Folha de S. Paulo


Artista ribeirão-pretana se destaca com exposições internacionais

Ela desce as escadas sem fazer nenhum barulho com suas sandálias rasteiras. Surge uma figura miúda, olhos azuis, gestos delicados. Aos 28 anos, Sofia Borges parece apenas uma garota afável, mas é séria e seu discurso sobre a fotografia revela consistência, estudo e dedicação.

Há cinco anos trabalhando com fotografia, ela adverte: "Não sou fotógrafa, sou artista". E sua obra já alcançou elogios de críticos e lhe rendeu uma participação na última Bienal, com a exposição "Estudo para ausência".

Neste ano, terá sete exposições, cinco individuais, um recorde na sua carreira. Entre elas, estão Paris (em novembro), Madri (abril) e México, já aberta.

O COMEÇO

Ganhadora de 12 prêmios em cinco anos, Sofia nasceu em Ribeirão Preto (313 km de São Paulo). Caçula de cinco irmãos, é filha de uma química que "hoje cuida dos netos" e de um fazendeiro.

Descreve sua infância como feliz, vivendo solta nos jardins do casarão dos pais.

Foi para São Paulo aos 19 anos fazer faculdade e hoje só volta para a cidade natal para visitar a família.

Edson Silva/Folhapress
Sofia Borges na casa de seus pais, em Ribeirão; artista ganha destaque em exposições internacionais
Sofia Borges na casa de seus pais, em Ribeirão; artista ganha destaque em exposições internacionais

Quando criança, não fotografava. "Gostava de escrever." Nunca pensou em fazer artes plásticas. Pensou em cursar jornalismo porque era uma maneira de trabalhar com literatura.

Acabou entrando primeiro no curso de moda -- "odiei"-- para só depois fazer artes plásticas na ECA (Escola de Comunicações e Artes) da USP.

O interesse pelas artes surgiu de visitas que fez a exposições na capital.

"Meu interesse pela fotografia passa pela arte contemporânea. [Por isso] Me considero uma artista que trabalha com fotografia."

O REAL

Começou a fazer trabalhos de fotografia que a "interessaram demais": os modelos foram integrantes de sua família, em Ribeirão.

"Fiquei fascinada pela capacidade que a fotografia tinha de instaurar um novo sentido para as coisas, de tirá-las do sentido original."

Pergunta-se: "Que sentido é este que a gente outorga à foto? E como destituir a foto desse poder, se a gente destitui a foto do lastro com o real, o que sobra? Sobra uma imagem? Qual a relação desta imagem com a pintura?"

Em síntese, diz: "Eu busco destituir. Meu trabalho procura esfacelar [o real]".

Sofia Borges/Reprodução
"Coelho", de 2012, uma das obras da artista Sofia Borges

RETIRO

Formada em 2008, mudou-se no ano seguinte para Ibiúna, no sítio do ex-namorado, o também artista plástico Rafael Carneiro.

Para lá, aos poucos, também foram outros amigos artistas. As várias casas se tornaram uma "residência de artistas".

"Havia muita troca", conta. "Trabalhávamos de dia e à noite nos reuníamos para jantar e conversar. Era uma farra!"

Foi para ficar três meses. Acabou ficando dois anos.

RETRATOS

O primeiro trabalho foi o "Retratos e autorretratos", em 2007 e 2008. Sofia se fotografava na cozinha, na sala --primeiro em Ribeirão, depois em São Paulo e Ibiúna.

"Era mais uma experiência de entender o que é um retrato, qual a diferença entre eu estar ali na minha cozinha, com a roupa que eu estava, e isto virar uma fotografia."

Descobriu o sentido de as coisas virarem fotos? "Acho que é mais esvaziar um sentido a priori ou mostrar como as coisas não têm sentido a princípio", diz. "Meu trabalho fala mais sobre a negativa do que sobre a afirmação."

A BIENAL

Participar da Bienal foi um desafio para ela. "Trabalhei muito intensamente. Fui a vários lugares, viajei muito dentro do Brasil e fora."

Foi a muitos museus de história natural, zoológicos e centros de pesquisa sobre paleontologia. Mas, diz que a exposição não é sobre paleontologia. É sobre fotografia.

Sofia Borges/Reprodução
Reprodução do trabalho
Reprodução do trabalho "Natureza Morta", de Sofia Borges

A exposição tinha nove grandes fotos, de animais, retratos, e foto de foto --sim, Sofia costuma tirar fotos de fotos.

Duas das mais importantes, para ela, são o retrato de Camila, "Minha irmã 20 anos atrás" e "O monstro".

SENTIDO DAS COISAS

Ela destaca a importância de aproveitar as oportunidades. Dá um exemplo: experimentar a comida tal, o vinho tal, o lugar tal. "Isto eu acho demais. Essa mobilidade do mundo, esta transferência de objetos no mundo, eu gosto."

Mas é preciso, afirma ela, dar sentido para a vida.

O namoro de sete anos com Carneiro terminou no ano passado. E diz que, assim, está tudo bem. "Não estou preocupada em casar e ter filhos agora, estou preocupada em fazer minhas coisas." E, com sete exposições para preparar, tem muito a fazer.

"Estou feliz com o trabalho. Este será o ano em que mais vou expor na minha vida."


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