Folha de S. Paulo


Vice-líder do Mundial precisou reaprender a surfar após acidente

Em meio a um ambiente tão competitivo como o do Circuito Mundial de Surfe, no qual disputam os 32 melhores do planeta, o australiano Owen Wright, 27, destoa.

Ele caminha com tranquilidade pelo palanque montado na praia de Itaúna, em Saquarema (a 100 km do Rio de Janeiro), onde está sendo disputada a quarta etapa do Mundial de surfe, sorridente, assobiando. Longilíneo, com 1,90 m e 80 kg, ele parece um simpático grilo ao transitar entre os demais surfistas que buscam concentração e ficam com semblante fechado. Sua postura leve, porém, tem a ver com episódio assustador.

Em 10 de dezembro de 2015, postulante ao título que seria conquistado pelo brasileiro Adriano de Souza, o Mineirinho, Wright tentou um tubo durante sessão de treinos em Pipeline, no Havaí, e a onda de quase cinco metros desabou sobre sua cabeça.

Atordoado, ele apresentou dificuldade para formar frases após a queda e foi levado a um hospital, onde foi diagnosticado com concussão e hemorragia cerebral. Wright também começou a sentir dificuldades para executar alguns movimentos. Após meses de fisioterapia, voltou ao mar com uma prancha e percebeu que tinha desaprendido a surfar.

"Eu não conseguia ficar de pé [na prancha], então apenas fiquei lá sobre ela, no mar, tentando pegar ondas em uma profundidade da altura do meu joelho", lembra.

"Ao mesmo tempo que foi ótimo, porque eu estava voltando a surfar, foi um pouco estranho, porque eu havia competido no Circuito Mundial no ano anterior", diz.

Depois de passar o ano de 2016 em tratamento, o australiano voltou ao Mundial em 2017 como convidado da Liga Mundial de Surfe, ocupando uma vaga para atletas lesionados. Na primeira etapa do ano, em Gold Coast, na Austrália, para a estupefação de todos, foi campeão.

"Não esperava. Eu só estava tentando entrar em ondas e chegar ao fim delas. Eu só queria entrar no mar. Foi arrebatador. Tanto que eu fiquei 'uau, o que acabou de acontecer?' Me levou alguns dias para digerir de verdade", afirma, fazendo ponderação.

"Tem sido legal ter bons resultados, mas ainda estou em recuperação, trabalho todos os dias nisso. Sinto bastante fadiga. Depois de quase 40 dias de competição, sinto que tudo foi muito difícil. Agora, no Brasil, penso que poderei descansar um pouco mais. Meu foco é ficar saudável. Tem sido bom e desafiador."

No ranking do campeonato mundial, Wright é o segundo colocado, empatado com o sul-africano Jordy Smith e atrás do havaiano John John Florence. Apesar disso, ele parece não dar muita importância ao título.

"Só quero entrar no mar e surfar. Meu foco é diferente do que tem o John John, Gabby [apelido de Medina], Jordy, neste ano. A ideia é focar na minha saúde e ter certeza de que estou bem fisicamente e mentalmente."

O combustível de Wright não é somente a vontade de superação. Ele diz ter encontrado em seu filho Vali, que nasceu em dezembro, "o sentido de tudo".

"[Vali] foi uma mudança enorme na minha vida. O acidente me deu mais perspectiva, valores diferentes. A competição aparece como uma coisa menos importante. Aliás, eu tenho agora uma força a mais para competir, que é justamente saber que competir não é um propósito em si. Estou bem, tenho uma família e é isso que é importante no final do dia."

Nesta quarta (10), Wright venceu o brasileiro Bino Lopes na repescagem e avançou à terceira fase da competição.

Surfe


Endereço da página:

Links no texto: