Folha de S. Paulo


Mulheres são uma maioria tratada como minoria

Muitos autores e experts já disseram que empoderar uma menina pode salvar a economia de um país.

O estudo "O Papel dos Negócios Sociais no Apoio ao Empoderamento Feminino no Brasil", produzido pelo British Council Brasil em parceria com a NESsT Brasil, enfatiza que a desigualdade de gênero é real.

Dados sobre a baixíssima participação das mulheres na política, na diretoria das empresas, e por outro lado, a grande representação da mulher nos indicadores de violência e pobreza, mostram mais uma vez a dura realidade do Brasil.

Sabemos que a população brasileira é na sua maioria feminina e que as organizações sem fins lucrativos, que lutam por direitos humanos e apoiam o governo na solução de problemas sociais há muitas décadas, são compostas em sua maioria por mulheres.

Por que será, então, que apenas 20% dos negócios sociais brasileiros são liderados por mulheres? Ao constatarmos esse dado ficamos admirados e decepcionados. Existe uma expectativa de que os negócios sociais sejam a solução ou ao menos um modelo para o problema da desigualdade de gênero.

Com a participação de mulheres brilhantes –como a professora da FEA-USP Graziella Comini, a jornalista e empreendedora social do Plano de Menina, Viviane Duarte, a fundadora e presidente do Instituto Feira Preta, Adriana Barbosa, e a atual diretora do ICE (Instituto de Cidadania Empresarial), Célia Cruz– destacamos os seguintes aspectos da publicação:

  • O empoderamento feminino é um assunto de todos, homens e mulheres. O evento em São Paulo, contou com a presença de apenas quatro homens dentre cerca de 60 pessoas presentes. Nós mulheres precisamos encontrar formas de trazer mais diversidade às nossas ações, à nossa militância, aos nossos negócios. "É preciso hackear o sistema numa sociedade que foi educada a invalidar e invisibilizar as mulheres" –lembrou Viviane. Desde a criação dos nossos filhos homens, até a conversa com nossos familiares e a formação de nossas equipes, só conseguiremos avançar quando a pauta feminina não for feita somente por mulheres;
  • As mulheres são a maioria da população brasileira e, portanto, não faz sentido continuarmos sendo vistas como minoria. Tal como acontece com "a população negra no Brasil, que é uma maioria tida como minoria" –como comentou Adriana. Ela traz ainda o dado que a população negra também é predominante no Brasil. Ou seja, não somos, nem as mulheres, nem os negros, minoria nesse país;
  • Tal como o mercado tradicional de investimentos, o setor de investimento de impacto é um mercado prioritariamente masculino. E as decisões sobre os investimentos são tomadas por homens. 62% das mulheres entrevistadas percebem que o gênero atrapalha os seus negócios. Muitas são as hipóteses do porquê isso acontece, e não esgotamos a discussão, mas já conseguimos sugerir a diversificação dos Comitês de Investimento como um possível caminho para a mudança;
  • Sabemos que escala é uma das prioridades dos investidores, mas como garantir escala e ao mesmo tempo profundidade-qualidade do impacto social proposto? "A sociedade confunde inovação com geração de valor", segundo Graziella. "Temos que colocar em pauta a discussão sobre escala". Como trazer investimentos para a base da pirâmide onde não há escala?;
  • O investimento de impacto não chega na base da pirâmide onde a maioria das famílias é liderada por mulheres. Há um pedido claro, uma voz da comunidade, solicitando a diversificação dos instrumentos financeiros. Ferramentas e metodologias tradicionais não funcionam em mercados não tradicionais. Tal diversificação (como a combinação da filantropia com investimentos) pode ampliar o acesso de empreendedoras aos recursos financeiros. "Nós temos que trabalhar todas as engrenagens ao mesmo tempo", ilustrou Celia sobre os modelos financeiros existentes e o incentivo a novos;
  • Que outros papéis as mulheres podem/devem assumir no setor de negócios sociais, os quais as empoderem e refletindo na melhoria da economia? Alguns negócios sociais estão empoderando as mulheres de outra forma, não necessariamente incluindo-as em cargos de liderança. Elas podem gerar renda sustentável e valor às suas famílias por meio do trabalho em casa, participar da cadeia de valor de uma grande empresa com sua produção, receber treinamento adequado para que se desenvolvam, replicar modelos de sucesso em suas comunidades.

O estudo completo pode ser acessado neste link, que inclui recomendações para governos, gestores de políticas públicas, investidores e organizações intermediárias de apoio aos negócios sociais.

Como foi bem lembrado por Adriana, "empoderar uma menina pode salvar a economia de um país". Ou, como afirmou Nadine Gasman, representante da ONU Mulheres no Brasil em uma entrevista recente, "empoderar a mulher não é somente um discurso feminista, é uma oportunidade de gerar negócios".

E é nisso que todas nós estamos trabalhando. Junte-se a nós nessa luta por um futuro melhor para todos os gêneros e todas as classes sociais.

RENATA TRUZZI, formada em administração com pós em jornalismo e gestão do terceiro setor, é diretora NESsT Brasil, parceira do Prêmio Empreendedor Social


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