Folha de S. Paulo


Tribunal de Contas exagera em suas funções e prejudica SP, afirma Doria

Num ano em que enfrentou questionamentos formais e suspensão de contratações de diversos serviços na capital paulista –como varrição, iluminação e manutenção de semáforos–, João Doria (PSDB) diz ver "certo exagero" na ação do Tribunal de Contas do Município em São Paulo.

"[O TCM] deveria atuar na fiscalização das contas e da execução fiscal da Prefeitura de São Paulo, e não em manifestações prévias", afirma, em referência ao órgão autônomo que, nos últimos anos, tem barrado licitações e pedido mudanças ao poder público antes mesmo de contratos serem formalizados.

"Isso compete ao Poder Executivo e à aprovação do Legislativo, mas não ao Tribunal de Contas", afirma Doria em entrevista à Folha.

O prefeito diz que os conselheiros do TCM retardaram ações de seu primeiro ano de mandato e trouxeram "prejuízo" à população –mesmo que de forma não intencional.

Após um começo de ano com alta popularidade, Doria viu sua aprovação cair e rejeição triplicar ao longo do ano, atingindo 39% de índice ruim ou péssimo na última pesquisa Datafolha –igual ao de Fernando Haddad (PT) ao final de seu primeiro ano no comando da cidade, em 2013.

Suas pretensões de disputar a Presidência da República e desbancar seu padrinho político, Geraldo Alckmin (PSDB), esfriaram, e Doria agora tem sido cotado por aliados como possível candidato ao governo de São Paulo.

Diz, porém, que será prefeito "até dezembro de 2020". "Não há razão para incerteza. Eu fui eleito prefeito para cumprir o meu mandato por quatro anos", afirma.

O prefeito admite falhas na zeladoria da cidade, uma de suas bandeiras do mandato, mas diz que a substituição, em novembro, do vice-prefeito Bruno Covas por Cláudio Carvalho (ex-executivo da construtora Cyrela) no comando das Prefeituras Regionais já traz resultados.

"Nossos índices já começaram a melhorar, e a tendência ao longo de 2018 é que eles alcancem o nível de satisfação que o prefeito deseja."

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Giovanni Bello/Folhapress

Semáforos

TCM questionou edital lançado em maio, apontando falta de detalhamento.

O pregão só foi feito de novo em julho. Aparelhos estavam sem manutenção desde dez.2016

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Zanone Fraissat/Folhapress

Varrição

TCM barrou edital por um mês e o liberou em novembro, com uma série de condições.

Há 2 semanas, serviço também vem sendo prestado por meio de contrato emergencial

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Edilson Dantas - 2.ago.2017/Folhapress

Iluminação

Tribunal travou PPP em 2016, após questionamento de uma das concorrentes.

Hoje a licitação está em andamento, e serviço vem sendo prestado por contrato emergencial

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Além de críticas ao Tribunal de Contas do Município, Doria admite que é mais difícil ser bem sucedido como prefeito do que na iniciativa privada.

Questionado sobre eventual candidatura no ano que vem, diz à Folha que será prefeito até dezembro de 2020.

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Folha - Hoje na cidade de São Paulo, população, vereadores e servidores não têm certeza de quem vai ser o prefeito a partir de abril [prazo para sair do cargo caso seja candidato]. Isso não prejudica a resolução dos problemas da cidade?
João Doria - Não há razão para incerteza. Eu fui eleito prefeito para cumprir o meu mandato por quatro anos. Até dezembro de 2020 serei o prefeito da cidade de São Paulo.

O sr. está cravando que será prefeito até 2020?
Eu fui eleito para isso.

Mas o sr. está descartando disputar o governo do Estado?
Estou respondendo que o meu objetivo é ser prefeito, ter foco na prefeitura e cumprir o meu mandato.

