Folha de S. Paulo


CBF elabora projeto para ter garotos por mais tempo nas seleções de base

Em novembro de 2013, na Bolívia, a seleção brasileira sub-15 não passou de um quinto lugar no Campeonato Sul-Americano da categoria.

A campanha foi tema de discussão na CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e fortaleceu a elaboração de um projeto que será apresentado ao governo federal.

"A Alemanha inicia com oito, nove anos e o país de futebol tem essa lacuna importante na base. Nosso jogador está começando a ser formado muito tarde, e isso atrapalha o pico da pirâmide, que é a seleção brasileira principal", disse em entrevista exclusiva à Folha Alexandre Gallo, coordenador das categorias de base da CBF.

A preocupação na entidade com a formação de atletas cresceu ainda depois da derrota de 7 a 1 para a Alemanha, na semifinal da Copa do Mundo, e porque daqui menos de dois anos um time formado quase todo por atletas com menos de 23 anos vai tentar um inédito ouro olímpico, dentro de casa, no Rio.

Jorge Araujo - 8.ago.2014/Folhapress
Gallo dá entrevista em hotel de São Paulo onde estava com time sub-20
Gallo dá entrevista em hotel de São Paulo onde estava com time sub-20

Gallo, 47, ex-volante com passagens por Corinthians, Santos e São Paulo, será o treinador do time olímpico. Pela primeira vez desde 2004 a CBF decidiu separar o comandante da equipe sub-23 daquele que treina o principal, que tem Dunga de volta."É melhor para os dois a separação. Acha mais fácil dirigir dois times ou um?".

Nesta entrevista, Gallo conta como deve armar o time com os reforços dos três atletas acima de 23 anos e que a seleção olímpica jogará amistosos no Brasil para fidelizar o torcedor para 2016.

Formação na base
O projeto que será apresentado pela CBF para diminuição da idade tem a simpatia do ministro do Esporte, Aldo Rebelo, que após os 7 a 1 falou que seria importante para evitar que garotos deixassem o país muito cedo.

"No sul-americano sub-15 de 2013, 14 dos nossos jogadores nunca tinham disputado um torneio internacional. Somamos 27 dias de trabalho no total em um ano, contra 120 do Chile, por exemplo. Nos EUA, garotos de 13 anos ficam 300 dias no CT da seleção. O mundo inteira antecipa a formação dos atletas, menos nós", disse Alexandre Gallo.

Segundo ele, garotos de 12 e 13 anos estão na fase do aprendizado para errar menos. "Nessa categoria de 13, 14 anos, é um jogo de erros, não de acertos. Você minimiza o erro trabalhando taticamente e tecnicamente. Como fazer isso em 27 dias?", perguntou.

Ele contou que, ao assumir, aumentou de quatro para dez o número de convocações anuais, mas ainda é pouco.

"Precisamos ter esses atletas mais tempo".

Futebol integrado
Por que ficar mais tempo? Para Gallo, é importante para que as seleções de base do Brasil tenham padrão de formação, e também de jogo, semelhantes, como ocorre com times como Espanha e Alemanha, por exemplo.

"Nós jogamos no sub-15, sub-17 e sub-20 dentro de um padrão único. A comissão técnica da sub-20 hoje já passou por sub-15 e sub-17. Isso unifica a maneira de trabalho", disse, também sobre a parte tática.

"Jogamos num 4-3-3, de preferência. Sempre tem que haver um ou dois planos B, mas a ideia é ter padrões definidos e atuar da mesma maneira. O futebol brasileiro tem que ir a campo e propor futebol, está no nosso DNA. Nessas categorias, nossos rivais sempre nos enfrentam marcando, com duas linha de quatro", afirmou o treinador.

Integração olímpica
Em julho, quando Gilmar Rinaldi assumiu como coordenador das seleções, foi apresentado projeto para integrar a seleção principal com a olímpica. Em cada lista, entre seis e oito atletas com idade entre 20 e 23 anos seriam chamados por Dunga.

Duas semanas depois, o projeto mudou. Agora, a seleção olímpica será convocada completa nas datas-Fifa, e terá calendário paralelo à principal. Segundo Gallo, não foi um pedido de Dunga para mudar.

"Nessas semanas pensei bastante na possibilidade de ter o grupo 100% junto, apresentei o projeto, e o Gilmar, o Dunga e a presidência aprovaram", disse Gallo.

Pelo projeto do coordenador da base, a seleção olímpica fará até 20 partidas até a Olimpíada. Nesta segunda (11), Gallo convocou jogadores sub-21, que fazem parte do projeto olímpico, para disputar jogos amistosos no Qatar.

Atletas como o zagueiro Marquinhos (PSG), o lateral esquerdo Wendell (Bayer Leverkusen) e o volante Lucas Silva (Cruzeiro), que estavam até cotados para aparecer na primeira lista de Dunga na seleção principal, que será divulgada dia 19 de agosto, vão jogar em Doha e, portanto, estão fora do time principal neste primeiro momento.

A seleção jogará amistosos nos EUA, contra Colômbia e Equador, no início de setembro, mesmo período que o time sub-21 estará no Qatar.

"Mas a ideia é ter integração. Já conversei com o Dunga quais os garotos que já estariam prontos para o time principal", disse Gallo.

Fidelizar o torcedor
Os amistosos da seleção olímpica serão realizados no Brasil, ao contrário do time principal, que normalmente joga fora do país porque a CBF tem contrato com uma empresa para promover essas partidas.

"A ideia é fidelizar o torcedor, entendendo o que é esse time olímpico, identificando esses jogadores. Se o Dunga jogar quarta e domingo, nós jogaremos terça e sábado, para que todos possam acompanhar esse time".

Além do Rio, haverá jogos na Olimpíada em São Paulo, Belo Horizonte, Brasília e Salvador.

"Podemos usar as arenas [da Copa]. Vamos enfrentar num primeiro momento times principais. Teremos jogos difíceis na Olimpíada, por isso precisamos de jogos difíceis nos amistosos também".

Veteranos em um setor só
Gallo tem um plano para a montagem do elenco para 2016. Em vez de convocar veteranos (a regra permite três acima de 23 anos na Olimpíada) para várias posições, ele pensa em formar setores fortes.

A tendência, hoje, seria priorizar o ataque, com Neymar e outros dois atletas mais experientes no setor ofensivo.

"É um conceito meu: você pode pulverizar força ou concentrar força. Por exemplo: se a Argentina jogasse a Olimpíada e levasse Messi, Agüero e Higuaín? Não preocuparia? Você concentrando força num setor você ganha aquele setor", disse.

Brasileiros em outras seleções
Outro projeto é o de mapear jogadores brasileiros, que deixaram o país garotos, e podem atuar por outras seleções.

Segundo Gallo, foram encontrados 32 atletas nascidos em 95 com este perfil, mas eles escolheram sete para tentar evitar que defendam outros países, como acontece com Diego Costa, na Espanha, e Thiago Motta, na Itália.

Um deles, Andreas Pereira, 18, meia do Manchester United nascido na Bélgica, mas filho de brasileiros e que tem as duas nacionalidades, foi convocado para um torneio na China, em junho deste ano.

"Tem também o Marcos Lopes, do Manchester City [que está emprestado ao Lille-FRA], que chamamos para o Torneio de Toulon, mas que já estava convocado por Portugal para o Europeu sub-19. O problema maior, na verdade, são jogadores nascidos em 93 e 94, que nem passam pela base e já são convocados direto para as seleções principais de outros países. Esses estamos mapeando", disse o treinador.


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