Folha de S. Paulo


Mercado, e não ondas, traz Circuito Mundial de Surfe para o Brasil

Adriano Vizoni/Folhapress
Ondas em Saquarema (dir.), no Rio, contrastam com a perfeição das de Pipeline (esq.), no Havaí
Ondas em Saquarema (dir.), no Rio, contrastam com a perfeição das de Pipeline (esq.), no Havaí
Adriano Vizoni/Folhapress
Ondas em Saquarema (dir.), no Rio, contrastam com a perfeição das de Pipeline (esq.), no Havaí
Ondas em Saquarema (dir.), no Rio, contrastam com a perfeição das de Pipeline (esq.), no Havaí

A etapa do Rio do Mundial de surfe tem decepcionado em termos de ondas. Os surfistas, principalmente os estrangeiros, criticam as praias de Saquarema (RJ) pela irregularidade do mar.

As dificuldades, no entanto, já eram esperadas. O Brasil não tem praias tão boas para o surfe quanto outros lugares que recebem etapas do Circuito Mundial. Porém, tem outros atrativos para os organizadores da competição: mercado, torcida e atletas.

"Para falar a verdade, os surfistas gringos não gostam muito do evento no Brasil. Eles questionam muito a qualidade das ondas, e é uma realidade mesmo", diz à Folha Jadson André, um dos nove brasileiros entre os 32 surfistas do Circuito Mundial.

Após dois dias sem ondas, a etapa de Saquarema foi retomada apenas nesta sexta-feira (12).

"A turma chama o campeonato de 'circuito dos sonhos', com as melhores ondas, e os surfistas estão acostumados a surfar em Fiji, com ondas de 8 a 10 pés [2,5 a 3 metros] e perfeitas; Jeffrey's Bay, na África do Sul, com ondas nas quais você consegue ficar por um minuto e meio... No Brasil, eles pegam ondinhas de 'beach break' [que quebram em fundo de areia] e não ficam muito felizes. Mas eles têm que entender que somos maioria no circuito, nosso mercado é muito rico e vão ter que engolir", completa.

Há diversos fatores que explicam a qualidade inferior das ondas brasileiras para o surfe em relação às outras dez etapas do campeonato.

Basicamente, os ventos são mais fracos do que os que sopram no Oceano Pacífico e a profundidade do mar nas regiões próximas à costa é baixa. Além disso, a velocidade das águas é reduzida pela interação com os sedimentos do fundo de areia, que é móvel e faz com que as ondas mudem de qualidade e de ponto de origem continuamente -o que não acontece em locais com fundos de pedra ou de coral, como em diversas paradas do Mundial.

Surfe

"Esse tipo de mar faz o fator sorte contar muito, e isso é muito complicado, porque a maioria dos lugares do campeonato tem bancadas de coral, com ondas quebrando nos mesmos lugares, e aí o talento é o que pesa. Aqui conta mais sorte, estar no lugar certo e na hora certa", afirma Caio Ibelli, outro brasileiro.

Mundial de surfe
Etapa do Rio

Alexandre Fontes, diretor geral da WSL (World Surf League) na América do Sul, reconhece o problema de qualidade das ondas no Brasil, mas ressalta o potencial do país com atletas e público.

"O fator onda é a situação mais delicada no Brasil, porque não temos as ondas de outros lugares. Mas temos os melhores surfistas do mundo, nove na elite", afirma.

"Além disso, ao lado dos EUA, o Brasil é o país que dá mais audiência e interage em todas as mídias da Liga: Facebook, Instagram e Twitter. Do total da audiência, pouco mais de 50% se dividem entre EUA e Brasil", completa.

Fontes diz que os patrocinadores do circuito se atraem por esses números e ao ver a reação passional do público brasileiro na areia.

"O patrocinador caminha junto. É importante para a WSL que exista o interesse de alguma empresa local no campeonato, o que é mais difícil em um momento de crise e que com bastante trabalho conseguimos contornar ao fechar essas parcerias, já que perdemos o patrocínio na Riotur ao sair da Barra da Tijuca e virmos para Saquarema", afirma o dirigente. Os apoiadores locais são Oi, TNT Energy Drink e O Boticário.

Em levantamento feito pela última vez em 2012, ou seja, antes ainda das conquistas mundiais de Gabriel Medina, em 2014, e Adriano de Souza, em 2015, o Instituto Brasileiro de Surf (Ibrasurf) estimou em R$ 7 bilhões o valor movimentado pelo mercado de consumidores de produtos de surfe no Brasil.

Os gastos estariam concentrados no consumo de roupas, pranchas e outros acessórios. Mas, segundo Alexandre Zeni, diretor do Ibrasurf, os cerca de três milhões de praticantes de surfe no Brasil respondem por apenas 10% desse consumo total.

"Os EUA têm o melhor mercado, mas o Brasil vem logo atrás, e provavelmente passaria se tivesse uma condição econômica melhor", afirma.

ONDAS IMPORTADAS Alguns fatores para que as ondas brasileiras não sejam as melhores
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