Folha de S. Paulo


Barrados pela aparência, candidatos são julgados por direito a cotas na BA

O Tribunal de Justiça da Bahia será palco, nesta quinta (9), de nova polêmica sobre a aplicação de cotas para afrodescendentes no país.

Eliminados de concurso público após averiguação presencial, oito candidatos ao cargo de procurador do município de Salvador entraram com mandado de segurança para provar que são pretos ou pardos. Três desses casos vão agora a julgamento.

Salvador é a cidade com a maior população negra do Brasil. Com gratificações, o salário inicial para procurador do município pode chegar a R$ 20,2 mil mensais. Hoje, há 17 vagas disponíveis, sendo 30% (5) reservadas a pessoas afrodescendentes. Para ter direito a essa cota, os candidatos tiveram que se declarar afrodescendentes de acordo com definição do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Mas o edital do concurso, de agosto de 2015, previa a eliminação do concorrente caso fosse detectada falsidade nessa declaração.

Em junho de 2016, após denúncias de fraude nessa autodeclaração, a Prefeitura de Salvador montou uma comissão para a verificação presencial, e oito dos concorrentes acabaram desclassificados.

Entre os eliminados está Catarina Coelho Velloso. De cabelos longos e traços finos, ela foi chamada de "a usurpadora" por integrantes de movimentos negros da Bahia.

Também desclassificada, a baiana Maíra Mutti, que tem longos cabelos lisos, registrou seu protesto nas redes sociais. "Uma banca racial instituída pelo município do Salvador para o concurso público de procurador negou o meu direito de me autorreconhecer como parda", disse.

A advogada que representa as duas foi procurada pela reportagem, mas não quis se manifestar sobre o caso.

CRITÉRIOS

Definindo-se como mulato, Alan da Fonseca questiona os critérios adotados pela comissão de averiguação. Segundo ele, são subjetivos. Se vencer na Justiça, ele será o 17º colocado na lista dos convocados para o cargo. "Nada foi estipulado", reclama Alan, cujo caso também será julgado na manhã desta quinta-feira.

Procurador do município que acompanha o caso, Francisco Bertino afirma que o STF (Supremo Tribunal Federal) referendou a avaliação física como um instrumento de verificação da veracidade das declarações.

Ele ressalta a importância dos traços físicos –o chamado fenótipo– para a implantação da política de cotas, acrescentando que o exemplo de negros bem sucedidos pode incentivar outras crianças afrodescendentes. "O exemplo é importante para o combate ao racismo. Importante que a criança negra olhe para a sociedade e veja que qualquer lugar é dele", afirma Bertino.

Afirmando ter sido prejudicado em outro concurso público, Hilton Sacramento se dedica à mobilização do movimento negro contra fraudes no concurso público. Para esta quinta, está programado um ato na frente do TJ.
"[Esses candidatos] estão prestes a retornar ao concurso nas vagas reservadas a, nós, negros ", escreveu.


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