Folha de S. Paulo


Análise: Isolados, critérios do RUF são imprecisos, mas funcionam em conjunto

Na mitologia grega, Procusto é um vilão que assassinava quem se aventurasse pela região do monte Korydallos, no caminho entre Atenas e a cidade sagrada de Elêusis. Ele convidava a vítima a deitar-se numa cama de ferro e, se ela fosse menor do que o leito, esticava seus membros até esquartejá-la. Se fosse maior, cortava-lhe as pernas. Nenhum viajante se salvava, pois, secretamente, Procusto mantinha duas camas com dimensões diferentes e sempre punha o peregrino na que não lhe servia.

Modernamente, usa-se a expressão "cama de Procusto" para designar um padrão arbitrário para o qual a conformidade é forçada. Fazer um ranking universitário é submeter instituições a uma bateria de dezenas de leitos de Procusto, na esperança de que depois, analisando os pedaços decepados e os distendidos, seja possível estimar o tamanho das vítimas.

Isso significa que, tomados isoladamente, todos os indicadores utilizados no RUF são imprecisos, às vezes até problemáticos. Mas espera-se que, no conjunto, ofereçam um retrato razoável dos pontos fortes e dos fracos de cada instituição.

Diferentemente de Procusto, o ranking não tem o objetivo de eliminar o viajante, mas permitir que ele se conheça melhor, se compare a outros andarilhos e que todos tenham a oportunidade de ajustar-se à rota. Uma medida da produção universitária, mesmo que imperfeita, é preferível a nenhuma medida. Como gostam de dizer os físicos, só conhecemos aquilo que podemos medir.

O beneficiário último desse tipo de iniciativa nem é a instituição, mas o estudante que se vê diante de uma oferta cada vez maior de cursos e faculdades e raramente dispõe de ferramentas adequadas para avaliá-los.

Outra diferença importante em relação a Procusto é que, como as "vítimas" do ranking seguem vivas, falam e reclamam, a equipe do RUF ouviu suas críticas, debateu-as em âmbito interno e externo e promoveu mudanças, buscando aperfeiçoar sua metodologia.

Trata-se, porém, de um trabalho sem fim, já que, por definição, é impossível chegar a critérios definitivos. A referência mitológica aqui já não é Procusto, mas Sísifo.

No ranking das 192 universidades brasileiras, as alterações não foram muito dramáticas. No módulo de pesquisa foi incluído um novo indicador: a proporção de pesquisadores considerados especialmente produtivos pelo CNPq. A inspiração aqui foram certos rankings internacionais que computam o número de docentes laureados com o Nobel de cada instituição. É claro que foi necessário mirar num delimitador de excelência mais condizente com a realidade brasileira.

Na internacionalização, foi eliminado o indicador que considerava a proporção de docentes estrangeiros. A avaliação foi a de que esse critério não capturava bem o que se desejava medir, que era a inserção da universidade no "jet set" dos pesquisadores de renome internacional.

Na parte de ensino, o item referente à titulação dos docentes passou a considerar não só a porcentagem de doutores mas também a de mestres. A ideia aqui, de novo, é ajustar o critério à realidade brasileira. Alguma titulação é melhor do que nenhuma. Como o doutorado é preferível ao mestrado, doutores foram contados com peso 2.

Algo parecido ocorreu com o indicador de regime de trabalho. Na versão anterior, pontuaram apenas as instituições com maior proporção de professores em tempo integral. Neste ano, o tempo parcial também passou a ser considerado. A avaliação é que esse regime faz sentido para cursos como direito ou publicidade, nos quais é desejável que o docente também tenha atuação no mercado e leve essa experiência para a sala de aula. O consenso aqui é que devem perder pontos apenas as instituições que recorrem em demasia à figura do professor horista, que tende a ser o lumpesinato universitário.

No ranking dos cursos, que abarca 2.134 instituições de ensino superior, houve uma mudança mais substancial. As áreas de ensino e mercado foram unificadas, com a primeira compondo 64% da avaliação, e a segunda, 36%, permitindo assim, pela primeira vez na breve história do RUF, a classificação geral dos cursos. Um dos motivos para a alteração é que a pesquisa de mercado, na qual as instituições citadas pelos profissionais de RH entrevistados ganhava pontos e as outras não, produzia um número muito grande de empates, o que tornava esse ranking pouco discriminatório.

No mais, o ranking de cursos incorporou as mudanças nos indicadores de titulação de docentes e regime de contratação explicadas acima.

Uma descrição detalhada da metodologia do RUF pode ser encontrada no site do ranking. Embora seja possível ver a evolução de uma universidade de um ano para o outro, vale lembrar que as mudanças metodológicas não recomendam que se dê muita atenção a essa comparação.

Editoria de Arte/Folhapress

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