Folha de S. Paulo


José Carlos Barbosa Moreira (1931-2017)

Mortes: Professor por vocação, foi tutor de dois ministros do STF

Divulgação/Instituto Brasileiro de Direito Processual
José Carlos Barbosa Moreira (1931-2017)
José Carlos Barbosa Moreira (1931-2017)

Ao contrário da maioria dos professores de direito, a primeira prova a que Barbosa Moreira se submeteu para poder exercer o magistério não teve como audiência uma banca de juristas renomados.

Eram crianças de sete anos e o título pleiteado era de professor primário. O tema não era litisconsórcio ou preclusão, mas o conceito de metade.

Não que a didática do professor fosse muito diferente conforme o grau de dificuldade da explanação. Assuntos espinhosos, como o "agravo no auto do processo", eram ilustrados com figuras como fábula da bela adormecida –assim como, para sua primeira plateia de alunos, partiu uma maçã ao meio para se fazer entender.

A clareza com que fazia qualquer conceito de processo civil ser entendido de forma tão simples quanto o de metade fez de Barbosa Moreira um dos nomes mais importantes do direito brasileiro.

Carioca da Tijuca, filho de professores que abriram uma escola no bairro, ainda jovem começou a lecionar português.

Na UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), onde foi titular, guardava o nome de todos os alunos. Dizia não dar aulas para entidades abstratas e ser "impossível uma relação afetiva entre seres inominados."

Teve atuação destacada também no plano internacional, sendo reconhecido na Itália e na Alemanha como uma figura notável do processo civil. Orgulhava-se de ter atuado como professor visitante da Universidade de Bolonha, uma das mais tradicionais do mundo.

SUPREMO

Dois dos atuais ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) foram seus pupilos: Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. Para o último, o professor era "detentor de uma didática insuperável, conduzindo os alunos a compreender não a expressão literal da lei, mas a razão de ser do dispositivo legal."

Barroso, que foi aluno de Barbosa Moreira nos anos de 1979 e 1980 e seu colega de caminhadas na praia anos depois, é muito grato ao professor. "No início da minha vida, ele teve a generosidade de levar o primeiro trabalho que eu escrevi, sem que eu soubesse, para a editora Forense, que o publicou. Era um trabalho que trazia uma dura crítica ao regime militar, embora sob a fachada de um estudo sobre a federação brasileira."

Assim como seu colega, o ministro destaca as qualidades do mestre em sala de aula. "José Carlos escrevia primorosamente bem, dominava como poucos os conceitos da sua matéria, era carismático e dotado de grande seriedade científica." E arremata: "Era uma dessas pessoas que muda a vida das outras pelo exemplo e pela generosidade".

Barbosa Moreira também foi procurador do Estado, desembargador e advogado. Mas é como professor que sempre será lembrado.

Morreu no último dia 26, aos 85. Deixa mulher e quatro filhos.

coluna.obituario@grupofolha.com.br

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