Folha de S. Paulo


Alimentação influencia relógio biológico, diz estudo japonês

Além de prover nutrientes, água e energia para os seres vivos, a alimentação também atua na regulação do ritmo biológico dos organismos, concluiu um estudo realizado no Japão, a ser publicado na edição deste mês da revista científica norte-americana "Cell".

A pesquisa sugere estratégias alimentares para tratar distúrbios do sono e da vigília e para ajudar a prevenir e atenuar o chamado "jet lag", caracterizado por fadigas de viagens e outras disfunções provocadas por mudanças de fusos horários, de acordo com o neurologista Ademir Baptista da Silva, professor da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Os chamados ciclo circadianos (do latim "circa diem", cerca de um dia) têm duração de aproximadamente 24 horas em grande parte dos seres vivos e são regulados pelo sistema nervoso central. Mas também são influenciados pela variação natural ou artificial entre iluminação e escuridão e por outros fatores ambientais.

A novidade que coloca a alimentação entre os fatores que podem influenciar o relógio biológico central dos organismos está relacionada à insulina. Essa substância é o hormônio secretado pelo pâncreas para controlar no sangue o nível de glicose, que aumenta principalmente com a ingestão de alimentos ricos em carboidratos.

Baseado em experimentos com 16 ratos durante cinco dias, o estudo coordenado por Miho Sato, professora da Universidade de Yamaguchi, constatou que a insulina envia sinais bioquímicos para genes e neurônios envolvidos na regulação do ritmo circadiano.

Esse estudo é o primeiro a estabelecer a relação entre o "relógio biológico" central do organismo e os ciclos periféricos, ou seja, os ritmos de funcionamento do fígado e de outros órgãos, afirmou o neurologista da Unifesp.

Em mamíferos, inclusive em humanos, o ciclo circadiano é controlado por um conjunto de neurônios chamado de núcleo supraquiasmático. Ele é situado na parte central do cérebro, no hipotálamo, uma região que tem o tamanho aproximado de uma amêndoa e regula a secreção hormonal, a temperatura do corpo e outras funções do organismo.

RISCOS

A dessincronização do ciclo circadiano pode ser provocada por períodos irregulares de sono, como no caso de pessoas que trabalham em turnos e por alterações de outros ritmos ambientais, como nas viagens entre regiões de diferentes fusos horários, segundo Ademir Baptista da Silva.

Em seu artigo, Sato e os demais autores da pesquisa destacam que, além de provocar os distúrbios do sono, a falta crônica dessa falta de sincronização traz maiores riscos de diabetes, problemas cardiovasculares, diversos tipos de câncer e outras doenças.

Uma alimentação balanceada durante o dia, com os componentes essenciais da dieta, que são carboidratos, proteínas e gorduras, é essencial para os relógios biológicos periférico e central funcionarem equilibradamente, segundo a endocrinologista Carolina Janovsky, doutoranda da Unifesp. Por outro lado, além de provocar distúrbios alimentares e outros problemas para a saúde, a ingestão desbalanceada de nutrientes durante o dia prejudica a sincronia entre os ritmos circadianos.

"Se, por exemplo, a pessoa fica o dia inteiro sem se alimentar e come muito no período da noite, o organismo, que deveria estar se preparando para dormir, acaba tendo uma interrupção do relógio circadiano", disse a endocrinologista. "Isso prejudica a sincronia entre relógio central e o periférico, entre o ambiente e a fisiologia", acrescentou.

Uma estratégia adequada para adaptação a fusos horários atrasados é começar a acordar e a dormir mais cedo alguns dias antes de viajar, evitar carboidratos no jantar e concentrá-los nas primeiras refeições, afirmou o nutricionista Murilo Dattilo, especialista em nutrição aplicada ao esporte e também doutorando da Unifesp.

No caso de viagens a regiões de fusos horários atrasados, deve-se acordar e dormir mais tarde e seguir a mesma orientação alimentar, disse o nutricionista. Ele e a endocrinologista Carolina Janovsky ressaltaram que os próprios autores do estudo alertam que a prevenção pode não funcionar em portadores de diabetes do tipo 2 e ter efeitos colaterais naqueles que são dependentes de insulina.


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