Folha de S. Paulo


Adolescente diz ter implorado para não tatuarem 'ladrão' em sua testa

Reprodução
Jovem tem testa tatuada após ser acusado de roubo em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo
Jovem tem testa tatuada após ser acusado de roubo em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo

O jovem de 17 anos que teve a testa tatuada com a frase "eu sou ladrão e vacilão", no último dia 31, contou neste domingo (11) à reportagem que implorou para que o tatuador Maycon Wesley Carvalho dos Reis, 27, e o amigo dele, Ronildo Moreira de Araújo, 29, não o marcassem.

Em sua casa de dois cômodos com tijolos aparentes no bairro dos Casa, em São Bernardo do Campo (na Grande SP), ele disse que, logo após o ocorrido, quis morrer e que estava muito envergonhado.

O adolescente, que admite ser usuário de drogas, contou que estava "muito bêbado" quando entrou no condomínio onde Reis vive. "Eu coloquei a mão em uma bicicleta, mas não estava roubando. Nem sabia o que eu estava fazendo", relata.

Ainda de acordo com o jovem, em seguida, os torturadores amarraram suas mãos e seus pés e disseram que iriam fazer uma tatuagem.

"Pedi que fosse no braço, mas eles disseram que seria na testa e começaram a rir, pensando na frase que escreveriam. Então, implorei para que quebrassem meus braços e minhas pernas, mas que não fizessem isso".

O adolescente afirmou também que foi ameaçado. "Eles disseram que se eu procurasse uma delegacia, eles iriam me espancar".

Desaparecido desde o dia 31 de maio, o jovem foi encontrado na tarde do último sábado (10) por um tio próximo da casa em que mora.

O adolescente prestou depoimento na delegacia e voltou para a casa da avó. "Quando o vi, comecei a chorar", conta Vando Aparecido Rocha, 33, que tem o nome do sobrinho tatuado no pulso esquerdo. "Ele é um filho para mim. Quero justiça".

A mãe do adolescente, Vânia Aparecida Rosa da Rocha, 34, também está inconformada. "Estou arrasada. Meu filho não é boi para ser marcado desse jeito."

Os dois acusados pela polícia de tortura tiveram a prisão preventiva decretada no sábado. A reportagem não conseguiu contato com os advogados deles.

DISTÚRBIO

Mais velho de seis irmãos, o adolescente estudou até a oitava série e, de acordo com familiares, além de ser usuário de drogas, tem transtornos mentais. "Ele sempre foi muito inquieto. Todo o mundo que o conhece diz que ele tem distúrbio", conta a mãe dele, Vânia Aparecida Rosa Rocha, 34.

"Já procurei ajuda para tentar internar o meu filho, mas não consegui", completa ela, lembrando que o jovem já passou por dois centros de recuperação mantidos por igrejas.

"Não temos condições de pagar um tratamento para ele. Na semana que vem, teremos que sair daqui porque o terreno em que moramos foi vendido", relata Vando Aparecido Rocha, 33, tio do jovem.

Apesar das dificuldades, a avó do adolescente está decidida a ajudá-lo. "Eu vou limpar a testa dele todinha, nem que a gente tenha que ir morar debaixo da ponte", afirma Eliana Rocha de Carvalho, 59.

Com a comoção gerada nas redes sociais, uma campanha on-line foi criada pelo coletivo Afroguerrilha para conseguir arrecadar R$ 15 mil voltada à remoção da tatuagem.


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