Folha de S. Paulo


A melhor do país corta gastos para sair da crise

Melhor universidade do país, a USP vive dias difíceis.

O orçamento público para manter a instituição, de R$ 5 bilhões neste ano, não cobre nem a folha de pagamento dos 29 mil servidores ativos e aposentados. São as reservas que têm sustentado a USP.

A universidade atrasou o reajuste salarial anual aos servidores e enfrenta, desde maio, uma greve parcial –que já é a maior da história.

Há estudantes com o calendário de aulas atrasado, e alguns dos restaurantes e das bibliotecas estão fechados.

Para reequilibrar as contas, a nova reitoria, que assumiu em janeiro, busca reduzir os gastos com salários.

O reitor Marco Antonio Zago suspendeu contratações e elaborou plano de demissão voluntária, que pode abranger 10% dos funcionários não docentes. A medida foi aprovada na terça-feira (2).

A ideia é que a instituição deixe de gastar sua poupança (hoje de R$ 1,6 bilhão) a partir de 2017. E que em 2018 o gasto com servidores diminua dos atuais 105% para menos de 85% do orçamento.

"Paramos a contratação de docentes. Se for por apenas um ano, não deverá haver grande impacto. Mas se for por dois, três anos, poderá ter reflexos negativos na estrutura dos grupos de pesquisa, vai desestruturar o ensino de graduação", afirmou Zago no fim do mês passado.

Hoje, 20% dos docentes da universidade estão perto da idade da aposentadoria -têm entre 61 e 70 anos.

A não reposição de professores pode trazer, a médio prazo, ao menos dois impactos para quem estuda na USP: turmas com mais alunos e menos oferta de disciplinas.

A quantidade de docentes hoje já sofre deficit, segundo o próprio reitor. São 15 alunos para cada professor da USP. Há 20 anos, eram 9.

A crise também teve impactos fora da sala de aula. As obras de infraestrutura foram paralisadas, e o fundo para pesquisas, reduzido.

Alunos da pós-graduação que precisam apresentar trabalhos acadêmicos no exterior –atividade comum na dinâmica universitária- não contam mais com ajuda financeira da reitoria.

A expectativa do reitor é que o plano de demissão de funcionários abra espaço para afrouxamento das outras medidas restritivas. Mas, por ser voluntário, ainda não é possível avaliar sua eficácia.

IMPACTOS

Também ainda não é possível medir o impacto dos cortes, adotados a partir do início de 2014, na qualidade do ensino e da pesquisa da USP.

Isso acontece porque os indicadores quantitativos do ranking consideram dados até 2012 -como pedidos de patentes ou artigos científicos publicados por docente.

A universidade segue como a melhor do país e lidera em metade dos 40 cursos avaliados no RUF deste ano.

Na opinião de Renato Pedrosa, coordenador do Grupo de Estudos de Ensino Superior da Unicamp, a crise afetará a qualidade da USP se a universidade deixar de ser atraente para pesquisadores e se houver queda em parcerias internacionais.

"Os trabalhos mais citados por outros cientistas são justamente aqueles feitos em colaboração internacional."

Antes mesmo da deflagração da crise, a USP já havia caído em alguns rankings internacionais, como o britânico THE (Times Higher Education), de 2013 -a universidade saiu do 158º lugar para o grupo entre 226º-250º.

A crise abriu também a discussão sobre o atual modelo de gestão. O reitor é um docente escolhido após votação interna e nomeação do governador. Em escolas internacionais de ponta, o gestor é escolhido no mercado por indicação de um conselho de estudantes, ex-alunos, docentes e membros da sociedade.

Um exemplo é a Universidade de Michigan (EUA), que é pública e figura entre as 25 melhores do mundo.

"Na USP, representantes da sociedade não têm voz nos processos de decisão", disse Elizabeth Balbachevsky, pesquisadora da instituição e especialista em ensino superior.

E diferentemente do que ocorre nas outras universidades públicas do país, a USP não informa, por exemplo, os salários dos seus servidores.

O que se sabe é que, de 2009 a 2013, o número de funcionários cresceu 14% e que mudanças recentes no plano de carreira permitiram aumento salarial médio de 75%, segundo dados da reitoria.

Editoria de Arte/Folhapress

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