Folha de S. Paulo


Médicos defendem ampliar indicações de cirurgia de redução de estômago

Um movimento de seis entidades médicas defende que a obesidade deixe de ser o principal critério para a indicação da cirurgia bariátrica a pacientes diabéticos.

A proposta pretende incluir como candidatos à operação pacientes de menor peso que estejam com o diabetes descompensado (mesmo com o uso de remédios) e que tenham outros fatores de risco, como hipertensão e altos níveis de gordura no sangue.

Foi criado um conjunto de indicadores (chamado de escore de risco) que valem pontos e que, somados, definirão o perfil do paciente a se submeter à cirurgia metabólica (um tipo de bariátrica).

O procedimento mais indicado hoje para esses casos (chamado bypass) modifica o caminho do alimento pelo tubo digestivo. Ao evitar a passagem da comida pela parte inicial do intestino, há diminuição da resistência dos tecidos à ação da insulina.

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress

O coordenador da proposta, Ricardo Cohen, cirurgião do Hospital Oswaldo Cruz, diz que hoje, com o uso isolado do IMC (índice de massa corpórea) acima de 40 como principal critério para a cirurgia, os diabéticos ficam excluídos porque, em geral, não são os mais gordos.

"Atualmente não são considerados os riscos cardiovasculares ou a quantidade e distribuição de gordura pelo corpo, que agrava a síndrome metabólica. Com o escore de risco, é possível ampliar a indicação da cirurgia e permitir que mais paciente tenham o controle do diabetes."

Segundo Cohen, há 11 milhões de diabéticos no Brasil e 60% deles não têm a doença controlada. Essa situação pode provocar, além dos problemas cardiovasculares, doença renal, amputação de membros e cegueira.

Para ele, do total de pacientes com diabetes sem controle, pelo menos a metade (cerca de 3,3 milhões) poderia, em tese, ter indicação para a cirurgia. Hoje são feitas 90 mil operações, mas não se sabe quantas têm foco no tratamento de diabéticos.

Entre as sociedades que defendem a mudança estão a de cirurgia bariátrica e metabólica, a de endocrinologia, a de diabetes e Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Para valer, a proposta precisa ser aprovada pelo CFM (Conselho Federal de Medicina).

POLÊMICA

A proposta de ampliar a indicação da cirurgia metabólica é polêmica, especialmente entre os clínicos.

Para o endocrinologista Bruno Geloneze, coordenador do Laboratório de Investigação em Metabolismo e Diabetes da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), não há necessidade dessa mudança.

"Temos um contingente enorme de pessoas obesas, com IMC acima de 40, com necessidade urgente da cirurgia bariátrica e que não estão nem de longe sendo operadas. Essas deveriam ter prioridade." A fila de espera no SUS para esse tipo de procedimento chega a 12 anos.

Além disso, ele diz que ainda há dúvidas se a cirurgia vai conseguir livrar o diabético da doença. Estudo coordenado por ele na Unicamp mostra que são temporários os efeitos da cirurgia metabólica em pacientes não obesos com diabetes tipo 2 (que responde por 90% dos casos).

No primeiro ano após a intervenção, os pacientes reduziram os níveis de glicemia e, na maioria dos casos, eliminaram a necessidade ou diminuíram o uso de insulina.

Após cinco anos, porém, só um continuava vivendo sem a necessidade de insulina.

Para Geloneze, por não resultar na cura do diabetes, a indicação da cirurgia não se justifica, porque há riscos (anestésicos e de desnutrição no longo prazo).

"Não sou contra a cirurgia, mas ela deve ser feita em quem vai se beneficiar."

Já Cohen diz que outros estudos demonstraram que, quando bem selecionados os pacientes, os resultados da cirurgia são muito melhores dos que os da Unicamp.

Na sua opinião, pacientes convivendo há mais de dez anos com o diabetes podem não ser bons candidatos à cirurgia. "Ela é só mais uma ferramenta. Não queremos acabar com tratamento clínico."


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