Folha de S. Paulo


Tecnologia e inovação para gerar impacto social: os desafios do Brasil

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Luiz Fernando da Silva Borges, 19, estudante do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul, desenvolve atualmente uma interface cérebro-computador para comunicação com pessoas em estado vegetativo e coma
Estudante, Luiz Borges criou interface para comunicação com pessoas em estado vegetativo e coma

Kawoana Vianna, hoje com 24 anos e cursando medicina na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, desenvolveu –quando ainda estava no ensino médio– um tecido de nanopartículas para evitar amputação em diabéticos.

Juliana Hock, 23, e cursando engenharia de materiais na Unisinos, desenvolveu, também no ensino médio, um método 40% mais barato para produzir ácido lactobiônico, principal componente de líquidos de conservação de órgãos para transplantes.

Luiz Fernando da Silva Borges, 19, estudante do Instituto Federal de Mato Grosso do Sul, desenvolve atualmente uma interface cérebro-computador para comunicação com pessoas em estado vegetativo e coma. Esses três jovens brasileiros –que praticam ciência, tecnologia e inovação voltadas a gerar impacto social– integram, infelizmente, um restrito grupo de jovens pesquisadores.

Para se ter uma ideia, dados da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) apontam que o Brasil possui cerca de 700 pesquisadores para cada milhão de habitantes.

Se comparado a países como Estados Unidos, Canadá e Reino Unido, que possuem cerca de 4.000, ou Dinamarca e Israel, que contam com respectivamente, mais de 7.000 e 8.000 pesquisadores por milhão de habitantes, temos a noção exata do quão pouco investimos na tríade inovação, tecnologia e impacto social.

Quando a análise recai sobre pedidos de patentes internacionais, de 157 solicitações, em 1999, o Brasil passou a 547 registros em 2015. De outro lado, Coreia do Sul e China, países com uma situação semelhante à do Brasil no final século XX, avançaram para mais de 14.000 e 29.000 pedidos de patentes internacionais, respectivamente. Os Estados Unidos, líder mundial no mercado de patentes, emitiu 57.385 pedidos em 2015.

E por que esses dados são relevantes? Antes de responder diretamente à questão, cabe lembrar que os desafios globais –acesso a água, desigualdade social, destinação adequada do lixo, exploração espacial, explosão demográfica, geração de energia, inclusão digital, manutenção dos biomas e biodiversidade, mudanças climáticas, produção de alimentos, saúde de qualidade, entre outros– requerem soluções globais, viáveis e escaláveis.

Neste sentido, o desenvolvimento de inovações de base tecnológica, produzidas por pesquisadores e empreendedores de impacto social, representa um fator relevante para enfrentarmos estes desafios.

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Última edição do Emerge Day, em 2016, reuniu jovens cientistas em Curitiba
Emerge Day, em 2017, reuniu jovens cientistas em Curitiba

São soluções que além de agregarem conhecimento científico, podem ser replicadas. Na prática, têm potencial para chegar em diferentes lugares.

Para que o Brasil possa contribuir mais para a cadeia de impacto social no mundo, o país precisará formar jovens empreendedores inovadores, além, claro, de fortalecer o ecossistema de ciência, tecnologia e impacto social.

Hoje, o desenvolvimento do Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (SNCTI) esbarra em três problemas fundamentais: déficit de recursos humanos qualificados, especialmente nas áreas de ciências básicas; baixa inserção científica e tecnológica no cenário internacional; e limitações nas relações universidade-governo-indústria, ou seja, atores da tríplice hélice.

O problema é agravado pelo cenário de investimento em pesquisa e desenvolvimento no Brasil, que é da ordem de 1,2% do PIB (Produto Interno Bruto), enquanto a média dos países membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) é de 2,4%; Israel e Coreia investem mais de 4% do PIB.

Esse cenário levou o Brasil para a 69ª posição no Global Innovation Index 2017, dentre 127 países analisados. Por outro lado, as dificuldades indicam oportunidades.

Sim. Há boas notícias! Existe um número crescente de centros de excelência, institutos de pesquisa de ponta e universidades de referência. Inúmeras incubadoras, aceleradoras e parques tecnológicos estão fortalecendo iniciativas e parcerias universidade-empresa.

Nos últimos anos, diversos jovens brasileiros têm sido destaques internacionais em olimpíadas de química, matemática e física. O programa Ciência sem Fronteiras enviou mais de 100 mil estudantes e pesquisadores ao exterior.

É importante considerar, ainda, o desenvolvimento de movimentos estudantis organizados e capital social pró-empreendedorismo e educação, que são bases para a inovação, como Aiesec, Brasil Júnior, Brasa, Cientista Beta, Enactus, Iniciativa Emerge e Rede CsF.

É imperativo fomentar e fortalecer a inovação tecnológica no Brasil. Há uma emergente comunidade de jovens inovadores desenvolvendo pesquisas e tecnologias com alto potencial de impacto, que por sua vez serão cruciais para enfrentar os desafios globais.

Deve ser parte da missão do país identificar, apoiar e conectar esses jovens inovadores, além de reduzir lacunas de apoio às pesquisas e tecnologias para que cheguem ao mercado e à sociedade.

GUILHERME ROSSO, bacharel em ciências e tecnologia pela UFRN e mestre em modelagem de sistemas complexos pela USP, é cofundador da Rede CsF Alumni e presidente da EMERGE


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