Folha de S. Paulo


Joaquim (1924-2017) e Maria da Glória (1928-2017)

Mortes: A despedida quase simultânea de Joca e Goinha

Arquivo Pessoal
Joaquim Henriques de Almeida e Maria da Glória Fonseca da Silva Almeida
Joaquim Henriques de Almeida e Maria da Glória Fonseca da Silva Almeida

Sob neve, Joaquim chegou à porta da casa de Glória. Decidira pedir a mão da namorada, mas o pai dela, teimoso, se recusava a deixá-lo entrar. O jovem camponês fincou os pés ali por quatro horas, até que o velho cedesse.

Joaquim e Glória namoravam como se namorava na pequenina Girabolhos, em Portugal, no final da década de 1940. Nada de mãos dadas. No sofá da sala, sentavam-se à distância um do outro.

Casaram-se em janeiro de 1950. Pouco depois, embarcariam na terceira classe de um navio que rumava ao Brasil. Fizeram a vida em Guarulhos.

Ele, personalidade forte, meio turrão; ela, amorosa, paciente, mas também decidida. Joaquim foi marceneiro antes de ter o sonhado mercadinho, já aos 45. Trabalharia ali, ao lado da mulher, por 30 anos.

A casmurrice era logo despida quando Joca se achegava a Glória –para ele, Goinha. "Meu pai idolatrava minha mãe", conta a filha, Madalena. Já velhinhos, se acaso se esbarrassem pela casa, davam beijinhos como namorados.

Aos 85, com Alzheimer, Glória deixou de reconhecer Joca. Ele, contudo, insistia. Fazia perguntas e, sem resposta, respondia-as ele mesmo.

A saúde dela piorou ano passado, após cinco pneumonias. Em um quarto adaptado na casa, era paparicada pelo marido, também debilitado. "Goinha, você tá bem? Como você tá linda! Quer tomar café comigo?", perguntava Joca.

Glória morreu dia 6 de abril, após uma embolia. Internado com pneumonia, Joaquim iria nove dias depois, sem saber da morte de Goinha. Ele tinha 92; ela, 89. Permanecem juntos no jazigo da família. Deixam dois filhos e duas netas.


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