Folha de S. Paulo


Estudos não comprovam eficácia das ventosas de Phelps

Os ouros e os recordes de Michael Phelps não são mais novidade em Jogos Olímpicos, mas as manchas roxas que ele exibe no corpo, sim.

A técnica que produz as chamativas marcas, porém, está longe de ser nova. O nadador americano é adepto da ventosaterapia, terapia da medicina chinesa indicada para alívio de dor e estresse.

Segundo o jornal "New York Times", Phelps já tinha usado a técnica em outras provas. No domingo, pediu o tratamento porque estava dolorido. "Meu preparador pegou pesado e deixou um par de manchas", disse.

Os médicos que a aplicam garantem que funciona, mas estudos ainda não foram conclusivos quanto à sua eficácia.

Um estudo alemão de 2012 testou a eficácia do procedimento em 61 pacientes com dores crônicas no pescoço.

Não foram encontradas evidências significativas de eficácia, mas os que foram tratados com ventosas apresentavam maiores níveis de bem-estar e sentiam menos dor quando pressão era aplicada na área afetada.

Cientistas da Universidade de Beijing e da Universidade do Oeste de Sydney, em uma revisão baseada em 135 estudos sobre o tema, encontraram resultados positivos na ventosaterapia como terapia complementar. Contudo, a maior parte das pesquisas não havia sido bem estruturada e apresentava alto risco de ser tendenciosa.

O que acontece, segundo Alexandra Raffaini, médica intervencionista da dor do Hospital das Clínicas da USP, é que as ventosas sugam a pele e o sangue sai dos vasos. Isso aumenta a circulação local e o ácido lático –substância associada a dores musculares–, é retirado.

Há explicação para o alívio, mas não provas. "Não tem nenhum embasamento científico", diz a médica.

O efeito placebo pode causar a sensação de bem-estar. Raffaini afirma que o efeito está presente em toda prática médica e que, de toda forma, a eficácia das ventosas é vista na prática clínica.

A falta de evidências não prejudica melhoras na autoconfiança dos atletas. "Se ajuda o psicológico, você vai potencializar o desempenho", afirma Gilberto Coelho, especialista, pelo NAR (Núcleo de Alto Rendimento de São Paulo), em metodologia do treinamento.

O fato é que as manchas de Phelps tornaram a prática mais popular. Valéria Kim, coordenadora de pós-graduação da Escola de Terapias Orientais de São Paulo, afirma que a procura aumentou.

No local, em sessões de 1h30, por R$ 35, os pacientes são analisados e, em seguida, podem realizar acupuntura e aplicação de ventosas.

Sessões específicas da ventosaterapia em diferentes clínicas variam entre R$ 60 e R$ 250, segundo especialistas.

Na técnica tradicional, copos de vidro são aquecidos por algodão em chamas. O ar é consumido pelo fogo e forma-se um vácuo no recipiente, o que cria a sucção. Também podem ser usadas pistolas para retirar o ar do interior de copos de acrílico.

Há ainda uma controversa técnica, por questões de biossegurança, que pode ou não envolver ventosas: a sangria. Nela um pequeno corte é feito para que o sangue saia do corpo.

Fora os problemas e polêmicas na realização, a prática da ventosaterapia também não é indicada para diabéticos, pessoas com problemas de cicatrização e pacientes com dores relacionadas a lesões de nervo. Além disso, as ventosas não podem ser colocadas sobre feridas abertas.

Mesmo com a promessa de deixar, no máximo, um "chupão", a utilização da técnica requer alguns cuidados.

"Tive uma paciente que teve parte da pele arrancada.", diz Raffaini.

O risco de queimaduras com a ventosa de fogo, de formação de bolhas e necroses também não é descartado.

Especialistas da área jogam acidentes do tipo na conta de médicos com pouca habilidade. "É como dar um carro para alguém. É um perigo se a pessoa não sabe dirigir", diz Hong Pai, coordenador do centro de acupuntura do Hospital das Clínicas da USP.

Chamada - Rio 2016


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