Folha de S. Paulo


Minha história: educador físico se recupera após acidente na Indonésia

O professor de educação física Renato Cordeiro Mecca, 34, sofreu um grave acidente na Indonésia em janeiro deste ano. Sem recursos para trazê-lo ao Brasil, sua mãe, Maria Beatriz, iniciou uma campanha na internet para arrecadar dinheiro. E conseguiu. Em poucos dias, uma rede de solidariedade se formou, e Renato retornou ao país. Com quadro de tetraplegia, hoje ele luta para se recuperar em casa.

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Sempre trabalhei com o corpo. Era meu sustento. Pesava 118 kg e tinha 9,5% de gordura. Dava 26 aulas por semana. Me exercitava até no lazer, andando de bicicleta.

Cresci em São Carlos e fiz educação física na Unesp, em Bauru. Lá, comecei a trabalhar na [academia] Marathon em 2002. Me especializei em aulas de ginástica. Quatro anos depois fui convidado para trabalhar na Indonésia, em Surabaya. Era uma grande rede de academias [Celebrity Fitness], com filiais na Malásia, Cingapura e Índia. Trabalhei também na Nova Zelândia e Austrália.

O primeiro ano foi difícil. Éramos em cinco brasileiros na empresa. Só ficou eu. A adaptação foi complicada.

Mas acabei me acostumando. Meu lazer era andar de bicicleta e de moto. Fazia parte de um grupo de motociclistas que viajava muito. No dia do acidente [24 de janeiro] saímos para um passeio em Surabaya. Só lembro que bati na traseira de um caminhão.

Apaguei. Acordei dois dias depois no hospital, com meu irmão do meu lado, me olhando. Eu estava todo entubado. Incomodava demais, uma coisa horrorosa. Falei: "Não consigo me mexer". Achava que estava amarrado.

Fui removido para Cingapura. A UTI era muito cara [US$ 2.000 por dia]. E a transferência para o Brasil começou a ficar complicada [a família precisava de R$ 330 mil para trazê-lo de volta].

Edson Silva/Folhapress
Renato Cordeiro Mecca se recupera do grave acidente sofrido na Indonésia ao lado da mãe Beatriz Cordeiro Mecca; agradecimento
Renato Cordeiro Mecca se recupera do grave acidente sofrido na Indonésia ao lado da mãe Beatriz Cordeiro Mecca; agradecimento

CAMPANHA

Foi aí que começou a mobilização. O pessoal de lá [da Ásia] e os amigos do Brasil. Depois que minha mãe iniciou a campanha no Facebook, começou a pipocar eventos para todos os lados para arrecadar dinheiro.

Fizeram eventos na Malásia, Cingapura, Índia. Promoveram aulas públicas em praças, shoppings. O pessoal da Austrália também ajudou.

Em Surabaya, minha cirurgia no pescoço foi feita por um amigo, médico, e um colega dele, que não cobraram e custearam todo o material.

Mas graças a muitas pessoas que ajudavam, o dinheiro ia aparecendo e conseguimos a transferência da Indonésia para Cingapura. E de Cingapura para o Brasil.

A campanha daqui também cresceu quando matérias começaram a ser publicadas. Apareceu gente que eu não tinha contato há 15 anos. Muitas pessoas colaboraram.

Uma pessoa ligou para o meu pai e disse: "Olha, não tenho dinheiro, mas posso colocar o nome dele nas minhas orações?"

Ligou gente de outros países, de outros Estados. Teve um cara que doou tudo o que ele tinha no banco: R$ 15. E se desculpou por não poder doar mais. As amigas da minha filha venderam bombons para ajudar.

LESÃO

Lesionei a C3 e a C4 [vértebras], mas não houve ruptura. Meu quadro é de tetraplegia. Faço fisioterapia para poder voltar a andar. Há chances. Mas gostaria de recuperar pelo menos a autonomia. Hoje eu não posso fazer nada, fico a maior parte do tempo em cima da cama. Preciso de uma enfermeira o tempo todo comigo. Preciso de alguém para atender o telefone, trocar o canal da TV, diminuir o ar-condicionado.

A cada músculo que começa a mexer, a cada movimento novo, é uma alegria enorme. Espero poder andar um dia de novo. Tento me recuperar aos poucos. Vivo um dia de cada vez. Tenho que conviver com isso. Mas tenho minha família, que me dá um respaldo muito grande.

RECUPERAÇÃO

Tem muita gente que vem me visitar, que me quer bem. Isso dá um impulso a mais para continuar seguindo. Se todo mundo acredita, eu tenho que acreditar também.

Quero, um dia, voltar para a Ásia e agradecer quem me ajudou. Dar um abraço, dizer o quanto sou grato. Também agradecer aos que ajudaram aqui no Brasil. Eu queria apertar a mão de cada um. E dizer obrigado. E quem sabe, um dia, poder fazer algo por alguém que precise, assim como eu precisei.


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