Folha de S. Paulo


Choro da mulher motivou Vagner Love a dar a volta por cima

Adriano Vizoni/Folhapress
SAO PAULO - SP - BR, 06-11-2015, 16h20: ENTREVISTA VAGNER LOVE. Retrato de Vagner Love, atacante do time do Corinthians, durante entrevista exclusiva realizada no CT Joaquim Grava. (Foto: Adriano Vizoni/Folhapress, ESPORTES) ***EXCLUSIVO FSP***
Vagner Love durante entrevista realizada no centro de treinamento do Corinthians

Vagner Love, 12 gols, um dos vice-artilheiros do Brasileiro, atacante do time que pode ser o maior campeão dos pontos corridos e que deve conquistar o hexa. Quem chega agora para acompanhar o campeonato talvez não tenha ideia do que sofreu o camisa 99 do Corinthians neste ano.

Criticado, perdeu gols, ficou no banco de reservas e ouviu muitas vaias. Em entrevista à Folha, o jogador conta que encontrou sua mulher em casa chorando por causa da má fase, o que o motivou a dar a volta por cima.

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Folha - Como explicar o que aconteceu com você?

Vagner Love - Trabalho. Nunca deixei de trabalhar, de confiar em mim. Mas sabia que, por detalhe, as coisas não estavam acontecendo.

O que tinha acontecido antes?

Sem pré-temporada, demorei para entrar no ritmo. Os jogadores estavam muito na minha frente. Isso me atrapalhou bastante.

Você chorou algum dia?

Eu não. Mas ela [sua mulher], sim. Uma vez eu cheguei em casa e a vi chorando. Aquilo me entristeceu muito. A pessoa que eu amo, minha companheira, e ela estava sofrendo mais do que eu. Eu pensei que não era possível que aquilo estivesse acontecendo. Pensei que tinha que mudar aquela situação de qualquer jeito. Então, eu entrei no campo, foquei ainda mais meus objetivos e estou conseguindo alcançá-los.

Foi depois de um jogo?

Não me lembro. Ou se foi algum comentarista que falou algo. Todo mundo estava falando muito mal de mim. Eu nunca tinha passado por um momento tão difícil.

Imprensa e torcida dizem que você perde muitos gols....

(Risadas) Nunca está bom, né? Vagner Love vende notícia. Acho que se fosse o "Joãozinho da esquina", ninguém estaria falando nada. Deixa eles continuarem falando. Falem mal ou falem bem, mas falem de mim.

Seu nome várias vezes é lembrado pelo valor do salário que você recebe do Corinthians. Como você vê isso?

Trabalhei muito para chegar a esse nível, para ganhar o que eu ganho. Eu ganho porque mereço, comecei de baixo. Eu era novo e não ganhava nada. Não posso fazer nada sobre isso. Eu estava quieto no meu canto e pediram a minha contratação. Eu falei: quero ganhar isso, tem condições? E eles falaram que tinha. Mas, nunca fica todo mundo satisfeito. Sempre tem alguém para reclamar.

Você renova o contrato?

Não sei. Isso não depende de mim. Depende do que vai acontecer, do que o Corinthians vai querer. Tenho contrato até o meio do ano que vem e vou procurar cumprir.

Seu desejo é ficar?

Eu estou muito feliz aqui no Corinthians. Não tenha dúvida disso. Mas eu deixo as coisas acontecerem passo a passo. Até há pouco tempo, eu estava num momento que as pessoas me olhavam e pediam para me mandar embora. Agora, as pessoas já começam a perguntar se eu vou renovar o contrato.

Incomoda a diretoria procurar atacantes?

De jeito nenhum. Me dá mais força para eu trabalhar, mostrar meu potencial e meu trabalho aqui dentro.

Que nota você se daria?

Ah, uns 7,5 está bom.

Não fica a vontade de ganhar o título na arena e deixar para o jogo contra o São Paulo?

(Risos) Ah, fica, claro. A gente fica com essa vontade. Por tudo que a gente fez, por tudo que a gente passou. Mas, se a gente ganhar e o Atlético-MG tropeçar, a gente já vai ficar muito feliz.

Se não for agora, pode vir contra o Vasco. Gosto especial?

De estar na minha terra, próximo da família, para comemorar com eles. Seria muito maravilhoso. São as pessoas que torcem e sofrem junto comigo.

Mata-mata ou pontos corridos?

Depende. A nossa campanha foi sensacional. Se tivesse um quadrangular, seria muito injusto. Com o campeonato e com o nosso time.

Vocês podem ser campões no sofá por causa dos pontos corridos.

Sim, isso é por causa dos pontos corridos, mesmo. Mas não sei. Talvez se a partir da 30ª rodada viesse o mata-mata, aí poderia ser algo bacana. Porque lá atrás ainda não estaria nessa diferença toda.

Este é o melhor grupo com quem já jogou na vida?

Com certeza. Um grupo maravilhoso. O de 2010 no Flamengo também era muito bom. Estou podendo fazer amizades dentro da bola, o que é difícil. Estou encontrando amigos para levar para a vida inteira. Eu vou levar isso comigo.

Quem são?

Renato Augusto, Cristian, Elias, era o Fabio Santos, Edu Dracena. Esses são os mais próximos, que eu estou sempre perto. O pessoal da fisioterapia também.

