Folha de S. Paulo


Doria busca ideias em cidade chinesa que cobra passagem com leitura facial

Peter Treanor/Latinstock
Shopping no centro de Yinchuan, na China; cidade inspiração de João Doria para tornar SP uma 'smart city
Shopping de Yinchuan, na China; cidade inspiração de João Doria para tornar SP uma 'smart city'

Na geografia, Yinchuan está a mais de 18 mil km de São Paulo. No conceito de inteligência urbana, parece estar a anos-luz. Não à toa essa cidade chinesa de dois milhões de habitantes (número modesto perto dos 24 milhões de Xangai) virou referência global de "smart city" (cidade esperta).

Uma amostra do que ela tem a oferecer: em ônibus locais, rostos viram uma espécie de Bilhete Único, por meio de um software de reconhecimento facial que é conectado com a conta bancária do passageiro.

A convite do governo chinês, o secretário de Inovação e Tecnologia paulistano, Daniel Annenberg, visitou na terça (25) a cidade –de onde pretende importar ideias para São Paulo com aval do chefe, o prefeito João Doria (PSDB), que faz giro de uma semana pelo país oriental.

O tucano diz ter como meta transformar a cidade numa "smart city" até o final da gestão. Doria acha que São Paulo está no caminho certo, mas Yinchuan é a prova de que o slogan que lhe é tão caro, #acelera, cabe à sua gestão.

O prefeito menciona como trunfo uma promessa de campanha, o Empreenda Fácil, que propõe o prazo de sete dias para abrir uma empresa. A Folha relatou em junho a dificuldade de empresários em conseguir ser atendido no programa –a gestão classifica os problemas como "pontuais".

Pelo que o secretário viu in loco, Yinchuan deixa até o ideal paulistano dos sete dias no chinelo. Abrir uma companhia por lá antes levava uma semana, tempo reduzido para meio dia.
O empenho pela desburocratização não para por aí.

"Um serviço de licenciamento de serviços no município precisava de 69 carimbos. Hoje fazem com apenas um. Antes, para aprovar a implantação de uma indústria lá, umas 600 pessoas analisavam o processo, e agora são 60", diz Annenberg.

Há diferentes formas de medir uma "smart city", mas conceitos como sustentabilidade e qualidade de vida costumam nortear quais cidades são merecedoras desse título.

Uma pitada de "efeitos especiais" não atrapalha ninguém. Em Yinchuan, a prefeitura recepciona residentes com hologramas, e as paredes têm códigos de barras para que, em vez de esperar na fila, o cidadão possa escaneá-lo com o celular e receber respostas rápidas para dúvidas frequentes –como a renovação de passaportes (feita ali).

A cidade realizou conferência global sobre o tema em 2016 e, ciosa em vender seu peixe, convidou jornalistas do mundo todo –o que rendeu reportagens como uma da CNN intitulada "a cidade mais inteligente do mundo?".

Em sua visita, o secretário Annenberg foi levado a uma vila com 3.000 moradores que serve de incubadora para testar tecnologias de ponta. Caso das lixeiras movidas à energia solar que avisam à sede quando estão cheias, para que possam ser esvaziadas.

Divulgação
Prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), em visita à muralha da China na última segunda-feira
Prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), em visita à muralha da China na última segunda-feira

Um campo que atraiu particular interesse: a telemedicina. "As casas têm um aparelho gratuito que permite que, à distância, você saiba se a pessoa está com a pressão boa, com batimentos cardíacos em ordem. Dá para monitorar a saúde das pessoas."

Por meio de um portal online, médicos podem acompanhar pacientes e até prescrever receitas, o que alivia hospitais superlotados.

Presidente da TM Forum, empresa que organizou a conferência sobre "smart cities" em Yinchuan, Peter Sany expôs no evento outras metas, como detectores capazes de alertar as equipes de emergência se um idoso levar um tombo em casa.

E há mercado para as "smart cities": a consultoria Markets and Markets estima que o conceito movimente US$ 758 bilhões em 2020, ante US$ 312 bilhões em 2015 –sobretudo através de PPPs (parcerias público-privadas), que têm um lugar especial no coração do prefeito que pôs como meta "vender São Paulo" mundo afora.

Para Doria, programas municipais como o City Câmeras (programa de monitoramento de ruas) ajudam a desatrofiar neurônios urbanos da cidade que comanda. "É perfeitamente possível alcançar resultado, mesmo tendo índices de pobreza e fragilidade."

Nesta terça-feira, ele visitou empresas chinesas de segurança atrás de doações de equipamentos para esse programa. Conseguiu promessa de câmeras e drones.

O City Câmeras já rendeu frutos concretos, disse o prefeito. Exemplo: "Assim descobrimos bandidos distribuindo pedras de crack dentro de bisnagas de pão."


Endereço da página:

Links no texto: