Folha de S. Paulo


Análise

O sorriso de Joseph Blatter e a corrupção dentro da Fifa

Sepp Blatter entrou no elevador cercado por seguranças. Sorria. O hotel em Maracaibo recebia o chefe da Fifa na semana da final da Copa América da Venezuela, Brasil x Argentina. Simpático, Blatter ouviu minha pergunta sobre a organização do torneio e respondeu: "Um sucesso!"

Sua rotina de viagens dura desde quando era secretário-geral de João Havelange, na Fifa dos anos 80. Seus sorrisos e negócios estampam as páginas do livro "Jogo Sujo", de Andrew Jennings. Os métodos são parecidos com os de Havelange, que chegou à Fifa por visitas e favores a países da África, Ásia e Oceania.

Vários deles convidados para a Minicopa, promovida pela CBD em 1972, para festejar os 150 anos da Independência do Brasil e ganhar votos para a eleição da Fifa.

Eram visitas, favores e propinas, como mostra o FBI. Nas eras Havelange e Blatter, o mapa do futebol expandiu-se, os tentáculos da Fifa também.

Só que a investigação do FBI faz pensar que a corrupção está restrita à América Latina. Estão presos o brasileiro José Maria Marin, o costa-riquenho Eduardo Li, o venezuelano Rafael Esquivel, o uruguaio Eugenio Figueredo.

O monopólio da corrupção não é latino-americano. O Brasil é 69º no ranking dos países mais corruptos, da Transparência Internacional. Empata na posição com a Itália, cujo campeonato passou afundar durante a operação mãos limpas, nos anos 90.

"Jogo Sujo" trata o suíço Blatter como líder da quadrilha. Os latinos estão até o pescoço nisso, porque os países sofrem de corrupção endêmica e porque a geografia facilita acordos no território dos EUA, lógica para o FBI atuar.

Mas não há cartola africano corrupto? Não pense que o futebol inglês estará livre de escândalos se a Scotland Yard investigar. Claro que há diferenças culturais. O Reino Unido é o 14º país menos corrupto e os EUA, o 17º.

Só por isso e porque o FBI investiga as negociatas ocorridas nos EUA, quem deve se preocupar mais é quem vive do lado de cá do Atlântico.

A corrupção existe no mundo todo. A diferença é onde há sistema para bloqueá-la. Em 2004, o presidente do Munique 1860, Karl Wildmoser, foi preso acusado de levar propina na construção da Allianz Arena, de Munique.

O FBI faz ao futebol o favor de anunciar que esse tipo de conduta não mais será tolerada. É provável que Blatter ganhe a eleição nesta sexta, mas não estampará sorriso tão largo quanto o que exibia no elevador em Maracaibo.

Marcelo Pliger/Editoria de Arte/Folhapress
PARTICIPAÇÃO DOS INDICIADOS NOS ESQUEMAS DE CORRUPÇÃOSegundo o Departamento de Justiça dos Estados Unidos
PARTICIPAÇÃO DOS INDICIADOS NOS ESQUEMAS DE CORRUPÇÃOSegundo o Departamento de Justiça dos Estados Unidos

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