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Em depoimento, gremista nega intenção de ofender goleiro do Santos

André Antunes/Futura Press/Folhapress
Patrícia Moreira chega à delegacia para prestar depoimento em Porto Alegre
Patrícia Moreira chega à delegacia para prestar depoimento em Porto Alegre

A auxiliar de odontologia Patrícia Moreira, 23, torcedora do Grêmio identificada como autora de xingamentos contra o goleiro Aranha, negou na manhã desta quinta-feira (4) que tenha tido a intenção de ofender o jogador do Santos.

Patrícia prestou depoimento na Polícia Civil em Porto Alegre, acompanhada do advogado e do irmão.

De acordo com o delegado Cléber Ferreira, Patrícia esteve calma durante o depoimento e não respondeu se estava arrependida. "Ela não nega ter proferido aquelas palavras, mas diz que a intenção dela não era ofender o goleiro do Santos. Simplesmente, ela falou porque foi no embalo da torcida", declarou.

O depoimento de Patrícia durou cerca de uma hora. Ela deixou o local em silêncio, sem falar com a imprensa. Manifestantes ligados à Unegro (União de Negros pela Igualdade) levaram uma faixa ao local para protestar contra o racismo. Um deles chegou a gritar para a torcedora: "Vem falar com o macaco aqui agora!".

Segundo Ferreira, Patrícia disse que os cânticos com a palavra "macaco" são usuais na torcida e que não foram direcionados ao goleiro Aranha. Apesar de não ter definido formalmente sua atitude como racista, para a polícia, ela reconhece que ofendeu a honra de outra pessoa. Segundo o delegado, a estratégia apresentada pela defesa é de afastar o dolo.

"Ela explica que o próprio [hino da torcida do] Internacional, eles se dizem 'macacos'. Ela diz como a torcida estava toda falando 'macaco' e proferindo aquelas palavras, ela também proferiu. Mas a questão dela não é especificamente ofender a honra daquele goleiro", disse o delegado.

A jovem afirmou ainda não fazer parte de torcidas organizadas e que esta foi a terceira vez que foi à Arena do Grêmio. Patrícia, que perdeu o emprego após o episódio, também relatou que tem sofrido ameaças por telefone e nas redes sociais, além de ter tido sua casa apedrejada.

O delegado afirmou ainda que fotos retiradas das redes sociais da torcedora, antes que ela deletasse seus perfis, podem também fazer parte do inquérito, mas afastou a possibilidade de Patrícia ser acusada por racismo. Para a polícia, o caso é de injúria racial, crime afiançável que pode acarretar pena de um a três anos de reclusão.

Ainda esta tarde, a polícia vai ouvir duas testemunhas que podem auxiliar na identificação de mais torcedores que estavam na Arena. O delegado Cléber admitiu ainda que Patrícia pode ser chamada outra vez para mais esclarecimentos.

O advogado de Patrícia, Alexandre Rossato, disse à Folha que a torcedora está arrasada e fala que não considera sua atitude racista e também que nunca foi racista, tendo inclusive namorado negros. "Arrependimento existe pleno", afirmou.

Para ele, a rivalidade entre Grêmio e Internacional tem de ser levada em conta na atitude de sua cliente. "Há cantos do Internacional orgulhando-se de ser macaco. Em todos os jogos do Grêmio, independentemente do adversário, são proferidos esses cânticos. Jamais a conjuntura foi de discriminação", declarou.

Segundo o advogado, ela não tem acompanhado a repercussão do caso. Desde que sofreu ameaças por telefone e pelas redes sociais, está sem telefone nem internet. Deixou Porto Alegre, onde vivia, e alugou um imóvel esta semana –o advogado não quis informar o local.

O CASO

A repercussão sobre o caso de racismo contra Aranha começou após a divulgação de imagens cedidas pela ESPN Brasil, que transmitia a partida entre Grêmio e Santos.

No vídeo, Patrícia aparece chamando o jogador de "macaco" durante o jogo. Ela foi afastada de seu trabalho de auxiliar de saúde bucal, na Brigada Militar, na sexta-feira (29).

À polícia Aranha relatou ao menos quatro pessoas envolvidas nos xingamentos. Com base em seu depoimento, o Ministério Público abrirá um processo por injúria racial contra os participantes.

Na quarta-feira (3), o Grêmio foi excluído da Copa do Brasil por causa dos xingamentos no estádio na partida contra o Santos.


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