Folha de S. Paulo


Anvisa suspende propaganda de suplemento com fosfoetanolamina

Reprodução/Facebook
Imagem postada em rede social de uma das empresas responsáveis pelo suplemento
Divulgação em rede social de uma das empresas responsáveis pelo suplemento

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) suspendeu nesta terça-feira (21) propagandas de dois suplementos feitos à base de fosfoetanolamina, conhecida como "pílula do câncer", por alegarem propriedades terapêuticas e funcionais não comprovadas –o que é proibido no Brasil.

A medida atinge os produtos "Phospho 2-AEP imune system", da marca New Life, e "Phospho Ethanolamine", da marca Quality Medical Line, que é produzida pelo laboratório Federico Diaz.

Ambos os produtos vinham sendo anunciados como suplementos alimentares por meio de propagandas nas páginas das duas marcas no Facebook.

A Anvisa, porém, afirma que é proibida a divulgação de propriedades terapêuticas para estes produtos -o que dava a entender parte dos anúncios. "Ou seja, seu fabricante não pode alegar que cura uma determinada doença no seu rótulo, na sua caixa ou na sua propaganda", explica a agência, em nota.

Ainda de acordo com a Anvisa, "propagandas nas redes sociais que induzam o consumidor a crer que a fosfoetanolamina, como suplemento, combata o câncer –ou qualquer outra doença– e atribuam propriedades funcionais e/ou de saúde são irregulares".

Nova pílula do câncer

SUPLEMENTO

A decisão, publicada no Diário Oficial da União, abre um novo capítulo no debate em relação ao uso e oferta no Brasil da fosfoetanolamina, substância ainda em fase de testes. No ano passado, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu a distribuição da droga no país.

Desde o início deste mês, no entanto, o produto "Phospho Ethanolamine"vem sendo anunciado no Brasil como suplemento alimentar por dois cientistas que pesquisavam a substância na USP e que, nos últimos meses, se separaram desse grupo inicial de investigação.

A ideia, assim, era lançá-lo não mais como um possível remédio, mas como suplemento alimentar –uma forma de acelerar o acesso à substância no país.

Segundo os pesquisadores,o produto será fabricado nos Estados Unidos sob a supervisão do laboratório Federico Diaz e poderá ser importado a partir de março, de forma individual.

Em geral, a importação de suplementos e remédios para uso individual não precisa da aprovação da Anvisa, desde que a quantidade não seja característica para venda. Se o suplemento for importado para ser vendido no Brasil, no entanto, é preciso o registro do produto, o que requer testes que comprovem suas propriedades.

Já no caso das propagandas, a regra prevê que "qualquer informação ou propriedade funcional ou de saúde de um alimento veiculada, por qualquer meio de comunicação, não poderá ser diferente em seu significado daquela aprovada para constar em sua rotulagem". Segundo a Anvisa, as regras dos Estados Unidos também proíbem que suplementos alimentares tragam alegações terapêuticas.

Inicialmente, nem a embalagem nem os cientistas responsáveis pelo suplemento citam diretamente benefícios para pacientes com câncer. A página do suplemento no Facebook, no entanto, chegou o anunciar o produto ao lado da foto de uma mulher careca com a frase "Não desista!".

Questionada, a Anvisa não informou, porém, quantas e quais propagandas foram suspensas. Nesta terça, após a suspensão, a maior parte das imagens já haviam sido retiradas. Na última semana, um dos cientistas, Marcos Almeida, afirmou à Folha não tinha visto a foto da mulher careca e que a achava de mau gosto. "Foi um erro de marketing", afirmou.

A Folha procurou representantes da marca Quality Medical Line comentar a suspensão das propagandas, mas não obteve resposta até o momento.

Já a advogada Danielle Bordinhon, que defende no Brasil a New Life Health Company, afirma que a empresa está adequando as divulgações dos produtos em seus sites e redes sociais e irá cumprir todas as determinações das regras brasileiras. Ela afirma ainda que a composição do produto vendido pela empresa é diferente da fosfoetanolamina atualmente em fase de testes no Brasil, tendo uma quantidade menor da substância, informa.

Segundo a Anvisa, a decisão ocorre como medida "acauteladora", o que indica que não há aplicação de possíveis penalidades imediatas. Os responsáveis terão o prazo de 60 dias para dar explicações e recorrer da suspensão.

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Os Poréns da nova 'pílula do câncer'

Alegação Terapêutica

  • A Anvisa afirma que suplementos só podem alegar propriedade funcional ou terapêutica após a comprovação de testes, os quais não foram feitos em humanos
  • Apesar de a própria embalagem não indicar o uso para ajudar no tratamento de câncer ou curar a doença, posts em redes sociais de um dos laboratórios responsáveis pelo suplemento mostram o produto ao lado de uma mulher careca, com a frase "Não desista!"

Rota Alternativa

  • Os pesquisadores responsáveis afirmam que o lançamento da fosfo como suplemento possibilita a liberação e acesso mais rápido (em comparação à aprovação de um medicamento) ao composto
  • Especialistas afirmam que há risco de as pessoas com câncer abandonarem o tratamento por outro que passou pelos mesmos processos de avaliação e regulamentação

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Trajetória da Fosfo

Década de 1990
A substância é sintetizada pelo pesquisador Gilberto Chierice e começa a ser distribuída para pacientes

10.jun.2014
Após a aposentadoria de Chierice, o Instituto de Química de São Carlos da USP publica portaria que impede a produção e distribuição de qualquer droga sem registro (caso da fosfo)

out.2015
O Tribunal de Justiça de São Paulo barra liminares que pediam acesso à droga, mas volta atrás depois que o STF determina a entrega a paciente com câncer no RJ

13.out.2015
USP diz não ter condições de produzir a substância em larga escala, mas que tentará cumprir os mandados judiciais

8.mar.2016
Câmara dos Deputados aprova projeto de lei que autoriza comercialização e uso da droga; o projeto seguiu para o Senado

22.mar.2016
Projeto de lei é também aprovado pelo Senado Federal

14.abr.2016
Dilma sanciona a lei, contrariando recomendação da Anvisa

19.mai.2016
STF vota liminar para derrubar a lei que permitia a fosfo


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