Folha de S. Paulo


CBF proíbe que clube venda jogador menos de três meses depois da compra

Para negociar o atacante Kieza com o Vitória em meados de março, menos de dois meses após tê-lo contratado do chinês Shanghai Shenxin, o São Paulo precisou pedir autorização para a CBF.

O que seria uma negociação comum entre dois clubes brasileiros se transformou em dor de cabeça por causa da nova regulamentação de registros e transferências, publicada pela CBF em 14 de março, dois dias antes de o São Paulo assinar a transferência de Kieza para o time baiano.

O contato, confirmado pela CBF, foi necessário por causa do artigo 34, a grande novidade do documento, que tem como tema as chamadas transferências ponte –e tem gerado críticas de especialistas em direito desportivo.

Rubens Chiri/saopaulofc.net
Kieza posa para foto em sua chegada ao São Paulo, em 18 de janeiro
Kieza posa para foto em sua chegada ao São Paulo, em 18 de janeiro

Pela nova regra, é proibido que um clube renegocie um atleta menos de três meses após adquiri-lo. O São Paulo havia assinado com Kieza em 18 de janeiro, portanto, feria o texto ao vendê-lo ao Vitória em 16 de março.

"Esse caso do São Paulo está provado que foi uma negociação por um critério desportivo, o jogador não deu certo. O artigo visa identificar, e coibir, casos em que essa venda seja por critérios financeiros, que alguém leve vantagem. Veja o caso do Iago Maidana", disse o diretor de registros e transferências da CBF, Reynaldo Buzzoni.

O "caso Iago Maidana" aconteceu em 2015, quando o São Paulo contratou o jovem zagueiro de um time inexpressivo de Goiás, o Monte Cristo, poucos dias depois desta equipe adquiri-lo do Criciúma.

Houve suspeita de que o Monte Cristo seria o clube ponte, para alguém ganhar mais dinheiro na transação.

O negócio foi a gota d'água para a renúncia do então presidente são-paulino, Carlos Miguel Aidar, e foi o estopim para a CBF criar a regulamentação.

No artigo 34, a confederação define transferência ponte como "toda transferência que envolva o registro do atleta em um clube intermediário sem finalidade desportiva visando à obtenção de vantagem, direta ou indireta, por quaisquer dos clubes envolvidos (cedente, intermediário ou adquirente), do atleta ou de terceiros".

"É um descompasso com o restante do mundo. Não há uma norma como essa em nenhum outro país, nem na Fifa. A CBF atinge muitas coisas que são normais nos clubes. E a análise é subjetiva: como saber se é critério desportivo ou não?", disse o advogado especializado em direito desportivo Carlos Eduardo Ambiel.

A CBF explicou que qualquer negociação que for realizada com menos de três meses após o atleta ter assinado com um novo clube ficará travada no sistema. A partir daí, a entidade vai investigar o caso. Se houver desconfiança de irregularidade, a transação será levada à Câmara Nacional de Resoluções de Disputas, que punirá ou não –essa câmara ainda não está em funcionamento porque os membros não foram definidos.

A punição varia de multa a perda de pontos e exclusão de campeonatos.

Outro item do artigo 34 causa desconfiança: o que impede um clube de emprestar um atleta caso ele nunca tenha participado de um jogo oficial pela equipe que está sob contrato.

"E se o atleta se machucar antes de estrear, ficar seis meses parado, e quando voltar o clube quiser emprestá-lo para ganhar ritmo? Não pode", disse Ambiel.

Para o advogado Eduardo Carlezzo, os mais prejudicados devem ser os clubes pequenos, que participam de Estaduais por quatro meses no ano, quando costumam se reforçar.

"Traz insegurança ao mercado nacional, haja vista que no Brasil, especialmente durante os campeonatos estaduais, é absolutamente normal a ocorrência deste fato [transferências com menos de três meses]", disse.


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