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Polo de blocos de SP, Baixo Pinheiros tem fuga de moradores no Carnaval

Keiny Andrade/Folhapress
Thaís Knobel criou logística para evitar entrar em trabalho de parto e ficar sitiada por blocos em casa
Thaís Knobel criou logística para evitar entrar em trabalho de parto e ficar sitiada por blocos em casa

Prestes a dar à luz a sua segunda filha, a empresária Thais Knobel, 35, preparou a mala que vai levar à maternidade, não para uma, mas para muitas viagens.

Moradora da região conhecida como Baixo Pinheiros, um dos novos polos do Carnaval de rua de São Paulo, ela teme entrar em trabalho de parto e ficar sitiada em casa quando sua rua for tomada pelas multidões que acompanham os blocos previstos para desfilar no local.

O bairro deve receber trios elétricos seguidos por até 20 mil pessoas, como o Casa Comigo e o Gambiarra.

"E isso me deixa bem preocupada. Não posso correr o risco de ter de ir pela rua, a pé, tendo contrações, no meio de um bloco, com mala, filha e marido."

A logística planejada será sair de casa, como se fosse para a maternidade, todas as manhãs em que houver folia, e voltar só tarde da noite.

"Não é um esquema confortável, mas vou me obrigar a ficar esses dias todos fora de casa para não passar pelo pior", lamenta. "Adoro Carnaval de rua e acho positivo haver bloco aqui. Mas você não para pra pensar no outro lado da história até estar dentro dele", diz a empresária.

Onde fica Baixo Pinheiros

A região conhecida como Baixo Pinheiros está circunscrita ao quadrilátero entre a marginal Pinheiros e a avenida Faria Lima, a rua Paes Leme e a avenida Professor Frederico Hermann Júnior, o que inclui o Largo da Batata, ponto de dispersão de blocos e endereço dos pancadões que costumam sucedê-los.

Neste ano, o largo será palco de shows especiais e de uma roda gigante do patrocinador do Carnaval, que investiu R$ 15 milhões na festa.

Com o aumento das restrições da prefeitura aos desfiles de blocos na vizinha e badalada Vila Madalena, a região do Baixo Pinheiros está cada vez mais disputada.

Neste ano, o Baixo Pinheiros superou a marca da Vila Madalena, com 28 blocos contra 26, desde o pré-Carnaval, que acontece neste final de semana, até o chamado pós-Carnaval, que acontece no primeiro fim de semana do mês de março.

"Até 2014, não existia nada aqui. O Carnaval era a época em que a gente acordava e ouvia os passarinhos cantando", lembra o administrador Fabio Pimentel, 38, que mora num edifício ao lado do trecho da Faria Lima onde se concentram os blocos grandes, próximo ao bar Pirajá. "Em 2015, acordei e tinha um trio elétrico na minha porta."

Pelo segundo ano consecutivo, ele e a família vão viajar no feriado para fugir dos perrengues da folia e evitar ficarem sitiados em casa. "Fica uma multidão na frente da garagem do prédio. É impossível sair de casa. Depois que vão embora, fica o lixo."

O jornalista Renato Marão Citelli, 40, também vai fugir do bairro no Carnaval. A rua sem saída em que mora contratou dois seguranças particulares para evitar que haja depredação das casas e dos carros dos moradores, que estacionam na rua.

"Queríamos fechar a rua com tapumes porque ela é usada como banheiro e motel pelas pessoas, mas precisaríamos de autorização", explica. "No ano passado, tive de lavar a frente da minha casa todos os dias com produtos fortes para aguentar o cheiro. Ninguém quer alguém fazendo xixi na sua casa. Neste sentido, o Carnaval é democrático e plural apenas para quem está na festa."

Busca Blocos

A Prefeitura Regional de Pinheiros determinou que os blocos da região desfilarão entre 12h e 20h e que a limpeza das vias ocorrerá às 23h.

"Entregaremos uma carta para os moradores do entorno do bar Pirajá, com horários de fechamento das ruas, e nossos telefones de contato", afirma Paulo Mathias, prefeito regional de Pinheiros.

"Teremos fiscais em todos os blocos, trabalhando com amparo da CET, PM e Guarda Civil Metropolitana e contamos com a colaboração dos moradores e dos organizadores para que haja equilíbrio entre os interesses dos foliões e de quem vive ali", diz.

Moradora do Baixo Pinheiros há 12 anos, a diretora de criação Cristina Naumovs, 39, vai organizar pela primeira vez um bloco para chamar de seu, o Bloco do Apego, com previsão de reunir 5.000 pessoas no pós-Carnaval.

Para ela, dançar na rua é um movimento político de ocupação da cidade e implica em algum grau de desajuste, que precisa ser organizado pela prefeitura.

"O bairro mudou. Não tinha prédio, agora tem. Não tinha metrô, agora tem. Não tinha Carnaval, agora tem. Tem o bônus, mas tem o ônus. Não existe Carnaval limpinho e sem perrengue. O que precisa haver é um poder público atuante para organizar tudo isso."


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