Folha de S. Paulo


'Consegui reverter o diabetes 2 com uma dieta líquida de 800 calorias'

James Gallagher
Isobel Murray não se vê mais como diabética
Isobel Murray não se vê mais como diabética

Quase metade dos pacientes em um experimento descrito por médicos britânicos como "um divisor de águas" conseguiram reverter o diabetes tipo 2.

Esses pacientes passaram cinco meses à base de uma dieta de baixa caloria, composta de sopas e shakes, para perder peso significativamente.

Isobel Murray, de 65 anos, pesava 95 kg –e perdeu 25 kg. Agora, não precisa mais de medicação para diabetes. "Recuperei minha vida", diz.

Segundo o instituto britânico Diabetes UK, que financiou a pesquisa, o experimento é um marco e tem potencial para ajudar milhões de pacientes.

QUATRO REFEIÇÕES LÍQUIDAS POR DIA

A britânica Isobel foi uma das 298 pessoas que passaram pelo experimento.

Os níveis de açúcar em seu sangue eram muito altos –toda vez que ela ia ao médico, sua medicação era aumentada.

Ela então adotou uma dieta líquida por 17 semanas, abrindo mão de cozinhar e fazer compras. Até comia separado de seu marido, Jim.

Isobel tinha quatro refeições por dia. E eram nada parecidas com os pratos de programas como o Masterchef –um sachê com um pó era misturado na água para fazer a sopa ou shake. Cada um deles contém cerca de 200 calorias, mas também o balanço certo de nutrientes.

Consumindo quatro sachês, a britânica tinha uma dieta de cerca de 800 calorias por dia –uma pessoa adulta saudável precisa ingerir, em média, 2 mil calorias diárias. Os cientistas ainda estão estudando quais são os efeitos desse tratamento no longo prazo.

Ela disse à BBC que seguir a dieta foi relativamente fácil, "já que você não precisa pensar no que vai comer".

Assim que a paciente perdeu o peso necessário, nutricionistas entraram em cena para ajudá-la a introduzir refeições sólidas e saudáveis no cardápio.

"Comer comida normal é a parte mais difícil", diz Isobel.

Getty Images
Diabetes afeta 1 em cada 11 pessoas no mundo --a maioria tem o tipo 2
Diabetes afeta 1 em cada 11 pessoas no mundo –a maioria tem o tipo 2

'DIVISOR DE ÁGUAS'

Os resultados do experimento, simultaneamente publicados no periódico científico "The Lancet" e apresentados na Federação Internacional de Diabetes, mostraram que:

  • 46% dos pacientes que começaram o experimento entraram em remissão um ano depois;
  • 86% dos que perderam 15 kg ou mais entraram em remissão;
  • Apenas 4% entraram em remissão com o melhor tratamento usado atualmente.

Roy Taylor, professor da Universidade de Newcastle, disse à BBC que o estudo "é um divisor de águas".

"Antes de iniciarmos essa linha de pesquisa, médicos e especialistas viam o tipo 2 como irreversível. Mas se enfrentarmos o problema de frente e tirarmos as pessoas do nível de perigo, elas podem conseguir a remissão do diabetes."

"É muito empolgante", complementou o professor Mike Lean, da Universidade de Glasgow. "Agora temos evidências claras de que a perda de 10 kg a 15 kg é o bastante para reverter a doença."

É importante ressaltar que os médicos não estão falando em cura. Se o peso voltar, com ele virá também o diabetes.

Isobel diz que isso não ocorrerá com ela, que por enquanto manteve o peso perdido há dois anos.

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Experimento consistiu em uma dieta líquida --ou seja, sopas e shakes
Experimento consistiu em uma dieta líquida –ou seja, sopas e shakes

POR QUE A PERDA DE PESO FUNCIONA?

A acumulação de gordura corporal no pâncreas provoca o estresse das células beta no órgão, que controla os níveis de açúcar no sangue.

Elas param de produzir o hormônio insulina o suficiente, e isso provoca o aumento descontrolado dos níveis de açúcar.

Fazer dieta diminui a gordura, fazendo o pâncreas trabalhar direito de novo.

O experimento só usou pacientes diagnosticados nos últimos seis anos. Acredita-se que ter diabetes 2 por um período longo de tempo pode causar um dano irreversível.

Um em cada 11 adultos no mundo tem diabetes, e a maioria deles tem o tipo 2. Níveis descontrolados de açúcar podem prejudicar o corpo, levando à falência de órgãos, cegueira e amputações.

"[O tratamento tem] o potencial de transformar as vidas de milhões de pessoas", diz Elizabeth Robertson, diretora de pesquisa da Diabetes UK.

"O experimento está em andamento, para que possamos entender os efeitos a longo prazo de uma abordagem dessas."

"Eu não me vejo mais como diabética", diz Isobel. "Você precisa estar disposta e preparada, mas qualquer um pode fazer isso caso se sinta forte o suficiente."


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