Folha de S. Paulo


Ginasta passa metade da vida longe da mãe por sonho olímpico

Este Dia das Mães será especial para Rebeca Andrade, 16. A ginasta passará a data na casa da sua mãe, Rosa Rodrigues dos Santos, 44, junto com seus sete irmãos. Acontecimento raro no dia a dia da atleta que, desde os 8 anos, mora longe de casa.

Apesar de não viver com a mãe, é no apartamento simples em que ela mora, em Guarulhos, que Rebeca guarda todas as medalhas e troféus que conquista no caminho para realizar seu sonho: ganhar uma medalha olímpica na prova individual geral.

A última conquista foi no fim de semana passado, quando ficou com a medalha de prata na prova de salto da etapa de São Paulo da Copa do Mundo de ginástica artística, competição disputada no ginásio do Ibirapuera.

Foi lá que Rosa viu pela primeira vez a filha participando de uma competição internacional adulta.

"A gente já assistiu a outras, mas não eram assim, de tanta importância. Quando são fora do Estado, ou fora do país, a gente não tem condições de acompanhar", conta Rosa, que trabalha como empregada doméstica.

INÍCIO DIFÍCIL

Devido à origem humilde da família, desde muito pequena, Rebeca enfrentou dificuldades para treinar.

Aos 5 anos, ela foi levada por uma tia para um teste no ginásio Bonifácio Cardoso, em Guarulhos, e foi aceita para a escolinha de ginástica.

Apesar de chamar a atenção dos treinadores, Rosa não entendia como a filha poderia seguir a carreira de atleta.

"As pessoas falavam: 'Essa menina tem futuro, ela é para Olimpíada', e eu não acreditava. Não pelo talento, mas pela dificuldade. Eu pensava: 'Futuro? Como?'"

Para que a filha frequentasse os treinos, Rosa dava o dinheiro da condução para que o filho mais velho, Emerson, hoje com 24 anos, levasse a irmã até o ginásio.

Quando as pernas já não aguentavam mais as caminhadas até o trabalho, Rosa falou para a filha que não poderia mais dar o dinheiro para que ela fosse aos treinos.

As ausências frequentes de Rebeca foram notadas.

"O pessoal de lá disse: 'Essa menina veio para brilhar. Ela é uma atleta de ponta e não pode faltar no treino'. Aí eles se mobilizaram. Levavam para o ginásio, depois para a escola e traziam para casa."

A tranquilidade para frequentar diariamente os treinos só chegou quando Rebeca, na época com 8 anos, foi levada pela técnica Keli Kitaura, que a acompanhava desde o início, para o Cegin (Centro de Excelência de Ginástica), em Curitiba (PR).

Um anos depois, as duas receberam uma proposta para ir para o Flamengo, clube em que estão até hoje.

SAUDADE

Por outro lado, a distância aumentou a saudade da família, o que mãe e filha tentam amenizar com ligações telefônicas diárias e trocas de mensagens pela internet.

"O que me preocupava era acontecer alguma coisa e eu não estar presente. Mas falei para ela: 'A mãe está deixando você seguir o seu sonho, mas não me esconda nada. Seja o que acontecer, vamos conversar por telefone.' E deu certo", conta Rosa, que visita a filha todo mês no Rio.

Quem acaba sentindo mais falta de Rebeca são os irmãos, que não podem acompanhar a mãe nas visitas.

"Eles cobram muito a presença dela. Mas quando veem as medalhinhas dela pregadas na parede, eles falam: 'Vale a pena, mãe. Vale a pena o sacrifício'", diz Rosa.


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