Folha de S. Paulo


Análise: Em vez de se resignarem, mineiros investiram

Ser mineiro é não dizer o que faz nem o que vai fazer.

E talvez por isso, como no poema de Carlos Drummond de Andrade, tenha-se demorado tanto para perceber que Minas manda no futebol brasileiro há dois anos. A final da Copa do Brasil entre Atlético e Cruzeiro não é o início desse processo. Nem o fim.

"Mineiro só acredita na fumaça quando vê o fogo."

Drummond era um gênio.

A fumaça começou em 2012, quando o Atlético contratou Ronaldinho Gaúcho, e o Cruzeiro foi buscar o diretor-executivo Alexandre Matos, ex-América.

O Galo já estava ousando, e o Cruzeiro aprendia a agredir, o que faltou no primeiro ano do presidente Gilvan Tavares, quase rebaixado pouco depois de tomar posse.

Diferentemente do que Drummond escreveu, os mineiros arriscaram apesar de não terem certeza. "O Cruzeiro percebeu que não adiantava ter um estádio espetacular sem um time do mesmo nível", diz Matos. "Contratamos o Ronaldinho, deu certo e criou-se um ciclo virtuoso", afirma o presidente do Atlético, Alexandre Kalil.

Em 2011, o Cruzeiro só não foi rebaixado no Brasileiro porque goleou o Atlético por 6 x 1 na última rodada -o Galo terminou em 15º lugar.

No ano seguinte, o Atlético foi vice-campeão, e o Cruzeiro ficou em nono. Em 2013, o Cruzeiro ganhou o Brasileirão, e o Atlético venceu a Taça Libertadores.

SUPREMACIA RIO-SP?

Matos foi criticado no Cruzeiro por aumentar os salários e a dívida. Mas a receita cresceu, o que também aconteceu no Galo. Há cinco anos, discutia-se como se sairia da mais longa supremacia Rio-SP.

Em 1959, o Bahia foi campeão da Taça Brasil e, sete anos depois, o Cruzeiro venceu o torneio. Só entre 2004 e 2012, com oito Campeonatos Brasileiros divididos entre cariocas e paulistas, houve hegemonia maior.
Inter e Grêmio pareciam próximos de quebrar a escrita. Os mineiros a quebraram.

Drummond também escreveu que ser mineiro é ter coragem e bravura. Quanto mais investiam, mais cruzeirenses e atleticanos arrecadavam. A TV hoje paga mais para Cruzeiro e Atlético do que para Palmeiras e Vasco. No pay-per-view, ganham mais do que o São Paulo.

Os mineiros não vão explicar muito mais sobre o ciclo virtuoso que se criou porque mineiro não estica conversa com estranho. Mas está claro que em Minas o ovo nasceu antes da galinha.

Os clubes radiografaram que perdiam porque o eixo Rio-SP tinha mais receita. Em vez de se acomodarem, Cruzeiro e Atlético investiram.

"Nos últimos cinco anos, o Atlético ganhou 18 títulos em divisões de base", lembra Kalil. Jémerson e Carlos são titulares indiscutíveis do Galo finalista da Copa do Brasil. Na Toca da Raposa, Mayke, Lucas Silva e Allison saíram da base para brilhar.

Como também diria Drummond, "ser mineiro é vender queijos e possuir bancos."


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