Folha de S. Paulo


Pesquisa encontra contaminação por cocaína e remédios na baía de Santos

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Laboratório com mexilhões mergulhados em aquários com cocaína e fármacos
Laboratório com mexilhões mergulhados em aquários com cocaína e fármacos

As águas da baía de Santos, cartão-postal da Baixada Santista, estão contaminadas por cocaína e remédios. A presença das substâncias já compromete a vida marinha da região e também pode causar impactos à saúde humana.

A conclusão é de um estudo feito pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) em parceira com a Unisanta (Universidade Santa Cecília), que foi divulgado nesta quinta-feira (23).

A pesquisa se concentrou na porção central do alagado, que tem dez metros de profundidade e está localizado a cerca de 4 km de distância da praia. As coletas da água foram realizadas de 2014 para cá em seis pontos da baía.

O coordenador do estudo, o ecotoxicólogo Camilo Seabra, diz que as amostras de água continham alta concentração de cocaína pura e a versão da droga metabolizada pelo organismo humano.

Em termos técnicos, a concentração de cocaína encontrada no local foi de 500 nanogramas por litro. "Essa é o maior registro no mundo para regiões costeiras estudadas", afirma Seabra.

Na baía de São Francisco, nos Estados Unidos, onde existem estudos avançados na área, a concentração de cocaína diluída é cem vezes menor, afirma o pesquisador.

Além da droga, a pesquisa buscou encontrar a presença de 34 tipos de fármacos mais comuns no mercado. Os resultados apontaram a existência de cinco substâncias farmacêuticas em níveis elevados, entre elas, paracetamol (analgésico) e diclofenaco (antiinflamatório).

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Área contaminada da baía de Santos
Área contaminada da baía de Santos

MEXILHÃO

Para analisar os impactos das substâncias na vida marinha, os pesquisadores analisaram a "saúde" de um nativo da região: o mexilhão.

O mexilhão é um molusco, tem a capacidade de filtrar a água e não se movimenta. "Ele não consegue fugir da poluição e acaba sendo mais afetado num ambiente contaminado", afirma Seabra.

Em laboratório, os pesquisadores expuseram os mexilhões em amostras separadas de água com a mesma concentração de cocaína e fármacos encontrada na baía.

O resultado preocupa. "O DNA dos animais foi alterado. As substâncias causaram efeitos significativos no crescimento e na reprodução dos mexilhões", diz Seabra.

O próximo passo do estudo será o de analisar os reais efeitos dessa contaminação na saúde humana. "A gente acredita que os animais marinhos acumulam os contaminantes que podem afetar os consumidores de frutos do mar", conta Seabra.

A pesquisa também mostra que a presença de cocaína e demais substâncias na baía é um velho retrato da ineficiência do sistema de saneamento básico.

"A Baixada tem, no máximo, um sistema primário de coleta e tratamento de seu esgoto. Para evitar que a cocaína e os fármacos cheguem ao mar é preciso elevar o tratamento para os níveis secundário e terciário. Isso demanda mais investimentos em tecnologia", analisa o pesquisador.

Os fármacos saem pela urina. Mas muita gente os descarta de forma irregular no ambiente. "Nunca deve-se jogar remédio na pia e no vaso sanitário. Isso só aumenta a contaminação."

Já sobre a presença de cocaína na baía, Seabra tem duas pistas. "Suspeitamos que haja perdas no transporte da droga. O elevado consumo de crack, que tem 40% de cocaína na sua composição, também pode dispersar o produto pela região."

A baía de Santos recebe 97% do esgoto tratado de Santos e outros 40% advindos de São Vicente (cidade vizinha).


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