Folha de S. Paulo


Especialista vê chance mínima para Marin evitar extradição para os EUA

O tratado de extradição entre Suíça e Estados Unidos e a jurisprudência entre os dois países oferecem pouca margem de manobra para o ex-presidente da CBF José Maria Marin e os outros cartolas do futebol mundial presos esta semana em Zurique

Em vigor desde 1997, o texto do tratado reconhece somente três casos de recusa de extradição: crimes políticos, sonegação de impostos (na Suíça, trata-se somente de infração administrativa) e delitos restritos à Justiça militar.

Embora conspiração não esteja prevista na legislação penal suíça, há um mecanismo no tratado que permite a extradição de acusados deste crime desde que a infração principal seja considerada também uma violação às leis do país europeu.

Contra José Maria Marin na Justiça americana pesam cinco acusações de conspiração para fraude financeira, lavagem de dinheiro e extorsão _crimes reconhecidos na Suíça.

"Realmente há muito poucas exceções para recusa. Processos de extradição entre a Suíça e os Estados Unidos costumam ser muito céleres porque os dois países têm relações muito próximas. Não costumam haver dúvidas, por exemplo, sobre garantias oferecidas quanto ao respeito ao processo legal ou aos direitos humanos", explicou à Folha o advogado suíço Marc Henzelin.

"A Suíça não extradita ninguém que possa ser condenado à pena de morte -o que definitivamente não é a situação das pessoas que foram presas neste caso da Fifa", disse.

Henzelin defende Costa Takkas, assessor da presidência da Concacaf preso em Zurique. Segundo ele, uma das possibilidades da defesa é negociar acordos em que os acusados possam responder em liberdade ou em prisão domiciliar nos Estados Unidos.

Falando em tese, o advogado afirmou que razões médicas em decorrência da idade avançada podem ser um argumento valioso para tentar evitar a extradição.

"Foi o que fez o Reino Unido recusar o envio do [ex-ditador chileno] Pinochet para a Justiça espanhola. No caso da Suíça, isso não é um problema se o país requerente oferecer garantias de que a pessoa receberá cuidados médicos adequados. É o princípio da boa-fé entre os países", afirmou o especialista.

TRÂMITES

Os Estados Unidos têm até 40 dias para formalizar, através do canal diplomático, o pedido de extradição dos seis cartolas presos em Zurique. Se a requisição -contendo o pedido de extradição, mandado de prisão e dados sobre o processo americano -não chegar neste prazo, os acusados poderiam ser postos em liberdade.

Não existe registro de que americanos ou suíços tenham alguma vez perdido o prazo. Normalmente, o pedido de extradição costuma ser depositado duas ou três semanas após a prisão.

A partir deste momento, os extraditandos são chamados a se manifestar por escrito sobre os crimes dos quais são acusados nos EUA e sobre as objeções ao envio ao território americano. Durante todo o processo de extradição, eles permanecem detidos.

A primeira instância é administrativa. Após receber o pedido de extradição e a defesa dos acusados, o Ministério da Justiça da Suíça decide o caso. A instância de recurso é o Tribunal Penal Federal. Não existe prazo fixado.

Não há obstáculo à extradição mesmo de cidadãos nacionais entre os dois países. A Constituição Federal, para efeito de comparação, não permite que o Brasil envie um brasileiro para responder a processo ou cumprir pena em outro país.

CASO POLANSKI

Uma das brechas que podem melar uma extradição entre Suíça e Estados Unidos é problema como a documentação. Foi o caso do cineasta franco-polonês Roman Polanski. Em 2009, ele foi preso na Suíça para fins de extradição aos Estados Unidos. Em 1977, ele se declarou culpado por haver tido relações sexuais com uma adolescente de 13 anos e chegou a permanecer 47 dias preso.

No ano seguinte, ele deixou o país e foi condenado à revelia a 50 anos de prisão. A defesa de cineasta alegou que a condenação foi injusta porque o Ministério Público americano rompeu um acordo com ele.

Dois meses após a sua prisão para extradição, Polanski foi transferido para um regime de prisão domiciliar (com bracelete eletrônico) mediante uma fiança de 4,5 milhões de francos suíços (R$ 15 milhões, em valores atuais). Como os Estados Unidos se recusaram a enviar os registros da audiência entre Polanski e o promotor do caso à época, a Suíça rejeitou a extradição e o pôs em liberdade.

"No caso do Polanski, os americanos esconderam o acordo que foi feito", disse Henzelin.

Entre a prisão de Polanski e a decisão final passaram-se oito meses.

Os indiciados


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