O sr., permanecendo no cargo, terá disposição para cumprir esses quase 1.000 dias sem nenhuma frustração?
Gosto de ser prefeito. Lutei para ser prefeito. Estou entusiasmado na condição de prefeito. Então, não me falta disposição para "prefeitar".

Ser prefeito de São Paulo é mais difícil do que ser bem sucedido na iniciativa privada?
Com certeza. Essa é uma afirmação verdadeira, mas não inibe nem diminui entusiasmo e decisão de trabalho.

A previsão era que as privatizações e concessões avançassem de forma mais rápida. Agora que o sr. sabe o ritmo das coisas, acha que é possível fazer todas as privatizações prometidas em quatro anos?
Com certeza. Não tenho nenhuma dúvida disso. O complexo do Anhembi terá a sua privatização executada no primeiro semestre [de 2018]. E é um bem patrimonial importante, não só do ponto de vista de valor como de resultado para formar o fundo patrimonial de desestatização, que será destinado exclusivamente para projetos sociais.

O Tribunal de Contas do Município tem sido uma pedra no sapato de prefeitos nos últimos anos. No caso do sr., também tem acontecido isso. Acha que é papel do TCM interromper projetos da prefeitura ainda na fase de manifestação de interesse?
A meu ver, o Tribunal de Contas do Município, que respeito o seu papel, deveria atuar na fiscalização das contas e da execução fiscal da Prefeitura de São Paulo, e não em manifestações prévias.
Isto, a meu ver, compete ao Poder Executivo e à aprovação do Legislativo, mas não ao Tribunal de Contas. Há um certo exagero sobre as funções do Tribunal de Contas.

O sr. teve dificuldade para renovar e fazer licitações de serviços como varrição, semáforos, iluminação. Não houve um problema de gestão?
Essa pergunta está vinculada à anterior. Todos os projetos que você citou foram retardados por ações do Tribunal de Contas do Município, que, a meu ver, não deveria ter atuado nesta etapa prévia, e sim no julgamento das contas.
Então, é uma constatação clara: ainda que não tenha havido intenção deliberada dos conselheiros do Tribunal de Contas de prejudicar a cidade e seus habitantes, de fato houve um prejuízo.

Sobre zeladoria, apesar do projeto Cidade Linda, a cidade continua bastante suja. O sr. chegou admitir que é preciso melhorar. Como fará?
Precisamos de recursos e gestão. Finalmente, conseguimos recursos a partir de 2 de janeiro. E melhorar a eficiência com os prefeitos regionais.
Fizemos uma alteração nesta área, colocamos o Cláudio Carvalho [que substituiu Bruno Covas] para assumir essa responsabilidade e ele vem agindo com muito bom resultado desde novembro.
Nossos índices já começaram a melhorar, e a tendência ao longo de 2018 é que eles alcancem o nível de satisfação que o prefeito deseja.

O sr., que conhece várias cidades do exterior, não sente um baque em São Paulo quando vê a situação da limpeza aqui?
Está bem melhor do que na gestão que me antecedeu. Mas seria o mesmo que você ter o baque de sair dos Estados Unidos e chegar ao Brasil. Você não pode querer comparar cidades do primeiro mundo com cidades brasileiras.

Ao justificar problemas, o sr. fala bastante da questão de um buraco no Orçamento deixado pela gestão Fernando Haddad (PT). Mas a arrecadação da cidade chegou perto do previsto, e parte importante das transferências do governo federal não vieram. O governo federal, aliado do sr., não teria responsabilidade também? E à prefeitura não caberia articular a vinda dos repasses?
O Orçamento de 2017 feito pela gestão do PT é um Orçamento artificial. Uma peça de ficção –15% dos R$ 55 bilhões simplesmente não existiam, independentemente de serem ou não do governo federal. Você não pode estabelecer um compromisso orçamentário diante de expectativas.
O governo que nos antecedeu errou duas vezes: primeiro, porque estimou uma entrada de recursos que não estavam assegurados; e depois previu despesas menores do que aquelas que de fato existiriam no custeio.
Isso provocou um deficit de R$ 7,5 bilhões, que, felizmente, foi superado, mas com enorme sacrifício de todos os investimentos da cidade e a redução das despesas de custeio em R$ 800 milhões.

