Folha de S. Paulo


Para avançar no Brasileiro, Santos não pode vender atletas, diz Dorival

O técnico do Santos, Dorival Júnior, está certo de que o clube precisa de um rumo diferente para não voltar a ser coadjuvante no Campeonato Brasileiro, que começa neste sábado (14).

Sua intenção é não perder um nome sequer da equipe que conduziu a duas finais em dez meses de trabalho.

A primeira foi o duelo contra o Palmeiras pela Copa do Brasil, em dezembro de 2015. Acabou vice. A outra foi a disputa contra o Audax pelo Paulista, há duas semanas. Neste caso, foi campeão.

"Se o Santos quiser dar um salto de qualidade, precisa tomar uma posição. Nem sempre aparece um Ricardo Oliveira ou revelamos um Gabriel", disse à Folha.

Seu time enfrenta o Atlético-MG neste sábado, às 18h30, em Belo Horizonte.

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Folha - Para vencer o Audax, você mudou o estilo de jogo do Santos. Como isso aconteceu?
Dorival Júnior - Foi uma decisão difícil. Mudamos um pouco a forma do Santos de jogar [com a equipe, que busca dominar os adversários na Vila Belmiro, toda recuada, apostando nos contra-ataques para vencer. Um deles, com Ricardo Oliveira, decidiu o título]. Cheguei a essa conclusão em consenso com os jogadores, mas foi um risco muito grande. A maneira como o Audax joga exigiu uma nova forma de atuar.

Acredita que esse trabalho do Fernando Diniz vai ser compreendido em outros clubes e levado adiante?
Esse conceito é usado por ele já há alguns anos. Me recordo que, no primeiro ano do Audax na elite, já foram identificadas características diferentes. Ele foi fazendo correções, melhorou detalhes e consolidou um trabalho. Caso tenha uma oportunidade em outra equipe, ele vai conseguir implantar [esse modelo].

O Santos inicia o Brasileiro e logo perderá jogadores para a seleção. Como evitar um começo ruim?
Já sabemos que a seleção vai levar jogadores importantes, por isso é preciso cuidado. O Brasileiro é problemático. Está na hora de perceber que precisamos buscar novas opções no mercado, o campeonato vai ter um nível de exigência alto.

Gabriel, Ricardo Oliveira e Lucas Lima ficam?
Se o Santos quiser dar um salto de qualidade, precisa tomar uma posição. Não é todo o momento que aparece um Ricardo Oliveira ou revelamos um Gabriel. Para ficar entre os grandes do Brasil, é preciso fazer muito mais do que vender. Se o Santos tem objetivos [do ponto de vista nacional], está na hora de se posicionar. No mínimo, não vender ninguém.

O Lucas Lima já falou em sair, o Gabriel está valorizado...
O que queremos do Santos? Uma equipe que a todo momento vai sendo reformulada ou uma equipe competitiva? Quero ver o lado técnico, não importa o que está se passando de outra maneira. Quero dar uma resposta ao torcedor para que ele veja uma grande equipe. Com essas alterações, nem sempre conseguimos.

O Santos deve ser um dos mais prejudicados nesse primeiro turno do Brasileiro pelas convocações. Como avalia isso?
O objetivo de todos os profissionais é a seleção, não podemos cortar essa possibilidade. O Brasil precisa estar bem representado, temos que viver novamente o momento em que somos respeitados. Para mostrar ao mundo que estamos nos restabelecendo, não podemos abrir mão dos melhores. Como treinador, eu também estaria convocando os melhores.
Mas o nosso calendário deveria ser mais humano. [O Brasileiro] É o melhor produto da CBF, aí deveríamos conciliar para que os clube sejam menos penalizados. A seleção é um prêmio, mas dificultará uma real possibilidade de brigarmos pela competição no início.

