Folha de S. Paulo


Rebaixamento da Portuguesa é ilegal, afirmam advogados

O Estatuto do Torcedor pode jogar a favor da Portuguesa no julgamento do próximo dia 27, que vai tratar da pena de perda de quatro pontos que culminou no rebaixamento do clube à Série B.

Segundo a tese do advogado Carlos Ambiel, mestre em direito do trabalho pela USP e professor da Faap, os artigos 35 e 36 do estatuto contrariam o artigo 133 do CBJD (Código Brasileiro de Justiça Desportiva), que fundamentou a decisão desfavorável à Lusa.

"Os artigos 35 e 36, de 2010, afirmam que as suspensões devem ser comunicadas nos sites das competições para terem validade, o que não aconteceu no caso da Portuguesa", diz Ambiel, cuja tese foi publicada no blog de Juca Kfouri, colunista da Folha.

Já a regra expressa no artigo 133 do CBJD diz que as penalidades se iniciam imediatamente após o julgamento. Como os dois direcionamentos se opõem, a norma do estatuto é a que deve prevalecer, segundo Ambiel.

As decisões do julgamento do dia 6, que condenou Héverton a dois jogos de suspensão -um já havia sido cumprido- só foram publicadas no site da CBF às 18h30 de 9 de dezembro, um dia após a partida Lusa x Grêmio, na qual ele atuou suspenso, na visão do STJD.

"Trata-se de hierarquia jurídica. O estatuto é uma lei federal. O CBJD é uma resolução administrativa", explica. "A lei sobrepõe-se à resolução e revoga o texto do CBJD", afirma Ambiel. "E se isso não fosse suficiente, o Estatuto [de 2010] é mais recente que o CBJD, de 2009", diz.

A tese de Ambiel é defendida pelos advogados Ives Gandra Martins e Eduardo Arruda Alvim, especialistas em direito constitucional.

"Isso é matéria básica de direito. Qualquer universitário sabe disso", afirma Gandra. "Eu duvido que a procuradoria do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) não saiba disso", completa. "Uma lei federal sempre se impõe sobre qualquer resolução", diz Arruda Alvim.

Ariel Subirá-16.dez.2013/Futura Press/Folhapress
Torcedores da Portuguesa lamentam rebaixamento após o resultado do julgamento na sede do STJD, no Rio
Torcedores da Portuguesa lamentam rebaixamento após o resultado do julgamento na sede do STJD, no Rio

EQUÍVOCO

Paulo Schmitt, procurador do STJD que denunciou a Portuguesa, nega que haja qualquer conflito.

"A premissa é equivocada, pois no estatuto estamos falando da publicidade das decisões através das relações do torcedor com a Justiça desportiva e não das partes no processo desportivo", diz.

"As normas que regulam a Justiça desportiva, segundo o decreto são a Lei Pelé e o CBJD, não o Estatuto do Torcedor", afirma.

"A eficácia da decisão na Justiça desportiva se dá através da proclamação do resultado, que estabelece com clareza que as decisões devem ser cumpridas assim que proclamadas. E em caso de suspensão, no dia seguinte ao julgamento", diz Schmitt.

LEIA A ÍNTEGRA DA EXPLANAÇÃO DO PROCURADOR PAULO SCHMITT

_"Agora circula em alguns blogs e sites um estudo feito pelo Dr. Ambiel sobre as publicações de decisões da Justiça Desportiva, que em tese teriam validade apenas após serem veiculadas no site da CBF, devendo ser pura e simplesmente ignorada a regra do art. 133 do CBJD.

A premissa é equivocada, pois embora o argumento utilizado se prenda a ideia de publicação das decisões no sítio eletrônico previsto no art. 5o. do Estatuto, notadamente face as alterações de 2010 que assim complementou o art. 35 com essa exigência, estamos falando de eficácia / validade e não de publicidade / nulidade.

Nada mudou na verdade após a edição das alterações do Estatuto. Tanto a exigência de publicação em órgão oficial como Diário da Justiça previsto no texto originário do Estatuto, como o seu complemento em 2010 para dar maior alcance e transparência através de publicação no site da CBF. E por que nada mudou? Simplesmente porque não há uma relação direta entre a publicidade e transparência com a condição de validade e eficácia das decisões na Justiça Desportiva, que não se assemelha em nada com a Justiça Comum.

Estamos diante de uma área dinâmica que reclama instrumentalidade de formas, celeridade, oralidade para que o direito seja a ela aplicado. Mas é compreensível que quem nela não milite não a compreenda. Os princípios para resguardar publicidade e transparência estão assegurados desde que ocorram as "publicações" das decisões nos diários oficiais e ou site da CBF, sendo nulas se assim não forem disponibilizadas ao torcedor desta forma. Porque é meio de acesso e controle DO TORCEDOR e não das partes no processo desportivo. Já a eficácia da decisão na Justiça Desportiva se dá através da "proclamação" do resultado, com os ditames e regramentos previstos no art. 133 do CBJD.

Nesse aspecto não há que se falar em conflito ou hierarquia das normas, porque foi a própria Lei (com L maiúsculo mesmo, no caso a Lei Pelé, que no seu art. 11 fixou a competência do CNE para editar os códigos disciplinares, dentre eles o CBJD. E mais, se á para falar de normas mais recentes, o Decreto 7.984 de 08/04 deste ano de 2013 e que regulamentou a Lei Pelé, no seu art. 40, prevê que a Justiça Desportiva regula-se pela Lei 9615/98, pelo referido Decreto e pelo CBJD, e não pelo Estatuto do Torcedor. Como se sabe o Estatuto, nos seus arts 34, 35 e 36 - CAPÍTULO X, regula a relação do Torcedor com a Justiça Desportiva.

Assim, sem mais delongas, não existe nulidade alguma nas decisões do STJD porquanto regularmente publicadas no site da CBF, porém para fins de cumprimento das penas, condição de eficácia das penalidades, aplicável indene de dúvida o art 133 do CBJD, que estabelece com clareza solar que as decisões devem ser cumpridas assim que proclamadas, sendo no mesmo dia da sessão se absolutórias, e no dia seguinte, se condenatórias.

Do contrário, ao aceitar mais essa tese, assim como a esdrúxula do dia útil, reclamaria análise de todas as decisões e respectivas datas de publicações para denunciar quem nessa linha de raciocínio cumpriu antecipadamente.

O fato é que todo esforço doutrinário de agora e que ganha eco para alguns blogueiros, mais parece um componente do vale-tudo a justificar o descumprimento das normas desportivas nesses casos de irregularidade de atletas em trâmite no tribunal, sejam elas materializadas na Lei, Decreto ou CBJD.

Simples assim."__


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