Folha de S. Paulo


Ex-chefe em Harvard abre universidade sem sala de aula e bibliotecas

Imagine uma universidade sem salas de aula em que o aprendizado acontece por meio de debate entre os alunos, que vêm do mundo inteiro (incluindo do Brasil). Parece ficção científica, mas as aulas já começaram.

A proposta é da Universidade Minerva, que abriu suas portas em setembro em São Francisco, EUA, no coração do Vale do Silício –uma das regiões mais inovadoras e criativas do mundo.

Lá, funciona a sede administrativa e a residência estudantil dos 29 alunos –ambas visitadas pela Folha. E nada mais. Não há salas de aulas, bibliotecas e nem estádios de futebol americano, comum nas universidades dos EUA.

As "aulas" são exclusivamente on-line, por meio de uma plataforma exclusiva, com horário marcado e professor em tempo real. É ele que conduz o debate – e cada aluno tem de expor suas ideias pelo menos duas vezes a cada encontro.

Os alunos também têm mentores, que encontram presencialmente ou eletronicamente.

"A ideia é desenvolver a capacidade de pensar criativamente, criticamente e de se comunicar de maneira efetiva", explica o neurocientista Stephen Kosslyn, um dos diretores da Minerva.

Especialista em desenvolvimento cognitivo, ele trocou um cargo de gestão em Harvard –considerada a melhor universidade do mundo em rankings internacionais– pela Minerva.

"Já vi alunos egressos de escolas de ponta com muito conhecimento que não conseguem resolver problemas e comunicar as soluções", diz.

Na Minerva, os estudantes podem fazer as "aulas" em casa, em um café ou em uma biblioteca. "Nunca vamos todos para o mesmo lugar, senão a internet cai", diz o único aluno brasileiro, Guilherme Nazareth de Souza, 19.

Ele deixou um curso tradicional de economia em uma universidade federal do Rio Grande do Sul "que detestou" para prestar a Minerva. Foi escolhido em uma seleção internacional que incluiu exame, entrevista e análise de currículo.

A lista final de aprovados foi elaborada a partir de um algoritmo que selecionou os nomes com maior capacidade de liderança. Oito em dez alunos da Minerva são estrangeiros, de 14 países.

Eles têm de arcar apenas com os custos de comida. A partir da próxima turma, haverá uma taxa de U$ 22 mil, que inclui moradia –cerca de um terço do valor de uma escola de ponta dos EUA.

Cada aula, conta, exige uma média de cinco horas de preparação e de estudos. "Se não fizermos isso, não conseguimos debater", diz.

Apesar de o processo ser on-line, a Minerva se diferencia de propostas de cursos virtuais tradicionais (chamados de MOOCs) porque, sim, preza a interação ao vivo entre os estudantes.

O convívio acontece na residência estudantil –um prédio da universidade no centro de São Francisco.

"É aqui que aprendemos a lidar com as diferenças", diz Guilherme. Nos próximos dois anos, essa interação será em Buenos Aires e Berlim –os alunos terão de se mudar. Em 2017, o destino dependerá da área estudada.

A Folha apurou que o Brasil chegou a entrar na lista, mas foi descartado porque a internet é muito lenta.

Depois do primeiro ano, com disciplinas comuns, os alunos podem escolher qual área seguir. As possibilidades vão de artes e humanas a ciências da computação.

Os alunos também terão de fazer estágio –em empresas de qualquer parte do mundo. Guilherme pretende estagiar em São Francisco, mas quer ser empreendedor. "Se eu ficasse no Brasil, não iria conseguir", afirma.


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