Folha de S. Paulo


Mudanças na regulamentação da Lei Rouanet facilitam acesso a incentivo

Foi publicada na sexta-feira (1°) a Instrução Normativa nº 4/2017, do Ministério da Cultura, que altera os procedimentos dos projetos culturais executados pela lei 8.313/91, mais conhecida como Lei Rouanet, atualmente o principal mecanismo de incentivo à cultura no Brasil.

Esta é a quinta alteração do regramento desde a promulgação da lei e a segunda no ano de 2017 e ocorre em um contexto de denúncias, com a Operação Boca Livre da Polícia Federal e a CPI da Lei Rouanet –que apuraram irregularidades em alguns projetos– somado à pressão por parte do setor cultural, que há tempos demanda uma regulamentação mais aderente às suas especificidades.

Apesar de ter entrado em vigor na data da sua publicação, a IN 4/2017 poderá ser aplicada aos projetos que já estavam em execução, caso as novas regras sejam mais benéficas ao proponente.

Uma inovação trazida refere-se à possibilidade de apresentação de projetos por empreendedores culturais iniciantes, uma vez que não mais se exige a comprovação de atuação prévia na área cultural do projeto. Essa alteração pretende apoiar novos empreendedores, fortalecendo e ampliando seus potenciais.

Além disso, em uma tentativa de diminuir a concentração de projetos no eixo Rio-São Paulo, a IN estendeu a possibilidade de aumento dos limites de quantidades e valores de projetos por proponente, que já era ampliada em até 50% para novos projetos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e agora poderão ser ampliados também em até 25% para projetos na região Sul, em Minas Gerais e no Espirito Santo.

Outro aspecto relevante diz respeito aos ajustes no teto de remuneração dos proponentes e seus familiares, antes limitado a 20% do valor total do projeto sem incluir o percentual destinado a serviços realizados por familiares dos proponentes.

Com a nova IN, até 50% do valor total do projeto poderá remunerar serviços prestados pelos proponentes e seus familiares. Essa medida dialoga com a realidade do setor, uma vez que empresas e instituições familiares são muito comuns no mercado cultural, e é preciso reconhecer as peculiaridades dos projetos incentivados.

A princípio, as alterações pretendem desburocratizar os processos e fomentar o financiamento do setor. Com um texto mais objetivo, a norma foca a simplificação das regras, buscando trazer mais agilidade ao processo. Porém, o próprio governo reconhece a necessidade de alterações na lei em si, para ampliar a base de investidores e democratizar os financiamentos.

Vale pontuar que algumas das boas inovações trazidas pela IN foram inspiradas na lei 13.019/2014, conhecida como MROSC (Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil), que regula as parcerias entre o Estado e as OSCs.

Esta lei, embora não se aplique de forma direta aos projetos da Lei Rouanet, costuma ser utilizada por analogia pelos órgãos de controle com relação aos convênios, conforme foi constatado em pesquisa realizada pelo NEATS-PUC-SP.

Nesse sentido, é possível identificar nas alterações da IN n° 4/2017 uma tendência de aproximação com os mecanismos trazidos por esse regime, cuja regulamentação vem avançando e já traz resultados positivos em todas as esferas.

É o caso, por exemplo, da inclusão da possibilidade das chamadas ações compensatórias durante a execução dos projetos quando verificadas impropriedades, ou nas situações em que as prestações de contas forem reprovadas. Na sistemática anterior, o proponente poderia ser obrigado a restituir o valor integral do projeto, ainda que fosse verificada a execução integral do objeto.

Apesar do impacto positivo inicial trazido pela nova IN, a pressão do setor cultural sobre a necessidade de revisão de alguns dispositivos da Lei Rouanet deve continuar, para que seja efetivamente consolidada uma democratização do acesso aos incentivos fiscais, possibilitando a expansão do financiamento e incentivo a projetos culturais, em especial aos de menor porte, que, na configuração atual, permanecem desprivilegiados.

ANA LUISA FERREIRA PINTO, advogada e professora-assistente voluntária de direito constitucional na PUC-SP, e JULIANA BRANDÃO DE ANDRADE, advogada e especialista em direito público, integram o escritório Szazi Bechara Storto Rosa Figueirêdo Lopes Advogados, parceiro do Prêmio Empreendedor Social


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