Folha de S. Paulo


Anvisa diz que barrará importação comercial de inibidores de apetite

Rafael Hupsel/Folhapress
Lei recentemente sancionada fala em produção, comercialização e consumo
Lei recentemente sancionada fala em produção, comercialização e consumo

Apesar da recente aprovação de uma lei que libera o uso de inibidores de apetite, a importação desses produtos para a venda no Brasil continuará vetada.
A afirmação foi dada à Folha pelo diretor-presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Jarbas Barbosa.

Segundo ele, como a lei fala apenas em autorizar "produção, comercialização e consumo", sem citar a importação, a agência passará a vetar tentativas de empresas em trazer os anorexígenos anfepramona, femproporex e mazindol do exterior.

A ação tem base nas atuais regras brasileiras, que impedem a importação de produtos sem registro na Anvisa para serem vendidos no país.

Para uso próprio, por pessoas físicas, porém, a importação é permitida, desde que em quantidade e frequência compatíveis para uso –com receita médica, por exemplo.

"Como a lei não incluiu a importação, e medicamento sem registro só pode ser importado para uso individual, essa seria uma medida que teríamos de proteção [à saúde da população]", diz Barbosa.

Segundo ele, essa foi a única opção encontrada pela agência para realizar o controle dos medicamentos recém-liberados –ainda assim, somente em parte.

"É a única brecha que vimos, mas é só uma parte. Não elimina os riscos da lei. Em relação à produção no Brasil e comercialização, avaliamos que abre a porteira para o mercado paralelo e ilegal", diz. "Esperamos que o Supremo barre isso porque abre um precedente grave."

Derivados das anfetaminas, os anorexígenos anfepramona, femproporex e mazindol foram comercializados por décadas no país, até serem proibidos pela Anvisa em 2011. Na ocasião, a agência alegou que essas substâncias não possuíam comprovação de eficácia e traziam mais riscos que benefícios.

A proibição deu início a uma disputa com entidades médicas e representantes de associações de pacientes, que recorreram ao Congresso em busca do retorno dos medicamentos.

"Não é só porque é de baixo custo. Era uma opção terapêutica para os pacientes. Se não fossem eficazes, ninguém iria tomar", afirma a endocrinologista Maria Edna de Melo, da Abeso (Associação Brasileira para Estudo da Obesidade), uma das entidades que se posicionou de forma favorável à liberação.

Para Melo, a previsão de veto à importação não se justifica. "Uma importação não deixa de ser atividade comercial", afirma ela, que lembra que o texto dá aval à comercialização dos inibidores.

NA JUSTIÇA

Em meio ao impasse, o cenário para os pacientes que buscam o retorno dos emagrecedores ainda é incerto.

Inicialmente, representantes da indústria declararam considerar pouco provável que houvesse interesse do setor em fabricar os medicamentos, já que ainda são necessários estudos para comprovar segurança e eficácia, considerados de alto custo.

A previsão, assim, era que o impacto da lei fosse maior em farmácias de manipulação –antes da proibição, elas respondiam por 60% das prescrições dessas drogas.

Sem o aval para importar as drogas, porém, farmácias podem ter dificuldade em obter as substâncias, também proibidas em outros países.

A Folha procurou a Anfarmag (Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais) para comentar o tema, mas não recebeu resposta.

O impasse também deve chegar em breve à Justiça.

Nesta quinta-feira, o CNS (Conselho Nacional de Saúde) aprovou uma recomendação para que as entidades que o compõem –associações de profissionais de saúde, pacientes e movimentos populares, além de gestores de saúde– entrem com ações no STF (Supremo Tribunal Federal) questionando a liberação.

Na ocasião, a CNTS (Confederação Nacional de Trabalhadores de Saúde) e outras entidades informaram que já estudam a possibilidade.

Em 2016, o STF suspendeu os efeitos da lei aprovada pela ex-presidente Dilma Rousseff que liberava a fosfoetanolamina, a "pílula do câncer".

COMO AGEM OS INIBIDORES DE APETITE

O QUE SÃO OS DERIVADOS DE ANFETAMINA
São substâncias que agem sobre o cérebro, aumentando o ritmo do coração e a pressão do sangue e diminuindo o apetite

RISCOS

Anvisa diz que os remédios causam redução modesta de peso corporal, que não é mantida com a interrupção do tratamento. A ausência de evidências de eficácia e os severos efeitos adversos no cérebro e sistema cardiovascular tornam insustentável a manutenção desses medicamentos no mercado

CRONOLOGIA

DÉCADAS DE 1950 A 1970
A anfepramona, o femproporex e o mazindol começam a ser usados para tratar obesidade

1997
A sibutramina é aprovada nos EUA, pela FDA

NOV.2009
Dados de estudo, com 10 mil pacientes, mostram que a droga aumenta o risco cardiovascular

JAN.2010
A agência europeia recomenda a suspensão da droga

MAR.2010
A Anvisa passa a exigir que a droga seja vendida só com receita de controle especial

OUT.2011
A Anvisa proíbe os emagrecedores, mas mantém a sibutramina de forma temporária, com regras mais rígidas

MAI.2013
Depois de avaliar a venda e o controle da sibutramina, Anvisa mantém o medicamento no mercado

2014
Câmara aprova projeto de lei que libera venda de emagrecedores; depois comissão do Senado fez o mesmo

ABR.2016
Aprovada em plenário do Senado e devolvido à Câmara. Os senadores adicionaram que os medicamentos devem ser controlados (tarja preta)

20.JUN.2017
Aprovada pela Câmara e remetida à ao presidente para sanção ou veto

23.JUN.2017
O presidente em exercício Rodrigo Maia (DEM-RJ) sancionou a lei que libera os inibidores de apetite vetados pela Anvisa


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