Folha de S. Paulo


Talvez eu tenha sido o maior tirano da história do Atlético-MG, diz Kalil

Antes do jogo contra o Coritiba, domingo (30), Alexandre Kalil foi ao gramado do Independência. Chorando e sob aplausos da torcida do Atlético-MG, despediu-se.

Era sua última partida como presidente do clube, que dirigiu desde 2008. No comando do Atlético-MG, tornou-se ídolo pelo estilo folclórico, centralizador e, sobretudo, torcedor de gerir.

Brigou com a CBF e, em seguida, fez as pazes. Recusou-se a jogar no Mineirão novo para atuar no Independência, "casa do time". Contratou Ronaldinho, contrariando indicações de aliados.

Curiosamente, esse jeito controverso o levou a um patamar de intocável no Atlético-MG. À Folha, Kalil, que viu seu vice, Daniel Nepomuceno, ser eleito novo presidente ontem, diz que fez do time uma "máquina de ganhar".

O presidente mais vitorioso da história do Atlético, porém, afirma que não vai mais palpitar no time. Com o mesmo estilo autoritário que prevaleceu nos últimos seis anos, diz: "Não vou mandar mais porra nenhuma".

Folha - Como é deixar a presidência do Atlético?
Alexandre Kalil - Muito emocionante, né? Sair assim, com a sensação do dever cumprido. Fiquei o tempo certo. Esse é o tempo que o dirigente tem que ficar. Não há motivo para ficar 10 anos, 20 anos agarrado ao poder. Entrego um clube muito melhor, com títulos inéditos. Estamos classificados para a terceira Libertadores consecutiva, o que nunca aconteceu. O que mudou no Atlético de 2008 para 2014?

O Atlético estava no fundo do poço. Pega no seu arquivo, 2009. Vê a história do Atlético. Não tem nada que não está melhor. Não porque eu sou muito bom, mas porque estava muito ruim. Pior não ficava. Entregamos hoje um clube completamente reformulado. O Atlético-MG aprendeu ganhar.

O senhor brigou com a CBF, contratou o Ronaldinho. Quais atitudes que marcaram sua gestão no Atlético?
O cuidado com as divisões de base. Temos uma casa para o Atlético [Independência]. Isso foi muito importante, sem custo. Não fizemos um tostão de dívida. Temos outra casa [Mineirão]. Um centro de treinamento maravilhoso. O Ronaldinho. Fui campeão sub-17. Temos 23 títulos das categorias de base. Fizemos uma máquina de ganhar. É só você olhar o plantel do Atlético. Temos diversos jogadores da base: Dodô, Jamerson, Marcos Rocha, Carlos. E o Bernard.

Bruno Cantini-14.jul.13/Divulgação
O ex-presidente do Atlético-MG, Alexandre Kalil
O ex-presidente do Atlético-MG, Alexandre Kalil

O Atlético não tem esporte, só tem futebol. Acabei com tudo. Não tem mais nada. Somos time de futebol.

Por outro lado, o Atlético-MG registra uma alta dívida...
Absolutamente. Qual clube do Brasil que diminuiu a dívida? Vê o Botafogo, o São Paulo. Se você me apresentar um clube que diminuiu a dívida... O que aumentou foi o serviço da dívida, juros sobre juros. Nós temos zero de dívida trabalhista. Entramos no Refis e fomos aceitos. Só de desconto temos R$ 140 milhões, de multas e prejuízos fiscais. É inadmissível falar um negócio desse. Fechamos todos os anos da minha gestão com superávit.

Outros presidentes, como o Belluzo (Palmeiras), deixaram o cargo cansados e amargurados. É assim que o senhor se sente?
Saio muito feliz, com salário em dia. Não poderia morrer sem ser presidente. Tinha que ser. Nasci para ser. Vou andar de motocicleta. Sou um homem simples. Quero aproveitar a minha vidinha.

Agora, fora da presidência, vai continuar dando as cartas no Atlético?
Eu não mando em porra nenhuma. Eu sou um velho de 55 anos. A cabeça dele [Daniel Nepomuceno, novo presidente] é completamente diferente da minha. Se eu quisesse continuar, mudava o estatuto e continuava eu mandando. O Daniel não tem personalidade para aceitar ex-presidente. Talvez eu tenha sido o maior tirano da história do Atlético-MG. Só ouvia quando queria. Ele não vai ser mandado.

O senhor se considera o melhor presidente da história do Atlético-MG?
Não sou pretensioso assim. O melhor presidente foi o meu pai. Eu sou um bom presidente. Até meus detratores têm que admitir. Eles estão com a privadinha fechada [refere-se à boca fechada].

Acha que nesses seis anos o futebol brasileiro melhorou?
Nós [Atlético] demos um salto. O futebol brasileiro continua com situação de correr atrás. A bolha do futebol estourou. Cadê as propostas, os milhões de dólares pelos nossos jogadores?

RAIO-X

NASCIMENTO

25 de março de 1959 (55 anos), em Belo Horizonte

PROFISSÃO

Empresário

NO FUTEBOL

Filho de Elias Kalil, ex-presidente do Atlético-MG entre 1980 e 1985; à frente do clube desde 2008, onde também foi presidente do conselho deliberativo, venceu a Libertadores de 2013 e a Copa do Brasil de 2014


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