinthians e Odebrecht reivindicaram que a prefeitura, diante do imbróglio, recomprasse os papéis, invendáveis dada a insegurança jurídica provocada pela atuação do Ministério Público. Obviamente recusei a proposta, que seria lesiva ao município. Foi quando fiquei sabendo de um suposto incidente gravíssimo envolvendo o promotor de Justiça Marcelo Milani. Fui informado de que, para não ingressar com a ação judicial, o promotor teria pedido propina de 1 milhão de reais", escreveu Haddad.

Foi nessa reunião que Sanchez disse a Haddad que Milani teria feito o suposto pedido de propina. A reação do então prefeito foi levar a informação à Corregedoria-Geral do Ministério Público de São Paulo, que abriu procedimento para investigar a denúncia.

Em 2012, Milani entrou com ação por improbidade administrativa contra o então prefeito Gilberto Kassab, o Corinthians e a construtora Odebrecht. Eles foram acusados de uso irregular de incentivos fiscais para financiar o empreendimento. A ação, arquivada em 2015, pedia que o ex-prefeito, o clube e a empreiteira pagassem indenização de R$ 1,7 bilhão aos cofres públicos.

Após a denúncia de Haddad, a Corregedoria chamou Sanchez para depor. Na ocasião, ele disse que não tinha informações nem provas sobre a atuação de Milani. À reportagem, ele repete: nunca esteve com o promotor nem tratou com Haddad do assunto. O ex-prefeito não quis comentar a informação.

Nesta segunda (5), a Folha adiantou que Haddad será intimado a depor pela Corregedoria-Geral do Ministério Público sobre suas afirmações na revista "Piauí". Sobre isso, Haddad disse que "está à disposição da Corregedoria-Geral do Ministério Público para reiterar o que já disse".

A construção do Itaquerão custou R$ 1,08 bilhão, sem contar juros. Para financiar a obra, o Corinthians foi autorizado pela prefeitura de São Paulo a captar mais R$ 420 milhões por meio de emissão dos CIDs.

O processo judicial causou insegurança nos compradores potenciais dos CIDs, e até agora foram vendidos apenas cerca de R$ 48 milhões de R$ 470 milhões (em valores reajustados pela inflação). Ao todo, R$ 110 milhões estão comprometidos para empresas que manifestaram intenção de compra mas só vão realizá-la quando chegarem as cobranças de impostos. A Odebrecht, construtora do estádio, adquiriu mais de R$ 28 milhões em CIDs ao longo dos últimos anos.

Procurado pela Folha, Milani não se pronunciou sobre as acusações.

Confira o trecho do texto em que Haddad cita o caso

"Se o primeiro ano de governo foi marcado pelo dissabor dessa decisão, no quarto ano vivi um episódio lastimável envolvendo um membro do Ministério Público Estadual. O caso gira em torno da Arena Corinthians, construída pela Odebrecht. Como se sabe, quando prefeito, Kassab aprovou uma lei que permitia ao Executivo emitir 420 milhões de reais em títulos, em nome do clube, que poderiam ser usados para pagamentos de tributos municipais. Com isso, viabilizava-se a construção do estádio para a abertura da Copa do Mundo. Um promotor de Justiça entrou com uma ação contra essa lei. E os títulos viraram um mico nas mãos do clube e da empreiteira. Alegando que haviam sido prejudicados pela ação, Corinthians e Odebrecht reivindicaram que a prefeitura, diante do imbróglio, recomprasse os papéis, invendáveis dada a insegurança jurídica provocada pela atuação do Ministério Público.

Obviamente recusei a proposta, que seria lesiva ao município. Foi quando fiquei sabendo de um suposto incidente gravíssimo envolvendo o promotor de Justiça Marcelo Milani. Fui informado de que, para não ingressar com a ação judicial, o promotor teria pedido propina de 1 milhão de reais. Eu respondi que essa informação não mudava o teor da minha decisão, contra a recompra, e que não me restava alternativa como agente público senão levar o fato relatado ao conhecimento da Corregedoria-Geral do Ministério Público, para que fosse devidamente apurado.

Por recomendação do meu secretário de Segurança Urbana, Roberto Porto, ele mesmo membro do Ministério Público, chamei em meu gabinete um assessor do corregedor do órgão, Nelson Gonzaga de Oliveira, e repassamos a informação do suposto pedido de propina. Fizemos isso com a maior discrição. Sem uma ampla investigação, não haveria como atestar a veracidade da informação contra o promotor, que eu sequer conhecia. Minha denúncia, contudo, chegou aos ouvidos do próprio Marcelo Milani. E desde então ele adotou uma atitude persecutória contra mim."

ENTENDA

O que são CIDs?
São títulos que foram concedidos pela Prefeitura ao fundo de investimento criado por Corinthians e Odebrecht. Funcionam como isenção de impostos

Quem pode comprar CIDs?
Qualquer um que tenha interesse em pagar impostos da prefeitura com os papéis. Cada título custa R$ 65 mil

Quais impostos podem ser pagos com CIDs?
O Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto Sobre Serviços (ISS)

Como o Corinthians é ajudado?
À medida que são vendidos, os CIDs viram recursos para quitar os valores utilizados na construção da Arena

Como o processo judicial prejudicou a venda dos CIDs?
O processo causou insegurança nos compradores potenciais, já que os papéis poderiam perder validade

Quanto já foi vendido?
Cerca de R$ 48 milhões de um total de R$ 470 milhões, em valores atualizados. Ao todo, R$ 110 milhões estão comprometidos para empresas que só vão realizar a compra à medida que chegarem os impostos


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