Folha de S. Paulo


Intraempreendedorismo social começa a ganhar força nas empresas

O ícone do empreendedorismo social Muhammad Yunus fundou o Grameen Bank em 1983. O banco foi o primeiro a conceder linhas de microcrédito a empreendedores de comunidades pobres, com o objetivo de ajudá-los a se desenvolver e a sair da pobreza.

A ideia funcionou para mais de dois milhões de empreendedores. O impacto social foi reconhecido em 2006, quando a instituição e seu fundador, Yunus, receberam o Prêmio Nobel da Paz e popularizaram definitivamente o conceito de empreendedorismo social em todo o mundo. Em 2006, após 23 anos de operação, o banco contava com uma base de clientes de aproximadamente 7,3 milhões de pessoas.

Nick Hughes e Susie Lonie eram funcionários da operadora de telefonia Vodafone no Quênia. Eles tinham em mãos os seguintes dados: apenas 20% da população tinha acesso a serviços financeiros, enquanto mais de 60% possuía celular.

Nasceu, então, a ideia de lançar um serviço bancário, via celular, chamado M-PESA - 'M' para móvel e 'PESA' para dinheiro. O serviço permitia ao usuário transferir dinheiro de um celular para outro, em um sistema semelhante ao do envio de torpedos.

No primeiro ano de operação, o M-PESA atraiu mais de um milhão de clientes; e 10 milhões aderiram nos três anos seguintes. Para a população do Quênia, o serviço favorecia a transferência de fundos de maneira fácil e segura. Tais benefícios alinham-se ao que o especialista em gestão estratégica da Universidade de Harvard, Michael Porter, chama de 'valor compartilhado' - valor gerado tanto para a empresa quanto para a sociedade. É um exemplo bem-acabado de intraempreendedorismo social.

Para Gib Bulloch, fundador e diretor-executivo da Accenture Development Partnerships, "pequenas mudanças em grandes organizações podem causar impactos sociais significativos". Os intraempreendedores têm essa vantagem em relação aos empreendedores sociais - eles partem de estruturas e competências de organizações já existentes para buscar os resultados para a empresa e a sociedade.

Para o livro Social Intrapreneurism and All That Jazz, publicado neste ano pela editora Greenleaf, entrevistei dezenas de intraempreendedores sociais de grandes organizações como Allianz, Natura, Novartis, Odebrecht, BASF e outras.

A Allianz, por exemplo, ganhou milhões de novos clientes com o lançamento de um microsseguro. E as atividades intraempreendedoras tornaram muitas empresas mais atrativas, facilitando a retenção de talentos. Em geral, os projetos de intraempreendedorismo vão além do escopo das atividades de sustentabilidade corporativa que, em muitos casos, estão preocupadas em reduzir ao máximo custos e riscos.

No comparativo entre os dois modelos, o intraempreendedorismo social favorece a alavancagem das capacidades de uma empresa já consolidada, com um salário fixo e risco controlado ou reduzido. A desvantagem é que prescinde de aprovação interna, enfrentando, em muitos casos, resistência às mudanças. No empreendedorismo social, por sua vez, o empreendedor tem total autonomia para atuar em seus projetos. A desvantagem é que o risco é maior - o empreendedor precisará montar uma nova empresa e o risco de falência não pode ser descartado.

O exemplo de Muhammad Yunus e do Banco Grameen demostra que o desenvolvimento de um ecossistema leva tempo. Nos anos 1980, ninguém falava de empreendedorismo social. Hoje todos conhecem o conceito. Atualmente, poucos conhecem o conceito de intraempreendedorismo social. Quanto tempo levará para que as empresas reconheçam o seu potencial?

Heiko Hosomi Spitzeck é professor e gerente do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral. Doutor em ética nos negócios pela Universidade de St. Gallen (Suíça) e mestre em administração pela Universidade de Bamberg (Alemanha).


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