Você tem contribuído para este novo momento vivido pelo Gabriel. Vê semelhanças com o Neymar?
Acho que cada um tem o seu caminho, a comparação inexiste. Não comparo Rivelino, Messi ou Maradona. Cada profissional tem o seu caminho, além do momento no seu clube e na seleção.
O Neymar é acima da média, foi o melhor que treinei. O Gabriel é altamente promissor, está adquirindo maturidade, tem um belo caminho pela frente. Torço por ele. Se corrigir pontos importantes, será um dos grandes atacantes do futebol.
Quando está dentro da área, é mortal; fora dela, tem visão de jogo. Ele tem que ser mais participativo sem a bola, mas já houve um crescimento grande. Quando joga assim, as coisas fluem e ele passa a ser o homem decisivo da partida. Se tiver puder cobrar de si mesmo uma melhora constante, não tenho duvida de que vai atingir um patamar altíssimo já em 2018. Eles [Neymar e Gabriel] se completam, formariam um ataque fantástico e mortal.

Você fala em reforços, quantos nomes deseja?
Há garotos no Santos que estão sendo preparados para uma reposição rápida, confio muito nos que estão chegando. Mas acredito que precisaremos de até três nomes pela perda de jogadores importantes, ou por uma lesão que possa acontecer.

O que mudou no seu estilo como treinador? Vemos que tem exigido muita posse de bola.
Iniciei no Figueirense trazendo os meias para trás. O meia, no caso, era o Bilu, que virou um segundo volante. Fiz isso no Sport, São Caetano e no Santos, com Wesley e Arouca. Foi assim em todas as equipes que tive a possibilidade de montar e armar desde o início.
Neste ano, mudamos alguns conceitos em relação ao que vivemos ano passado, que já era uma equipe muito veloz no acabamento de jogadas, que chegava com uma transição muito rápida. Fizemos um desafio aos jogadores: para melhorar a nossa posse de bola, eles precisariam melhorar o passe.

Era um desafio individual, mas foi aceito por todo o grupo. Eles viram a importância ter a posse de bola, sem perder uma ofensividade aguda. Fico feliz que eles tenham aceito um novo conceito, nada foi imposto. É um resultado mais satisfatório, muitas vezes, do que a conquista de um campeonato.

Depois de tantas demissões e dificuldades, acredita viver o seu melhor momento na carreira?
A carreira é construída ao longo dos anos, vamos corrigindo. Não vejo o melhor momento porque ele ainda está para acontecer, não tenho dúvidas. Vou continuar trabalhando, querendo fatos novos, mudanças.
Fico feliz de viver em um momento como esse, só Deus sabe o quanto trabalhamos. Sempre que falo no meu nome, me refiro a uma equipe, não falo do treinador especificamente.

Sente-se em casa? Ganhou título nas duas passagens, seus times apresentam futebol de bom nível.
Graças a Deus, me dei bem no Figueirense, Fortaleza, Sport, São Caetano. Não tive problemas no Internacional e no Vasco, na primeira passagem. Estava cansado de trabalhos em andamento. Quando recebi o convite do Santos, vi que teria três semanas de trabalho, o que me levou a aceitar. Não cairia no mesmo erro. Do contrário, não assumiria, prefiro ficar parado. Fiquei um ano e sete meses em razão de problemas de saúde da minha mulher.

Você acompanha a vida política do país. O que acha do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff?
A saída da nossa presidente não se dá só por conta das pedaladas fiscais. Sou totalmente a favor desse impeachment, da saída de um partido corrupto e de seus principais aliados, que também se corromperam.
O senhor Luiz Inácio Lula da Silva perdeu a chance de ser o maior nome que o país já teve. Ele deixou acontecer tudo dentro do seu partido, amparado por toda a base aliada.
A corrupção está dentro do país, institucionalizada por meio de atitudes corriqueiras e pequenas. Pegando a vaga de estacionamento reservado, furando a fila, pagando por fora para conseguir alguma coisa. Precisamos dar um basta, falar um não.
Quando há uma mudança por cima, precisamos refazer a sociedade por baixo, investir em educação, saúde, dar mais segurança ao povo, isso ninguém se preocupou nos últimos anos. Se continuarmos relegando política a segundo plano, daqui a um ano estaremos nas ruas clamando por mudanças e aí o processo vai ser mais doloroso.


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