Folha de S. Paulo


USP terá alternativas de receita apenas no longo prazo, declara novo reitor

Marcos Santos/USP Imagens/Divulgação
Vahan Agopyan. Candidato a Reitor.
Vahan Agopyan, o novo reitor da USP

Nomeado pelo governador Geraldo Alckmin, o novo reitor da USP, professor e engenheiro Vahan Agopyan, 65, se diz otimista para os próximos quatro anos em que estará à frente da mais importante universidade do país. O "risco do financiamento" foi superado, segundo ele, apesar de o tema ser motivo de vigilância permanente.

"Não teremos riscos de gastos que não possam ser honrados", disse Agopyan. "A crise nos ensinou que temos, sim, que ter alternativas financeiras". Ressalta, no entanto, que isso se dará somente no longo prazo. Desde 2014, gastos com folha de pagamento têm consumido praticamente a totalidade dos repasses do governo, fazendo com que a USP recorresse a reservas financeiras. Até outubro, o comprometimento do orçamento com salários é de 98%.

Agopyan assume em janeiro de 2018, e até lá permanece como vice de Marco Antonio Zago. Na gestão anterior à atual, de João Grandino Rodas (2010-2014), foi pró-reitor de Pós-Graduação. A chapa de Agopyan e seu vice, o atual pró-reitor de Graduação, Antonio Carlos Hernandes, venceu a eleição interna no dia 30 de outubro.

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Folha - A crise financeira na USP está superada? O senhor pretende tomar alguma ação específica nesse sentido?
Vahan Agopyan - O risco já passou, mas as restrições continuam, e vão continuar por alguns anos. Então a universidade tem de saber as prioridades dos seus gostos e ter bom controle. Para não deixar de aplicar no que é importante, fazer reposição dos quadros pouco a pouco, garantir a manutenção dos seus laboratórios. É importante deixar claro que a parte de pesquisa sempre foi feita por recursos extra orçamentários, e vamos continuar buscando.

O senhor já defendeu a busca por recursos alternativos de financiamento, o que é o desejo de vários reitores de universidades públicas. Como isso pode ocorrer na USP?
A crise nos ensinou que, primeiro, precisamos ser mas eficientes, e a Controladoria e os Parâmetros [de Sustentabilidade Financeira, documento aprovado neste ano que impôs um teto de gasto com salários] foram ações robustas realizadas. Fica claro que não teremos riscos de ter gastos que não possam ser honrados. Segundo ponto é que temos, sim, que ter alternativas financeiras. Já temos indicações, mas muito tímidas, e que precisam ser aceleradas. Isso não é uma questão para resolver em meses, mas em anos. O endowment [fundo patrimonial rentável constituído, por exemplo, por doações] funciona em 10 ou 20 anos. Fala-se em convênios com empresas, seria ótimo e já fazemos isso. Nós também não nos habituamos a oferecer serviços e ideias para níveis de governos e sermos ressarcidos por isso, e é uma fonte fundamental em certos países. Mas não dá para modificar uma cultura da própria universidade de um dia para o outro.

É um processo a longo prazo.
A partir de fevereiro vamos trabalhar bastante para isso, mas sempre ao longo prazo. A universidade sempre toma decisões depois de muito debate. E isso garante que ela se mantenha. Demoramos anos discutindo a reserva de vagas [até 2021, a USP terá 50% dos alunos vindos da rede pública], mas quando aplicado, foi recebido por todos os setores. Uma mudança de cultura de buscar recursos orçamentários de forma agressiva e mais incisiva implica mudança de mentalidade dos docentes.

E a reitoria seria protagonista desses processos ou seriam descentralizados, como o fundo que já existe na Poli?
A reitoria é que tem que incentivar, definir critérios e requisitos. Para termos transparência, sem dúvidas e riscos.

Alunos da Faculdade de Medicina estão em greve contra a situação do Hospital Universitário, que tem tido falta de profissionais e queda no atendimento. Como o senhor pretende encaminhar a questão do HU?
Está havendo um problema de informação. O HU é importante para atividades rotineiras de nossos alunos. Nós temos o interesse de termos um HU, e se não tivéssemos, teríamos que ter convênios. Mas não podemos ter responsabilidade pelo custeio da saúde da zona oeste da cidade [área atendida pelo hospital]. Esse é o argumento. No Hospital das Clínicas de São Paulo e no de Ribeirão Preto, cuidamos de toda pate acadêmica, temos laboratório dentro do hospital, mas a Secretaria de Saúde faz o custeio.

E como resolver o impasse? O Estado não se mostrou interessado em assumir o HU.
O governo ficou assustado com a manifestação [a reitoria tentou em 2014 aprovar no Conselho Universitário a desvinculação do HU, mas o processo foi interrompido após forte oposição]. Qualquer coisa que queremos organizar com órgãos, há rebeldia. Mas o melhor negócio é explicar e comunicar para todo mundo o que está acontecendo. O que os alunos precisam é que o hospital funcione adequadamente. Queremos oferecer isso para eles, mas que a USP não arque com os custos. O próprio governo federal criou uma empresa separada para gerir os hospitais universitários. Pelo SUS [Sistema Único de Saúde], temos hoje menos de 10% das despesas. Nosso esforço tem que ser com os governos estadual e municipal, para que haja contratação de médicos por parte deles. Os funcionários não serão demitidos e é bom até para que os médicos da USP possam ter mais tempo para atividades acadêmicas.

Chapas de oposição nesta eleição apontaram para um problema de diálogo nesta gestão. Como o senhor pretende agir nesse ponto?
Essa foi a gestão que teve mais reuniões com o sindicato dos funcionários [Sintusp], com reuniões quinzenais. Conseguimos aparar muitas arestas, mesmo com antagonismos graves. Houve diálogo bom com alguns grupos de alunos. Fui procurado pelo DCE [Diretório Central dos Estudantes], o que foi muito bacana. Pretendo ter uma nova reunião com eles quando assumir. O ideal é criar canais de comunicação, mas diálogo só ocorre quando os dois lados querem. Já com o sindicato dos docentes [Adusp] o diálogo foi mais tênue, não tivemos um diálogo fácil. Acho natural que haja posições contrárias, mas precisamos ter esses canais funcionando dos dois lados.

Editoria de Arte/Folhapress

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