Folha de S. Paulo


Oscip atua no Complexo da Maré a partir de cinco eixos estruturantes

Eliana de Sousa Silva se recusou a virar nome de rua. Os moradores quiseram homenageá-la como fundadora da Redes de Desenvolvimento da Maré, já que a Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) fez o trabalho pioneiro que resultou na cartografia do complexo de favelas.

Até então, a Maré era um emaranhado de ruas, becos e vielas sem nome e sem CEP que constava do mapa da cidade apenas como uma mancha branca. "Fizemos o mapeamento de todas as ruas e praças, batizados com nomes de moradores e pessoas ligadas à história local", conta.

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Ela abortou a tentativa de nomear uma das ruas principais de Nova Holanda. "Não tem cabimento. Mas disseram que, quando eu for desta para uma melhor, meu nome vai pra lá. Aí não tenho mais nada a ver com isso", brinca.

Além de ter permitido aos moradores receberem correspondências em casa (antes retiradas numa entidade), o projeto colocou, literalmente, a Maré no mapa. O complexo de favelas será agora incluído oficialmente na cartografia do município, e a experiência vem sendo replicada em outras comunidades.

CINCO EIXOS

A Redes da Maré atua em cinco eixos estruturantes: educação, arte e cultura, comunicação, desenvolvimento urbano e segurança pública. Na seara educacional, o sucesso do curso pré-vestibular, experiência pioneira, se expandiu para cursos preparatórios para o ensino médio, técnico e fundamental.

A partir desta dimensão do trabalho, Eliana e seu grupo pensaram em outros fatores que poderiam impactar na autonomia, mobilidade social e qualidade de vida das pessoas da Maré.

Assim surgiram os outros quatro eixos da organização. Arte e cultura foi o segundo. Ex-babá, Karoline da Silva Pinto, 23, começou na escola de dança da Redes, passou ao curso pré-vestibular e hoje dá aulas e faz faculdade de dança na UFRJ (Universidade Federal do Rio Janeiro). "É um sonho que virou realidade", diz.

Comunicação foi o terceiro eixo proposto pela Redes, com a criação e produção do jornal "Maré de Notícias", que busca mudar a forma como o território e seus habitantes são representados.

Desenvolvimento territorial foi um eixo surgido como um Censo da Maré. O levantamento permitiu o cálculo do número de escolas públicas necessárias no território para dar conta de todas as crianças nascidas nos últimos anos: 19 novas unidades.

O estudo, apresentado ao prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), foi incluído no planejamento da prefeitura, que hoje está construindo as 19 novas escolas na Maré, número apontado pelo estudo.

"Sistematizar informações para amparar reivindicações é um papel muito importante da Redes", avalia Eliana.

ABORDAGEM POLICIAL

Por essa lógica, na área de segurança pública, seu principal projeto chama-se "Somos da Maré, Temos Direitos". Uma cartilha com parâmetros técnicos de uma abordagem policial foi distribuída junto com um adesivo a ser colado nas casas e barracos onde se lê: "Conhecemos nossos direitos! Não entre nesta casa sem respeitar a legalidade da ação".

Marinalva Florêncio dos Santos, 54, colou duas vezes o adesivo na porta de sua casa, já invadida pela polícia sobre a alegação de haver traficantes em sua laje. "Eu não posso ser abordada direito? Por que tenho que levar tapa na cara?

A campanha foi importante para eu saber dos meus direito, mas não me tirou o medo da polícia", diz a moradora da Nova Holanda.


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