Uma das críticas à gestão é que, em momentos importantes, houve precipitação do sr.. Por exemplo, no caso da farinata (complemento alimentar) na merenda dos alunos, que o sr. anunciou sem falar antes com o secretário de Educação. Ou na operação da cracolândia, quando o sr. disse que ela havia acabado, mas o problema continua grave.
No caso da cracolândia, eu me referi explicitamente ao shopping center de drogas que havia no quadrilátero que havia na rua Helvétia com Dino Bueno. E de fato existia. Isto acabou, a partir de 21 de maio não houve mais o domínio de um quarteirão inteiro sob controle do PCC (Primeiro Comando da Capital). Esta área foi resgatada, é da cidade. A isso que me referi. Não disse que o problema grave, do consumo, dos traficantes, teria terminado naquele dia.

Os usuários continuam ali.
Tivemos redução expressiva. De 1.400 que existiam, hoje são 400. Praticamente mil foram internados voluntariamente, tratados na rede pública municipal. O objetivo é prosseguir, não só nesta área central como em outras em que há o consumo do crack.

Sobre as doações que o sr. vem recebendo, há um percentual grande que não foi concretizado. Nesses casos, apesar de anunciado, os empresários não chegaram nem a enviar a proposta oficial. Uma delas é a revitalização das pontes nas marginais. O sr. se decepcionou com esses empresários?
Essa [das marginais] está pendente com [faz uma pausa antes de completar]... Tribunal de Contas do Município. Nós tivemos, do total, praticamente R$ 700 milhões. Doações efetivadas: R$ 483 milhões, praticamente 70%. Os outros 30%, R$ 215 milhões, são doações que estão sendo efetivadas. As doações anunciadas serão efetivadas.

Mas o sr. se desapontou com essas pessoas que não cumpriram o prometido?
Todos cumpriram. Em alguns casos, como os das marginais, estamos aguardando a liberação do Tribunal de Contas e eu tenho convicção que essa liberação virá.

Sobre o aumento do limite de velocidade nas marginais, o sr. havia dito que as estatísticas já comprovavam que o programa não afetou os acidentes e que estudos não são necessários. Mantém essa avaliação? Uma política pública não necessita de estudos para avaliação rotineira?
Ali houve uma interpretação do que eu disse. O estudo, a análise e as informações são levadas em conta sim pela prefeitura. Primeiro, pelos dados que a própria CET produz. E é uma instituição confiável. Depois também [é avaliada] pela Polícia Militar.
O que quis dizer é que não houve nenhuma circunstância que determinasse que o aumento da velocidade nas marginais tenha vínculo com aumento de acidentes. Isso nos dá tranquilidade de que houve um acerto na implantação do Marginal Segura, com aumento da segurança.

Há alguma coisa que o sr. pode exemplificar que faria diferente?
Quando nós fizemos a ação [que apagou grafites] na 23 de Maio, deveríamos, logo no começo da ação, ter dialogado com os grafiteiros. E aí nós erramos. Nós tomamos a medida [de apagar] os grafites que estavam vandalizados.
Onde nós erramos? Deveríamos ter dialogado previamente com os artistas, e não tomado a decisão de pintar aqueles grafites que estavam vandalizados com pichadores.
Como mudamos isso? Criamos uma comissão com os grafiteiros, criamos uma boa relação com eles. Implantamos oito Museus de Arte de Rua, iluminamos estes museus, geramos remuneração para os grafiteiros, removemos as tintas, criamos oitos museus de rua. Transformamos o que era um problema numa solução extraordinariamente boa e fluída com os grafiteiros. E criamos o corredor verde na 23. Ou seja, transformar problemas em soluções.


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