Folha de S. Paulo


Cultura e língua materna influenciam olfato e outros sentidos humanos

Alguém está fazendo café. Você sente o aroma? E o perfume de madressilvas? E a colônia de seu parceiro? Você consegue identificar todos esses odores? Se a resposta for negativa, talvez seja recomendável procurar logo seu médico.

O "NYT" noticiou recentemente um novo estudo que indica que a perda do olfato pode indicar graves problemas de saúde.

Pesquisadores testaram 3.005 pessoas com idades a partir de 57 anos e descobriram que aquelas que não conseguiam identificar certos odores, como os de peixe e de hortelã, tinham três vezes mais probabilidade de morrer no prazo de cinco anos do que as demais participantes. E, quanto mais baixas as notas, maior era a chance de morte. Entre os fatores estudados, a perda do olfato era o indicador mais preciso de morte, depois de lesões no fígado.

Mas não entre em pânico. Se você só sentir odores vagamente, isso não significa necessariamente morte certa em breve. Inclusive pode indicar apenas que você é americano.

Joshua Bright/The New York Times
Americanos distinguem menos odores do que outras culturas
Americanos distinguem menos odores do que outras culturas

Escrevendo no "NYT", T. M. Luhrmann, da Universidade Stanford, discutiu a opinião crescente entre antropólogos de que as percepções sensoriais são tão culturais quanto biológicas. Segundo ela, pesquisadores da Holanda estudaram mais de 20 grupos diversos no mundo inteiro para analisar como a cultura e o idioma podem afetar os cinco sentidos básicos. A parte dos testes relativa ao olfato pode ter ajudado a esclarecer conceitos equivocados de pesquisas anteriores.

"Uma revisão de experimentos feitos nos últimos 30 anos concluiu que na literatura científica há uma noção muito difundida de que os humanos são incapazes de identificar e descrever odores", escreveu Luhrmann.

"E essa revisão também descobriu que os sujeitos testados nesses experimentos ao longo de três décadas geralmente eram falantes de inglês."

O fato é que falantes de inglês "acham fácil identificar a mesma cor ('branco') no leite e nas flores de jasmim, mas não odores em comum, por exemplo, de excrementos de morcego e da folha da raiz de gengibre".

Esse segmento pode ter dificuldades até com odores familiares. Quando a equipe de pesquisa da Holanda "apresentou odores supostamente familiares para os americanos - canela, terebintina, limão, rosa e outros -, eles titubearam demais em nomeá-los", relatou Luhrmann.

Todavia, os jahai, que vivem na floresta tropical na península Malaia, foram mais acurados na identificação de odores e mais sucintos para descrevê-los, disse ela. "Eles eram igualmente capazes de dar nome ao que cheiravam e ao que viam. E têm até um termo abstrato para o odor semelhante de excrementos de morcego e da folha da raiz de gengibre."

Caso procurassem termos abstratos para odores, os americanos talvez pudessem tentar algo assim: canela e rosa = libertário; terebintina e limão = socialista. Estejam ou não cientes disso, aparentemente seus narizes já fazem tais associações.

Arthur C. Brooks escreveu sobre um estudo feito nos EUA no qual se solicitava a voluntários que cheirassem compressas previamente usadas por diversas pessoas e avaliassem a atratividade do odor. Os voluntários se sentiram atraídos pelo odores de pessoas com quem compartilhavam ideologias.

"A afinidade ideológica tem um efeito biológico que gera atração", disse Brooks, "e discórdias profundas podem emanar um odor repugnante."


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