Quanto você emagreceu desde que chegou?

Não emagreci muito. Eu nunca fui de muito peso, mas perdi muita gordura. Eu devo ter perdido uns 2 kg, mas o percentual de gordura caiu muito. Quando eu cheguei, meu percentual de gordura era de 13, agora está em 10. Isso faz muita diferença.

O Tite deu força também?

Também. Não só ele, aliás. Toda a comissão técnica me apoiou muito. Aqui no laboratório, o pessoal me apoiou muito. O Tite me proporcionou esse tempo, junto com o Fábio Mahseredjian [fisioterapeuta]. Eles chegaram, sentaram comigo e falaram para eu ir trabalhar, entrar em forma e depois voltar para brigar por posição.

Algum desabafo seu que tenha sido marcante?

Não, não. Eu sou muito tranquilo. Mesmo com as críticas, eu procurei não responder ninguém. Eu sabia que a resposta era dentro de campo. As pessoas que falaram mal de mim lá trás, hoje estão falando bem. Isso é o futebol.

Qual é a maior qualidade do Tite?

Ele consegue mobilizar todos os jogadores. Isso é muito importante, ainda mais para um grupo com 32 jogadores. Você conseguir tratar todo mundo de forma igual, e fazer todos os que não vão para o jogo treinarem da mesma forma o ano inteiro. Às vezes o cara não vai para o jogo, mas está ali correndo. Porque sabe que uma hora a oportunidade vai aparecer. Acho que todo mundo que está dentro de campo teve uma oportunidade de começar uma partida como titular. Todo mundo teve condição. O jeito dele comandar faz com que ele seja diferente.

O tempo que ele ficou fora, fez diferença?

Com certeza. Não sou só eu que falo. Ele teve um período antes muito legal, já sabia muito. Quando ele saiu e teve a chance de conhecer ainda mais, voltou com novas ideias e uma pessoa muito mais completa.

Quantos hoje estão no mesmo patamar que ele?

Hoje, no Brasil? Nenhum. Ele está à frente de todos. Tem outros grandes treinadores, como o Dorival Júnior, que é um excelente treinador também. O próprio Roger, do Grêmio, acho que pode ser um grande treinador. São eles os três melhores do Brasil hoje.

Teme ficar sem o Tite, caso ele vá para a seleção?

Eu acho difícil o Dunga sair. Ele está fazendo um trabalho bom, tem de dar tempo para ele trabalhar. O Tite está aqui no Corinthians, mas se aparece um convite, com certeza ele quer algo mais na carreira dele.

O futebol brasileiro ainda suporta altos salários?

Acho que vai mudar daqui a algum tempo, até pela crise que o país está passando. Para estar bem hoje tem que estar na Europa, ou na Ásia. A não ser que o Brasil e os clubes melhorem muito.

Salário atrasado atrapalha?

O Corinthians provou isso esse ano: não atrapalha. Alguns jogadores ficaram sem receber durante um tempo, mas não influenciou em nada. Continuamos no mesmo empenho, confiamos na diretoria. Isso não nos preocupou. Eu faço o que eu gosto, então, continuamos trabalhando.

Qual foi o momento mais preocupante do ano?

Quando muitos jogadores começaram a sair. Saiu Fabio [Santos], [Emerson] Sheik, Paolo Guerrero. Poderiam ter saído outros jogadores, mas eles ficaram. Elias, Jadson... Ali poderia ter tido um desmanche muito grande. Seria um ano bem difícil. Nesse momento, o Tite faz a diferença. Conseguiu colocar o estilo dele e o que ele queria.

Você teve uma conversa com o Tite nesse momento, certo?

Sim. Eu, Gil, Cássio e Renato [Augusto]. Ficamos preocupados. Se desfazer de jogadores seria muito complicado para quem ficasse. E o presidente afirmou que ninguém mais sairia e que era para trabalhar.

Por que o Brasil está com tanta dificuldade de revelar centroavantes?

Eu acho que às vezes o jogador com 17 anos já está ganhando um alto salário e se acomoda. Chega no profissional e não rende o quanto poderia. Já tem apartamento, já tem carro... Olha para o elenco, vê os mais velhos e se acomoda. Tem que cair dentro, correr atrás. Uma hora a oportunidade aparece.

Quem são os melhores jogadores do campeonato?

Eu fico com dois: Renato Augusto e Jadson.

Você está entre os melhores?

Não sei. Se for pegar pelo lado de decidir, eu gostaria de estar.

O Renato Augusto diz que nunca viu um atacante que marque tanto quanto você.

É uma característica minha desde jovem. Já marcava, dava pique. Hoje aqui também. Isso também é uma coisa do Tite. Ele fez o Jadson voltar para marcar também. Ele vai, acompanha na lateral, chega na frente, dá passe, faz gol. Eu também tenho essa característica. Procuro estar sempre ajudando. O atacante faz o trabalho sujo.

O que você tem feito no tempo livre?

Não faço muita coisa. Fico muito em casa. Quando meus filhos vem para cá, tento dar uma volta, mas é difícil. Na segunda-feira que passou, foi aniversário do meu mais velho. Eu sou meio maluco. Fiquei pensando no que fazer, era folga e decidi ir para o Hopi Hari. Eu sou meio doido, fui lá curtir um pouco.


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