"Matemática de novo?" disse uma aluna da professora Cristiane Lacerda, 37, em uma escola pública do Jardim Gaivotas, no Grajaú, zona sul de São Paulo.
Na época, em 2010, a professora e moradora do Grajaú estava no início da carreira e começou a refletir sobre suas aulas e a situação dos estudantes da região.
"Percebi que ali perto não tinha nada, nenhuma diversão. Era uma escola que abria sábado. Então, a única diversão dos alunos era ir para a escola. E, quando um deles disse 'matemática de novo?', pensei que tinha algo errado e precisava mudar'", diz ela.
A primeira atividade para romper a rotina foi a produção de peças de teatro para ensinar matemática. Depois a professora decidiu unir as matérias de exatas com a conscientização ambiental.
Cristiane começou a estimular a reutilização do óleo de cozinha para evitar o descarte incorreto, que entope canos e polui a água.
Os estudantes do ensino fundamental recebem a missão de coletar óleo e informar os vizinhos e familiares sobre as vantagens da reciclagem do resíduo. Por meio desse trabalho, elas aprendem estatística e percentagem.
Por outro lado, parte do material coletado é usada pelos adolescentes do ensino médio para fazer sabão nas aulas de física.
As aulas práticas são ministradas até hoje por Cristiane. Em 2016, ela começou a dar aulas na escola estadual Professor Geraldo de Lima, no Socorro (zona sul), e decidiu montar uma empresa fictícia de sabão com as novas turmas. A ideia agradou tanto os jovens que a produção foi além do sabão.
"Fomos procurando meios de tornar nosso projeto maior. Não ficar só no sabão e ter mais coisa para gente reutilizar o óleo", diz Samantha Cintra, 17, ex-aluna que fez pesquisas e conseguiu produzir velas.
Já Antônio Santana Júnior, 18, teve a ideia de produzir biodiesel e sabão líquido. Entre os experimentos, somente o biodiesel é restrito ao laboratório da escola.
Depois de aprender, os alunos passaram a ensinar pessoas de fora da escola a fazer sabão e velas. A mãe de um deles começou a produzir sabão para vender.
A designer de sobrancelhas Ismailda Nunes, 24, moradora do Grajaú, participou de uma oficina e aprendeu a reciclar o óleo. "Eu jogava o óleo no ralo, mas agora uso para fazer sabão para lavar a louça e o quintal. As velas quero fazer para vender", diz.
"O aluno tem que ter essa conscientização de que ele pode transformar o próprio espaço. Ele não vai conseguir acabar com o impacto ambiental, mas ele precisa minimizar esse impacto", diz a professora.
Os estudantes contam que foram a lanchonetes pedir óleo, mas descobriram que os donos dos estabelecimentos doam o produto para habitantes das redondezas e recebem em troca o sabão.