Folha de S. Paulo


Gestantes devem testar zika mais de uma vez, diz estudo

Lalo de Almeida/Folhapress
Raquel de Araujo, 28, e as filhas gêmeas Heloá (dir.) e Heloísa (esq.), ambas com microcefalia
Raquel de Araujo, 28, e as filhas gêmeas Heloá (dir.) e Heloísa (esq.), ambas com microcefalia

Apenas um resultado negativo pode não ser suficiente para descartar a presença do vírus da zika em gestantes. É o que mostra um novo estudo feito pela Famerp, faculdade estadual de medicina de São José do Rio Preto, no interior paulista.

A pesquisa, publicada na revista "Emerging Infectious Diseases", analisou amostras de urina de 15 grávidas infectadas pelo vírus durante a gestação. Segundo o virologista e coordenador da pesquisa, Maurício Lacerda Nogueira, a urina das mulheres foi testada do primeiro ao último trimestre de gestação.

Houve períodos em que a carga viral sumia, em algumas das grávidas, e depois voltava a aparecer. Em apenas uma das voluntárias o vírus foi detectado durante sete meses. Em cinco delas o teste deu negativo e posteriormente positivo. Em todas elas o vírus sumiu logo após o parto.

"Esses dados mostram que durante a gestação o vírus continua se replicando na placenta ou no bebê, que servem como um reservatório para ele", diz Nogueira. "Como a carga viral fica muito baixa na mãe ela acaba não sendo detectada no exame".

O estudo sugere que mesmo que o teste dê negativo para a zika, ele deve ser refeito ao menos mais duas vezes em intervalos de uma semana.
"Ainda não sabemos dizer quantos testes são necessários para descartar com toda certeza a presença do vírus, mas já sabemos que apenas um não é suficiente."

Nenhuma das gestantes do estudo deu à luz bebês com microcefalia, porém três deles apresentaram complicações provavelmente causadas pelo vírus. Duas crianças tiveram alterações nos testes de audição e uma nasceu com um cisto no cérebro.

A pesquisa foi feita em 2016 com gestantes atendidas pelo Hospital da Criança e Maternidade do município.

TESTE RÁPIDO

Um novo teste capaz de detectar de forma rápida e barata o vírus da zika no organismo do paciente infectado foi desenvolvido por cientistas do MIT, nos EUA, com a participação de faculdades brasileiras.

Esse é o primeiro método que consegue identificar na hora a presença do vírus da zika e ainda diferenciá-lo do vírus da dengue.

A Fiocruz, o Instituto Evandro Chagas, a Famerp e as universidades federais de Minas Gerais e Sergipe ajudaram a criar o teste.

A grande dificuldade era fazer com que o procedimento não confundisse o vírus da zika com um dos quatro tipos do da dengue.

O método chamado imunocromático usa uma fita com anticorpos que mudam de cor quando entram em contato com a proteína viral conhecida como NS1, presente apenas no vírus da zika.

Nessa fita existe uma membrana que é revestida por um anticorpo e uma nanopartícula de ouro ligada a outro anticorpo distinto.

Na presença da proteína do vírus da zika, manchas vermelhas aparecem, detectando a sua presença.

Durante o estudo foram avaliadas 300 combinações para a zika e 726 para o vírus da dengue. O custo médio de cada fita é de cinco dólares.

Falta agora interesse da indústria em produzir o teste barato, diz Maurício Lacerda Nogueira, que participou da pesquisa. Em dois anos, no máximo, ele acredita que ele estará disponível.

Até que esse novo teste chegue ao sistema de saúde o método mais utilizado continua sendo o teste molecular pelo exame de RT-PCR.

Nele, busca-se detectar a presença de DNA do vírus numa amostra de sangue ou de urina. Como esse DNA fica presente na corrente sanguínea do paciente pouco depois da infecção, o teste tem de ser feito até o quinto dia após os primeiros sintomas.

Por se tratar de um exame laboratorial, ele demora em média uma semana para ficar pronto e seu custo gira em torno de R$ 400. Ele é oferecido na rede pública ou particular de saúde.

Outro teste bastante usual no Brasil e recomendado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) é o teste sorológico IgM e IgC.

Também feito em laboratório ele utiliza o mesmo método de coleta de sangue usado no exame de RT-PCR.

A diferença é que no IgM identifica anticorpos do vírus na corrente sanguínea na fase aguda da doença e pode ser feito após os sintomas desaparecerem ou em casos em que não há sintomas.

Ele é recomendado para gestantes nas primeiras semanas de gestação e para bebês cujo as mães tiveram a doença. Já o IgC verifica se a pessoa teve contato com o vírus em algum momento da vida.

Esse teste também demora em torno de uma semana para ter o seu resultado e é oferecido gratuitamente pelo SUS e na rede particular.

EPIDEMIOLOGIA

Até o último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, o total de pessoas que provavelmente tiveram zika em 2017 supera a marca dos 15 mil casos (até no início de setembro).

Pode parecer bastante, mas perto do total de prováveis casos do ano de 2016 -216.207- houve redução expressiva.

Há de se considerar também que apenas uma pequena parte dos casos, 20%, são sintomáticos -geralmente apresentando quadros benignos. Forma-se, então, um cenário que estimula pouco a tomada de iniciativas antizika.

Nada garante, porém, que não haverá mais surtos da doença. Especialistas dizem que pode existir uma espécie de periodicidade, com alternância entre anos bons e ruins.

As mais beneficiadas por um teste diagnóstico efetivo da doença são as grávidas, que podem iniciar desde o período pré-natal os cuidados no caso da transmissão para os filhos. A grande torcida é que não demore para que vacinas contra a zika sejam lançadas para mulheres em idade fértil. Algumas estão em testes.

Há cerca de 6.000 casos entre confirmados e em investigação de bebês que nasceram no país com complicações neurológicas, comportamentais, ortopédicas, entre outras, decorrentes da doença.

Os sinais de que houve infecção podem surgir apenas meses depois do nascimento -mais um fator que deve deixar o sinal amarelo aceso no país ainda por um bom tempo.

Colaborou GABRIEL ALVES


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