Folha de S. Paulo


Mamografia anual não reduz mortalidade por câncer, diz estudo

Um novo estudo acrescentou mais um capítulo à polêmica sobre a eficácia da mamografia para evitar mortes por câncer de mama.

Pesquisa canadense com cerca de 90 mil mulheres entre 40 e 59 anos concluiu que a mamografia anual não reduz a mortalidade por câncer de mama em comparação com o exame clínico das mamas feito pelo médico.

As participantes do estudo foram divididas em dois grupos. Num deles, as voluntárias fizeram a mamografia anualmente, durante cinco anos. No outro, fizeram apenas exame clínico das mamas. Nesse período, dentre as que realizaram a mamografia, 3.250 foram diagnosticadas com câncer de mama. No outro grupo, 3.133 receberam esse diagnóstico.

As voluntárias foram então acompanhadas por 25 anos. No primeiro grupo, 500 mulheres morreram da doença. No segundo, o número de mortes foi similar: 505.

Também não foram observadas diferenças nos resultados entre as mulheres de 40 a 49 anos e as de 50 a 59 anos.

Editoria de Arte/Folhapress

Segundo Arn Migowski, médico sanitarista e epidemiologista do Inca (Instituto Nacional de Câncer), estudos recentes já apontaram que o efeito do rastreamento de câncer de mama não é tão grande como se pensava.

"É um conjunto de intervenções que reduz a mortalidade, não só a mamografia. É preciso garantir o acesso ao tratamento e oferecer terapias modernas. Tudo isso compõe o efeito do rastreamento", diz Migowski.

Segundo ele, o exame traz mais benefícios quando é realizado a cada dois anos e dos 50 aos 69 anos de idade, como recomenda o Inca, que é ligado ao Ministério da Saúde. Em muitos países europeus, o exame é feito com essa periodicidade –no Reino Unido, é a cada três anos.

Ele afirma que o Inca tem um programa nacional de mamografia pra monitorar a qualidade do exame e garantir seu benefício. Isso inclui garantir a qualidade da imagem e da interpretação e a dose correta de radiação.

"Em um intervalo menor, de apenas um ano, o ganho é pequeno e você pode aumentar o número de intervenções desnecessárias. Não é um exame inocente, mas se fala pouco sobre isso no Brasil."

O estudo canadense mostrou que 22% dos cânceres de mama diagnosticados por mamografia não se desenvolveriam nem precisariam ter recebido tratamento.

Já a SBM (Sociedade Brasileira de Mastologia) recomenda que o exame seja feito anualmente a partir dos 40 anos. Para isso, a entidade diz ter se baseado em estudo da Universidade Federal de Goiás que constatou que 25% dos casos de câncer no Brasil ocorrem entre 40 e 49 anos.

"A SBM expressa fortemente a necessidade de continuação do rastreamento mamográfico para todas as mulheres brasileiras entre 40 e 69 anos, conforme consta em lei, até que estudos mais adequados possam ser desenvolvidos em nosso país. A entidade deixa claro que o Brasil ainda não conseguiu diminuir a taxa de mortalidade por câncer de mama, assim como já ocorre no Canadá. É possível verificar uma estabilização e discreta redução nas mortes no Sul do país, onde há rastreamento mamográfico mais adequado, mas no Centro-oeste e no Norte o índice ainda é bastante alto", disse em nota.

Os autores do estudo lembram que os resultados não podem, de fato, ser generalizados para todos os países.

A SBM disse ainda que a realidade do Canadá difere do Brasil, já que o sistema de saúde pública é muito mais adequado. "Essas duas situações juntas certamente contribuíram favoravelmente para que as mulheres que foram submetidas ao exame físico e encaminhadas para o tratamento logo no início puderam ter acesso ao serviço de saúde pública com rapidez, o que não acontece no Brasil."

Para o mastologista do Hospital Sírio-Libanês José Luiz Bevilacqua, é preciso considerar que, entre as mulheres que desenvolveram câncer, tiveram chances maior de sobrevida aquelas que fizeram a mamografia.

"Se eu fosse mulher, ia preferir continuar fazendo mamografia e ter mais chance de continuar viva. Não há como saber de antemão qual câncer será letal ou não."

Segundo ele, do ponto de vista de saúde pública, é compreensível o questionamento se vale a pena o rastreamento antes dos 50 anos. "Mas, do ponto de vista individual, fica difícil não indicar [a mamografia]."

"Não é a melhor ferramenta, mas é a que temos. Vamos continuar fazendo mamografias e usar os novos dados para ver o que pode ser aprimorado", afirma José Roberto Filassi, chefe do setor de mastologia do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo).


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